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PT SOB SUSPEITA
Partido encomenda parecer e barra divulgação do caso de Sto. André
Após manobra, PT mantém
depoimentos a CPI sob sigilo
LIEGE ALBUQUERQUE
DA REPORTAGEM LOCAL
EDUARDO SCOLESE
DA AGÊNCIA FOLHA
O PT utilizou ontem um parecer
jurídico encomendado pelo vereador José Montoro Filho (PT),
presidente da CPI criada em Santo André para investigar o suposto esquema de propinas na prefeitura local, para ouvir a portas fechadas os depoimentos das testemunhas sobre o caso, impedindo
a divulgação das declarações.
A decisão de manter os depoimentos sob sigilo contraria a
orientação histórica do PT em
episódios da mesma natureza.
Em CPIs que não têm por objeto
suas próprias administrações, o
partido sempre marcou posição
favorável à transparência e à divulgação das informações obtidas
nas comissões (leia texto abaixo).
O PT sustentou a mesma atitude quando o governo federal tentou aprovar a Lei da Mordaça, que
impedia procuradores, juízes e
delegados de divulgarem informações sobre processos em investigação. "A aprovação dessa lei
significa a restauração da censura
no país", disse o deputado Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ) em dezembro de 1999. O presidente do
PT, José Dirceu (SP), reforçou: "A
ameaça à democracia não é o Ministério Público, mas o crime organizado, a corrupção".
Para manter o sigilo dos depoimentos, o presidente da CPI, José
Montoro Filho (PT), recorreu a
um parecer da assessoria jurídica
da Câmara Municipal da cidade.
Em nota divulgada no final da tarde, a CPI afirmou que "decidiu
tornar sigilosos os depoimentos
das testemunhas (...) para preservar as investigações já iniciadas
pelo Ministério Público".
A manobra exitosa do PT foi
contestada por advogados ouvidos pela Folha. "É coisa da ditadura", disse o presidente da Comissão de Estudos Constitucionalistas da Ordem dos Advogados do Brasil, Paulo Lopo Saraiva:
"É um contra-senso uma CPI sigilosa com base no sigilo de um
processo do Ministério Público:
os poderes são independentes".
O constitucionalista Marcelo
Ribeiro disse que "a regra da CPI é
a publicidade: a exceção é o sigilo". Para ele, "o processo corre em
sigilo na Justiça, mas só valeria como justificativa levar o sigilo à CPI
se algum depoente corresse risco
de vida, por exemplo". Para o advogado, o fato de o processo ser
sigiloso no MP não impediria que
os vereadores "buscassem transparência", franqueando os depoimentos à opinião pública.
Versão oficial
Minutos antes do início dos depoimentos, por telefone, José
Montoro afirmou à Folha que tinham sido as testemunhas que
solicitaram o sigilo dos depoimentos. Ao ser questionado se
houve vontade de sua parte para
fechar as portas da CPI ao público
e à imprensa, o presidente da comissão disse: "Sim, é verdade".
Antes da abertura dos trabalhos, só o presidente da comissão
dizia ser favorável ao sigilo: os demais vereadores afirmavam que
gostariam de "transparência".
Montoro Filho, em seu terceiro
mandato na Câmara, assumiu o
cargo por ser o primeiro suplente
do secretário de Serviços Municipais, Klinger Luiz de Oliveira Souza. Klinger é acusado por João
Francisco Daniel, irmão de Celso
Daniel (prefeito de Santo André
assassinado em janeiro), de ser
um dos arrecadadores de propina
da cidade, ao lado do empresário
Sérgio Gomes da Silva. Ao Ministério Público, João Francisco afirmou ter ouvido de colaboradores
da Prefeitura de Santo André que
a suposta propina visava financiar
campanhas eleitorais do PT.
Ao entrar na comissão para depor, por volta das 14h15, João
Francisco disse que não pediu sigilo para seu depoimento: "Não
concordo [com o sigilo"".
O depoimento durou cerca de
uma hora e meia. O irmão do ex-prefeito permaneceu na sala da
CPI com seus três advogados,
mas não foi permitida a entrada
de sua mulher e filha, Marguerita
e Ana Cristina, respectivamente.
Ambas disseram que, ao contrário do que foi anunciado pela CPI,
não há proteção policial à família.
A comissão, composta por cinco vereadores (sendo apenas um
de oposição ao prefeito João Avamileno, do PT), também ouviu
ontem os depoimentos de Rosangela Gabrilli e de seu irmão Luiz
Alberto Gabrilli Neto, da família
que administra a Viação São José
de Transportes Ltda. Rosangela
criticou o sigilo dos depoimentos.
À Folha, ela declarou que a propina, cerca de R$ 40 mil mensais,
vinha sendo paga desde 1997. Segundo ela, há acordo entre as empresas de transporte da cidade e
Ronan Maria Pinto. O Ministério
Público calcula que a família Gabrilli entregou cerca de R$ 2 milhões ao grupo até o fim de 2001.
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