São Paulo, domingo, 28 de janeiro de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Pratini veta Alca sem reforma tributária

DO ENVIADO ESPECIAL A DAVOS

O ministro da Agricultura, Marcus Vinicius Pratini de Moraes, cumpriu ontem o papel que ele próprio define como o de "chutar o pau da barraca". Disse, em almoço sobre o Brasil, que o país não pode fazer um acordo como o da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) com o atual sistema tributário.
"Seria terrível", emendou Pratini, para em seguida voltar o foco para os Estados Unidos: também não haverá acordo se os EUA não abrirem seu mercado para, por exemplo, o suco de laranja, a soja e o aço brasileiros. Como se fosse pouco, o ministro acrescentou: "Digam ao governo americano que não venha com essa história de cláusula social, cláusula ambiental, cláusula trabalhista".
É uma alusão às tentativas do governo Clinton de vincular acordos comerciais à obediência pelos países firmantes de padrões trabalhistas e ambientais básicos.
O governo brasileiro sempre considerou tal vinculação como protecionismo disfarçado.
O discurso de Pratini foi feito na presença do presidente do Banco Central, Armínio Fraga, do presidente do BNDES, Francisco Gros, e do presidente do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), Enrique Iglesias, para uma platéia de aproximadamente 30 empresários, a maioria estrangeiros, interessados em Brasil.
A menção à reforma tributária, vinculada à Alca, deveu-se ao fato de Vittorio Corbo, professor de Economia da Universidade Católica do Chile, ter comentado que a economia brasileira "ainda é muito fechada". Armínio deu a resposta-padrão: concordou que as tarifas de importação, embora tenham sido reduzidas a 14%, na média, ainda são elevadas e prometeu "gradual redução".
Pratini foi na direção contrária: disse que, por causa da estrutura tributária brasileira, que pune o exportador, mas não o importador, a economia não é fechada. "Se a tarifa é 10%, na verdade é 5%", disse o ministro, porque, pela sua explicação, o importador não paga os impostos que o exportador paga.
Nesse ponto, Armínio concordou. Cobrado duas vezes sobre a reforma tributária, o presidente do Banco Central disse que "a distorção mais significativa no sistema tributário brasileiro é o fato de o Brasil ser um dos poucos países que exportam impostos".
Armínio prometeu que, em matéria de reforma tributária, o governo vai se concentrar este ano em simplificar o ICMS ("já há quase um consenso com os Estados") e em reduzir a carga tributária sobre a exportação.
O presidente do BC anunciou também "um tremendo boom de produtividade" no Brasil. Depois de dizer que a produtividade passara de um crescimento negativo de 0,8% nos anos 80 para um positivo de 0,9% nos 90, poderá facilmente saltar para 1,5% ou mais.
Já Francisco Gros, do BNDES, aproveitou a presença de empresários interessados em Brasil para dizer que, mesmo tendo privatizado ou cedido em concessão 166 empresas nos últimos anos, o país ainda tem "um enorme lote para privatizar".
Com esses números e promessas, o almoço sobre o Brasil foi música para os ouvidos dos empresários, por mais que Pratini atravessasse o samba. Mas o próprio ministro cuidou de explicar que cabe a ele "chutar, para depois o Itamaraty afagar".
(CLÓVIS ROSSI)



Texto Anterior: Citi prevê "6 meses muito difíceis"
Próximo Texto: Fórum Social: Agricultores farão protesto antitransgênico
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.