São Paulo, domingo, 27 de outubro de 2002

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RUMO A 2006

Bornhausen afirma que qualquer outro candidato governista no lugar de Serra ganharia a eleição e que "fisiológicos" do seu partido podem sair, pois "não farão falta"

PFL pretende constranger PT no Congresso

VALDO CRUZ
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
MARTA SALOMON
SECRETÁRIA DE REDAÇÃO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Pronto para assumir a oposição ao eventual governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o PFL avisa que não fará oposição "rancorosa", como a que os petistas fizeram ao governo Fernando Henrique Cardoso, mas "fiscalizadora".
Em quase 18 anos, o PFL só experimentou a oposição de verdade por pouco mais de dois meses, no final do governo João Figueiredo -o que dá pouco mais de 1% do tempo desde sua fundação.
Para começar, os pefelistas pretendem impor constrangimentos aos petistas. O presidente do PFL, Jorge Bornhausen, planeja ressuscitar projetos de aumento do salário mínimo e dos servidores apresentados pelo PT no Congresso.
Às voltas com uma ameaça de debandada de pefelistas rumo ao PL e PV, Bornhausen diz que os "fisiológicos" podem sair e "não farão falta". Ele acredita que não deve contar com grandes apoios na oposição. Avalia que o PMDB, "eminentemente fisiológico", irá se aproximar de Lula.
Acusado de ser o responsável pela sucessão de erros dos pefelistas na campanha presidencial, o senador catarinense não aceita o papel de culpado. Segundo ele, desde o início alertou FHC de que a vitória do tucano José Serra era impossível. "Qualquer outro teria ganho a eleição."

Folha - Qual o formato da oposição ao governo Lula?
Jorge Bornhausen -
Vamos discutir a posição do PFL no dia 31 de outubro. Faremos uma oposição fiscalizadora. Vamos fiscalizar as promessas, mas não impedindo que os projetos de interesse do país possam ser aprovados.
O PT fez uma oposição rancorosa, não foi uma oposição construtiva. Era contra o país, com aquela grande marcha sobre Brasília, com a CUT, as CPIs que eles tentavam fazer sobre corrupção para ter palco permanente, sem fato determinado, discursos violentos, projetos inviáveis, como o projeto do salário mínimo.
Nós deveríamos requerer urgência para os projetos apresentados pela bancada do PT, inclusive sobre salário mínimo, para ver se os petistas queriam prejudicar o governo Fernando Henrique ou se acreditavam que tais projetos deveriam ser aprovados. Ou o PT vota a favor ou o PT está fazendo demagogia.

Folha - O PFL quase sempre esteve ligado ao governo. Até mesmo o governo Collor o PFL sustentou por um período. Será muito difícil para o PFL aprender a fazer oposição?
Bornhausen -
O PFL nasceu exatamente indo para a oposição, quando fizemos a dissidência, criando a Frente Liberal. O PFL vai completar, na realidade, uma etapa de vida curta. Nessa vida curta, estivemos na oposição ao Figueiredo, contribuímos fundamentalmente para a transição democrática brasileira. No governo Itamar Franco tivemos representantes, mas não considerávamos esse apoio incondicional. Depois, participamos das eleições e, no governo Fernando Henrique, o PFL tinha de ser governo.

Folha - Qual o argumento que o sr. dará aos pefelistas que se vêem tentados a manter cargos na administração pública para que eles façam oposição?
Bornhausen -
Eu acho que quem quer ficar no governo de forma explícita, procurando fisiologicamente cargos, deve procurar outras legendas.

Folha - Pode haver uma grande debandada do PFL rumo a legendas como o PL e o PV, mais próximos do PT.
Bornhausen -
Não acredito em grande debandada. Mas os que quiserem apoiar o governo, os fisiológicos, esses poderão perfeitamente sair, não farão falta.

Folha - Como o sr. vai lidar com o senador Antonio Carlos Magalhães e a governadora Roseana Sarney, que apoiaram Lula?
Bornhausen -
Saberemos juntar as nossas idéias para tomarmos uma posição coerente no partido. O partido foi de tal forma solidário com Roseana, rompendo por unanimidade com o governo, que ela também tem laços profundos de gratidão ao seu partido.

