São Paulo, segunda-feira, 27 de dezembro de 2004

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BOMBEIRO DO PLANALTO

Presidente quer que divergências entre ministros da Casa Civil e da Fazenda não se repitam em 2005

Lula negocia paz entre Dirceu e Palocci

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva conversará com os ministros José Dirceu (Casa Civil) e Antonio Palocci Filho (Fazenda) no início do ano que vem e vai pedir que discutam menos em 2005 do que em 2004. Segundo apurou a Folha, Lula não gostou da troca de farpas entre os dois, algumas públicas, outras nos bastidores, nas últimas semanas.
Para o presidente, um clima ruim entre os dois dificultará as ações de sua administração em 2005, batizado por ele de "ano dos investimentos no Brasil", no qual "o governo vai colher o que plantou" em 2003 e 2004. Em férias, Dirceu volta ao trabalho no início de janeiro. Palocci descansará de 30 de dezembro a 10 de janeiro.
A interlocutores, Lula demonstrou contrariedade com a rodada de entrevistas de final de ano de Dirceu, ministro que faz ataques mais abertos a Palocci, e com algumas reações internas do ministro da Fazenda às críticas.
O presidente demonstrou insatisfação com revides do ministro da Fazenda, principalmente em conversas reservadas com membros do governo e com vazamentos, na visão de Lula, feitos para minar o chefe da Casa Civil.
O principal motivo das divergências entre Dirceu e Palocci são as discordâncias do primeiro em relação à política econômica. No entanto, pesa também um pouco de ciúme do chefe da Casa Civil em relação ao prestígio do ministro da Fazenda com o público e com Lula. Pesquisa interna do Planalto mostra que Palocci é um ministro popular e que Dirceu está entre os mais impopulares.
Nas conversas reservadas, Dirceu chega a dizer que não precisa fazer caminhadas com Lula para ganhar peso político -clara alfinetada no companheiro freqüente do presidente, que é Palocci.
Em entrevistas, Dirceu usou as expressões "cadeirada" (para se referir a uma discussão dura com Palocci), "pensamento único" (reação de membros do governo que não aceitam críticas) e criticou sem rodeios o recente processo de elevação dos juros.
Ultimamente, bombardeou com força a diretoria do Banco Central, pressionando por troca de diretores supostamente conservadores. Isso enfureceu Palocci e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles.
No início de dezembro, apesar das negativas de Palocci, ele desabafou em seu gabinete no Ministério da Fazenda. Disse que não agüentava mais Dirceu e que, no que dependesse dele, não o ajudaria mais a recuperar poder.
Palocci se referia ao dia 22 de novembro, quando Dirceu liderou uma saraivada de ataques dos ministros do PT à política econômica em reunião na Granja do Torto com Lula. Participaram desse encontro 17 ministros do PT e o presidente do partido, José Genoino. Palocci disse que foi uma tentativa de "motim" abafada por Lula, que disparou: "[A política econômica] Está dando certo, o caminho é esse".
Para acalmar Dirceu, Palocci passou a apoiá-lo nas articulações do PT para tentar derrubar o ministro Aldo Rebelo (Coordenação Política), às quais Lula resiste. Contrariado, o ministro da Fazenda ameaçou retirar o apoio.
Dirceu se sente traído por Aldo no fracassado empenho para aprovar a emenda constitucional que permitiria a reeleição dos presidentes da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), e do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Dirceu apoiou a reeleição, Aldo a minou.

Carimbos de bastidor
Já o ministro da Fazenda não perde a chance de carimbar as críticas de Dirceu como "fogo amigo", que atrapalham a política econômica e que seriam motivadas pela perda de espaço.
Passados quase dois anos de governo, Dirceu é hoje um ministro menos poderoso do que era na posse de Lula. O gerenciamento do governo, missão conferida a ele, ainda é contestado dentro do próprio governo. Ele também protagonizou indiretamente a maior crise da gestão petista.
Em fevereiro de 2004, com a revelação do caso Waldomiro Diniz, um auxiliar de confiança de Dirceu flagrado em atos de corrupção anteriores ao início do governo Lula, o ministro da Casa Civil encolheu politicamente.
Dirceu, que já havia perdido na reforma ministerial de janeiro a atribuição de coordenador político, pela sobrecarga de tarefas, viveu um ano difícil. Em novembro, chegou a dizer a amigos que estava insatisfeito com os rumos do governo e que podia reassumir o mandato de deputado federal e presidir a Câmara.
Lula, que preferia Dirceu na Câmara por acordo político e não como fera ferida, procurou acalmá-lo. Para o presidente, é melhor mantê-lo na Casa Civil, comprometido com o governo, do que tê-lo na Câmara contrariado.
Palocci, sempre elogiado publicamente por Lula, teve algumas reações a críticas internas à sua política que contrariaram o presidente. Apesar de publicamente se mostrar tolerante aos reparos à política econômica, ele joga pesado nos bastidores.
Tem sido assim, por exemplo, nas discussões sobre reforma ministerial. Lula quase deslocou Ciro Gomes (Integração Nacional) para o Planejamento, mas Palocci o vetou de imediato. Alegou que seria um risco à política econômica, pois Ciro diverge dela.


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