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ARTIGO
Explorar sem destruir
XICO GRAZIANO
ESPECIAL PARA FOLHA
O primeiro debate importante entre os ecologistas, no
início de 1980, estava centrado na
polêmica da "preservação versus
a conservação" dos recursos naturais. Preservar significa manter
intacto. Conservar significa utilizar sem destruir.
A corrente mais radical, aquela
que subia em árvores para impedir seu corte, galvanizava a juventude. Para ela, qualquer forma de
exploração da natureza era predatória e atendia aos interesses dos
grandes grupos econômicos.
"Small is beaultiful" era seu corolário. José Lutzemberger foi seu
ídolo.
Já os conservacionistas eram
moderados, aglutinando especialmente os estudiosos da academia. Eles criticavam a exploração
insensata da natureza, mas acreditavam na possibilidade de seu
usufruto, desde que controlado.
Dar valor econômico à ecologia
era o grande objetivo dessa corrente. Paulo Nogueira Neto foi
seu baluarte.
Na questão florestal, os preservacionistas defendiam que os parques e reservas deveriam ser santuários da fauna e da flora, intocáveis pelo homem. Já os conservacionistas sugeriam sua utilização
através do turismo ecológico, por
exemplo. Não se falava ainda em
biodiversidade.
Venceu o conservacionismo.
Mas este não teria logrado êxito
sem a briga aguerrida dos verdes,
que empurravam a opinião pública e os empresários para a consciência ecológica. Esse é um valor
histórico do radicalismo: permitir
aflorar a virtude da sensatez.
Contribuiu decisivamente na
maturação do pensamento ecológico o avanço do conhecimento
científico. Naquela época, imaginava-se que a Amazônia era o
pulmão da humanidade. Os estudos, todavia, demonstraram que
o equilíbrio ecológico da floresta
empatava o jogo entre a liberação
e o consumo de oxigênio. Ou seja,
o pulmão natureba era falso.
A posição conservacionista evoluiu para o enfoque moderno da
sustentabilidade. Processos sustentáveis exigem resultados ambientalmente equilibrados, economicamente rentáveis e socialmente justos. Um tripé de benefícios. Assumido pelos principais
organismos ligados ao desenvolvimento, virou moda.
Agora, está no centro da confusão. Dizem que por defender projetos de desenvolvimento sustentável
da floresta no Pará, a freira Dorothy
foi assassinada. Tudo indica, vai se
transformar em mártir a la Chico
Mendes. Assim opera a mídia.
A pergunta fundamental é: exploração sustentável funciona, na
prática, no Brasil? Teoricamente,
com o grau de conhecimento adquirido, sabe-se como manejar o
equilíbrio ecológico da floresta,
mesmo submetida à exploração
humana. Quer dizer, os limites e os
riscos do usufruto já são conhecidos, ao contrário do passado,
quando se discutia ecologia baseado no famoso achismo. Ou na ideologia barata.
Décadas de investigação científica permitiram descobrir como se
processa a reposição do estoque de
madeira. Índices determinam a
idade de corte das árvores, mantendo a biodiversidade. É claro que
muito ainda se descobrirá. Mas o
cabedal de conhecimento existente
permite, com segurança, afirmar: é
possível explorar a floresta amazônica sem destruí-la. Esse é o ponto.
Sendo assim, ao encaminhar ao
Congresso lei que regulamenta a
exploração sustentável da floresta
virgem, prevendo inclusive sua
concessão, o governo respeita a boa
técnica. O Incra, ao querer implantar projetos de desenvolvimento
sustentável, acerta no alvo. Onde
está o equívoco?
Erram os desavisados em imaginar que essa equação ambiental depende da luta de classes. Na Amazônia, como alhures, não se distingue grandes ou pequenos, ricos ou
pobres, bandidos ou mocinhos.
Nessa jornada, a ideologia é uma
só: a conquista da madeira.
Na fronteira inóspita de Anapu,
especialmente, a floresta virgem é
surrupiada sem distinção política.
Ali perto, na região de Marabá, os
assentamentos de reforma agrária
devastam e ardem a madeira tanto
quanto os grileiros favorecem as
serrarias. Pior, há conluio entre os
miseráveis e os poderosos.
A causa da exploração sustentável da floresta merece nota dez. Somente atribuindo valor econômico
aos bens naturais se poderá fazer,
racionalmente, frente à pressão devastadora. Explorar para conservar, conservar para proteger.
Estranho é a ingênua onda política que se criou no país a partir do
assassinato da missionária. Como
no início do ambientalismo, a postura radical pode ajudar. Mas, se
passar do ponto, periga confundir
pobreza com ecologia. Aí, adeus
conhecimento racional.
Garantir a exploração sustentável
da floresta virgem é um belo desafio a ser enfrentado. Assim como,
isso é importante, estimular os
plantios florestais traz alívio na
pressão sobre as matas nativas. Tudo isso o governo já concorda. Que
bom.
Só falta explicar uma coisa: se o
Ministério do Meio Ambiente evoluiu sua posição, deixando de ser
sectário e acreditando na ciência,
por que se opõe ainda tão radicalmente à biotecnologia? Considera
os produtos transgênicos coisa do
mal?
Vai saber. São os mistérios da política!
Francisco Graziano Neto, 51, engenheiro agrônomo, é deputado federal
(PSDB-SP), consultor de empresas e presidente da ONG AgroBrasil. Foi presidente do Incra (1995) e secretário da Agricultura do Estado de São Paulo (1996-1998)
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