Folha - Quem estará ao lado do PFL nessa oposição ao PT?
Bornhausen -
Num primeiro momento, eu acho que o PFL não vai agregar muitos partidos, porque a gente vê claramente que a tendência do PMDB é de se aproximar, de obter cargos, porque é um partido eminentemente fisiológico. Alguns setores do PSDB podem procurar ajudar ou participar [da oposição aos petistas", não a maioria, que vai dar apoio ao governo do Lula.

Folha - O PFL está a caminho da oposição por falta de alternativa. Como o sr. avalia o papel do partido. Há quem diga que o sr. errou.
Bornhausen -
Eu quero considerar o problema da sucessão desde o seu início. O que apresentei em nome do PFL foi a manutenção da coligação dos cinco partidos e a escolha de quem tivesse a melhor chance de vitória.
Defendi que o candidato não poderia ser ministro nem do núcleo do poder, que, normalmente, estaria em exaustão. E que seria muito melhor um governador. Diversas vezes eu conversei com o presidente sobre Geraldo Alckmin, sobre Tasso Jereissati, sobre Roseana Sarney.
Eu acho que a estratégia do PFL foi a única possível. Era a de, não tendo a possibilidade de haver a coligação, ter uma candidatura própria. Infelizmente, ela [a candidatura Roseana Sarney] foi abalroada. Não considero que eu tenha culpa no processo. Os culpados são outros, não eu.
Num segundo momento, nós fomos atropelados pela verticalização do TSE, que nos impediu de ter candidato à Presidência. As coligações em andamento nos Estados impediram que o PFL tivesse um candidato.
Aí o partido deixou livre. Nós [aliados de Bornhausen] optamos por Ciro porque achamos que o Serra tinha participação no episódio Roseana, seu gabinete tinha participação. Quando ele foi para o segundo turno com o Lula, nós fizemos uma recomendação. Eu voto no Serra admitindo os seus erros, os erros que teve em relação ao PFL, mas por ser uma pessoa mais experimentada do que o candidato do PT.

Folha - Mas a condução da estratégia pefelista não foi errada?
Bornhausen -
Nós ficamos afastados do processo. No dia 5 de maio, só para recordar, eu fui jantar com o presidente da República, o [então] ministro Pimenta da Veiga e o presidente do PSDB, José Aníbal. Propus ao presidente que o PSDB apresentasse outro candidato, que poderia ser o Tasso, o Aécio, e nós apoiaríamos na nossa convenção. Porque estávamos convencidos de que a vitória do Serra era impossível.
Qualquer outro candidato teria ganho a eleição. Ele não conseguia agregar, não conseguia se comunicar com o eleitor, conquistar o eleitorado. Não tinha carisma. Se tivéssemos adotado a candidatura Tasso, o Ciro teria desistido, o Tasso seria hoje presidente da República. Se tivéssemos adotado a candidatura do Aécio, o Aécio muito provavelmente seria presidente. Se tivéssemos adotado a candidatura Alckmin, teríamos ganhado bem a eleição. Tanto que o Alckmin está ganhando, e o Serra perdendo.

Folha - Pela sua avaliação, o presidente Fernando Henrique Cardoso é responsável pela derrota...
Bornhausen -
Eu acho que o presidente deixou que a candidatura Serra atropelasse seu próprio partido e os partidos de sua coligação. Ao deixar que isso ocorresse, ele deu estímulo à candidatura Serra, sem dúvida alguma.

Folha - A questão econômica não pesou?
Bornhausen -
Outro candidato não teria de estar discutindo a questão econômica. Porque a questão econômica é discutida por quem faz parte do núcleo do poder. No caso do Serra, ele tinha sido ministro do Planejamento. Mas um governador podia dizer: "Olha, eu não tenho nada com a gestão econômica, quero mostrar como está o meu Estado". Isso daria uma viabilidade muito maior de vitória. E o povo queria uma terceira via, que não era o Lula e não era o Serra. Quando a busca pela terceira via desapareceu, a candidatura Lula foi consagrada.

Folha - O que o sr. espera de um futuro governo Lula?
Bornhausen -
A campanha eleitoral foi feita com base em grandes promessas. O discurso do Lula foi construído por meio da pesquisa. Ele foi apenas o leitor do teleprompter. Se essas promessas não forem cumpridas -e eu acho muito difícil que esse ideal seja atingido-, as frustrações serão muito grandes, e as cobranças partirão dos próprios segmentos que apoiaram o candidato do PT, caso ele seja vitorioso.


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