São Paulo, Terça-feira, 27 de Abril de 1999
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JANIO DE FREITAS
Sucesso de mídia

Todos se deram mal. Francisco Lopes ofereceu a imagem de culpado, o Senado meteu-se em uma situação polêmica e onerosa, o governo viu fracassar o trabalho para esvaziar a CPI a partir de hoje.
Os desdobramentos do incidente criado por Francisco Lopes na CPI comportam inúmeras hipóteses, mas, na sua origem, há pelo menos uma certeza: ao decidir a atitude na CPI, Francisco Lopes desconsiderou o ingrediente político preparado para favorecê-lo. Tanto faz se isso se deveu a falta de acuidade política ou à impossibilidade de se sair ao menos razoavelmente.
O fim-de-semana foi ocupado por muita gente na articulação, digamos assim, de um abrandamento da CPI. O pretexto, distribuído pela Presidência da República, era a retomada de uma tal agenda positiva, segundo os temas, pelo Congresso.
No domingo e ainda ontem, foi o próprio Fernando Henrique quem se movimentou na articulação. Primeiro, um convite a Antonio Carlos Magalhães para conversar no Alvorada. Na segunda-feira, o longo café da manhã com o senador Jader Barbalho, proponente, integrante e influência maior em metade da CPI.
O interesse do governo é, muitos têm afirmado, deixar Francisco Lopes como único devedor de explicações sobre as irregularidades atribuídas ao Banco Central. Mas essa pretensa saída tem uma ressalva limitadora. Ao governo não convinha que a concentração de Francisco Lopes o expusesse a efeitos excessivamente duros. Nesse caso, Lopes, como defesa ou como vingança, por certo levaria o governo a embaraços sérios, com revelações inconvenientes.
Havia, portanto, um jogo sutil a ser feito pelos governistas, entre a ação esperada da CPI pela opinião pública e a preservação do oxigênio satisfatório para o depoente. Era uma oportunidade, mas Francisco Lopes não a percebeu ou não a quis. E nisso atingiu, também, a tática do governo.
Em vez de ""tirar as CPIs da mídia", como deseja, Fernando Henrique vê o crescimento daquela que o inquieta, porque sujeita a um acaso capaz de explodir no centro do governo. E, se não um acaso, talvez uma retribuição de Francisco Lopes ao tombo pelas costas, que é a sua visão da maneira como foi demitido do Banco Central.
Presidente do Senado, Antonio Carlos Magalhães mostrava-se seguro, tão logo encerrada a sessão sem sessão da CPI, de que ""o Senado não sairá desmoralizado" do episódio. Como primeira impressão, vá lá. Daí por diante, a CPI está sujeita a muitas discussões. Nenhuma delas conveniente à Casa e ao Congresso mesmo. Já ontem, por exemplo, era contestada a obrigatoriedade de um convocado como testemunha dispor-se a falar. E, portanto, a ver-se obrigado, sob risco de prisão, a assinar o termo de responsabilidade, com os juramentos de praxe. Outras questões começaram a pipocar tão logo amainado o incidente.
Mal ao país, nada disso faz. Nem mesmo porque atrasasse uma tal agenda positiva a ser adotada pela Câmara e pelo Senado, segundo a fórmula anti-CPI de Fernando Henrique. Todos sabemos e sentimos que o governo é que precisa de uma agenda positiva. Ou, já seria alguma coisa, de uma agenda. De trabalho, não de viagem, que essa existe e está gorda.


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