São Paulo, domingo, 27 de novembro de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ CONEXÃO RIBEIRÃO

José Alfredo, ex-assessor do ministro em Ribeirão Preto, foi contratado pela Interbrazil para tentar conter a liquidação da empresa

Amigo de Palocci fez lobby para seguradora

CATIA SEABRA
DA REPORTAGEM LOCAL

ROGÉRIO PAGNAN
DA FOLHA RIBEIRÃO

Responsável por um rombo de pelo menos R$ 20 milhões no mercado, a Interbrazil Seguradora S.A. recorreu a um velho amigo do ministro da Fazenda, Antônio Palocci, para tentar conter a liquidação da empresa e construir pontes com o governo. Contratou os serviços do petista José Alfredo Carvalho, ex-assessor e ex-secretário de Palocci. Ao se apresentar com passaporte para a Superintendência de Seguros Privados (Susep) e o Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), José Alfredo é mais um integrante da República de Ribeirão Preto a enveredar pelo mundo do lobby.
Já sob risco de liquidação, a Interbrazil contratou José Alfredo no início deste ano. Diretor de Fiscalização na primeira administração de Palocci em Ribeirão Preto e, por duas vezes, líder do governo na Câmara daquela cidade, ele trabalhou pelo menos três meses na seguradora. Desfrutou, segundo dois ex-diretores da Interbrazil, de uma viagem a Londres às custas da empresa, além de um carro Ômega e um celular.
José Alfredo chegou a instalar um banco de couro no carro e mandar a conta para a seguradora. Na atividade de assessoria, intermediou o primeiro encontro da direção da Interbrazil com o procurador-geral da Susep, Moacyr Lamha. O procurador conta que os dois conselheiros da seguradora com quem conversou -Carlito Souza e Rondon Borges- já estavam no prédio da Susep quando chegaram à sua sala. "Seria leviandade dizer com quem estavam. Não sei", afirma, sem lembrar quem teria autorizado seu acesso ao edifício.
José Alfredo viaja tanto ao Rio, onde está a Susep, que petistas de Ribeirão Preto são capazes de garantir que ele trabalha na superintendência, por indicação do ministro da Fazenda.
Amigo de Palocci desde a década de 70, nos tempos de USP, José Alfredo também diz ter agendado uma audiência da diretoria da Interbrazil com Lídio Duarte, então superintendente do IRB.
Ele jura nunca ter se valido da amizade com o ministro. "Nunca cheguei no Palocci. Nunca pedi nada. Não tem nem solicitação de audiência lá no meu nome. Lógico que já me procuraram, mas você tem um Donizeti Rosa, você tem um Juscelino Dourado. Além dos caras serem mais gananciosos, terem um apetite danado, eles têm mais proximidade do Paloci. Não tenho nenhuma", diz.
Embora funcionários garantam que sua passagem pela empresa tenha sido mais duradoura, José Alfredo admite apenas uma temporada de três meses na Interbrazil, de fevereiro a abril.
A liquidação aconteceu em agosto, mais de dois anos depois de a Susep receber as primeiras denúncias de graves irregularidades contra a seguradora.
De 2003 até 18 de agosto, a própria administração federal contratou os serviços da Interbrazil, pagando R$ 1,1 milhão à seguradora. Assessor de Palocci quando o ministro foi vereador e deputado estadual, José Alfredo explica que deixou a Interbrazil quando o superintendente do IRB rechaçou a possibilidade de acordo. "Ele [Lídio] me passou que não era possível fazer nenhum acordo administrativo porque já estava na Justiça. E, quando está assim, você faz acordo só na Justiça. Não sou advogado, e a partir dessa constatação, foi que teve o rompimento do contrato verbal."
Hoje, segundo informações do mercado, José Alfredo estaria prestando serviço a uma outra seguradora em fase de intervenção branda. Ele diz ter chegado à direção da Interbrazil graças à proximidade com Carlito, a quem conheceria de Goiânia.
Governada pelo petista Pedro Wilson até o início deste ano, Goiânia também é o ponto de referência usado por Carlos Mundim para sua aproximação com a Interbrazil. Subprocurador da prefeitura na gestão de Wilson, ele foi contratado pela seguradora para instruir uma ação contra a Celg, em Goiás, em julho deste ano, após ter saído da prefeituta. "Não tem nenhuma indicação política. Nunca me envolvi com caixa de campanha", descarta Mundim, atualmente no governo do Estado do Tocantins.
Em seu depoimento à CPI dos Correios, o presidente da Interbrazil, André Marques da Silva, apontou Mundim como quem o teria apresentado a Adhemar Palocci, diretor de Planejamento da Eletronorte e irmão do ministro da Fazenda.
Mundim nega. "Nunca fiz essa apresentação, de apertar a mão. Um dia, participamos de uma reunião na prefeitura e Adhemar Palocci [então secretário de Fazenda de Pedro Wilson] estava lá. Mas nem falava direito com ele."
Mundim também não sabe precisar onde conheceu André Marques. "De Goiânia. Sabe como é? Goiânia", afirmou.
Em mais uma demonstração da generosidade da Interbrazil com amigos com trânsito político, a empresa acolheu a indicação do delegado Mauro Marcelo Lima e Silva para seu departamento jurídico. Foi a namorada de "um grande amigo", o advogado Marcelo Iacomine.
Com versões desencontradas, todas gravadas, Mauro Marcelo e Iacomine admitem a contratação, ocorrida em março de 2004. Nomeado diretor da Abin em julho daquele ano, Mauro Marcelo disse, num primeiro momento, que não reconhecia o nome da moça, confundindo-a com uma ex-aluna. "Já indiquei muitos alunos assinando como delegado. Na Abin, fui mais cuidadoso", disse.
Num segundo telefonema à Folha, lembrou que ela é a ex-namorada de um amigo. Mauro Marcelo afirmou ter indicado o amigo para prestação de serviço à Interbrazil. Depois de apresentado, Iacomine teria solicitado a contratação da namorada.
Iacomine, por sua vez, diz nunca ter trabalhado para a Interbrazil. "Conhecia o pessoal do departamento jurídico da Inter e pedi", afirma ele, pedindo para que sua namorada não seja identificada.
A Interbrazil ganhou espaço no noticiário político em setembro, quando reportagem da TV Globo revelou que a empresa pagara contas de campanha do PT em Goiás. E, revelada pela Folha, a cópia de uma troca de e-mails associa a Interbrazil a Adhemar Palocci. Nela, o presidente da Interbrazil recebe uma mensagem em que o irmão, Cláudio Marques da Silva, solicita o pagamento a fornecedores da campanha do prefeito de Goiânia. Adhemar Palocci foi secretário de Fazenda de Pedro Wilson. No e-mail, Cláudio, que é dono de gráfica, apresenta uma lista de credores. Antes, afirma "o que o Palocci quer é o seguinte: grana para pagar o seguinte (...)".


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