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Governo assenta sem-terra longe de acampamentos
Metade das famílias que recebeu lote de terra desde 2003 foi colocada na Amazônia Legal, que concentra 17% dos acampados
Incra alega dificuldade para obter terras em locais como Sul e Sudeste; para MST, criação de assentamentos tem caráter assistencialista
EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O governo Lula concentra assentamentos da reforma agrária longe dos acampamentos
dos sem-terra, o que acentua o
descontentamento de movimentos e entidades do campo,
em especial o MST, com a política agrária da gestão petista.
Dados oficiais e atualizados
obtidos pela reportagem revelam que, das 574 mil famílias
que o governo diz ter assentado
entre 2003 e 2009, 50% foram
encaixadas em lotes de Pará,
Maranhão e Mato Grosso, Estados da Amazônia Legal, região que concentra apenas 17%
dos acampados do país.
Bahia e Pernambuco, que
reúnem 37% daqueles que vivem em barracos de lona à espera de um lote de terra, acomodaram 8% dos assentados
até agora pelo governo federal.
O número de lavradores
acampados explodiu com a
eleição de Lula, passando de 60
mil, no final de 2002, para 150
mil, em meados de 2003. Foi
nesse período de euforia que
Lula prometeu assentar "todas
as pessoas acampadas do país".
Desde então, porém, o número de acampados permanece
estagnado na casa das 220 mil
famílias. No ano passado, por
exemplo, o governo federal
comprou e distribuiu 954 mil
cestas básicas para 224 mil famílias incluídas num cadastro
de acampados do Incra (Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária).
Segundo a coordenação nacional do MST, a "criação de assentamentos do governo tem
caráter de política assistencial,
buscando resolver conflitos
isolados sem fazer uma mudança na estrutura fundiária".
Por conta disso, segundo o movimento, "os assentamentos
criados se concentram na região Norte do país, por meio da
regularização fundiária ou da
utilização de terras públicas".
Segundo a lógica do presidente Lula de privilegiar os
acampados, o cruzamento entre os dados oficiais de assentados e acampados revela contradições principalmente no Norte e no Nordeste. Os Estados do
Norte concentram 11% das famílias acampadas do país, mas
receberam 47% dos assentamentos. Já os do Nordeste têm
56% dos acampados, ante 30%
dos assentados até agora.
Questionado sobre a incoerência, o presidente do Incra,
Rolf Hackbart, disse: "Buscamos obter áreas em todas as regiões. Mas nessas regiões tradicionais [onde estão os acampados] há uma dificuldade maior
de obtenção de terras".
Ele aponta duas razões: a incapacidade orçamentária do
órgão e o fato de, nessas regiões, como Sul e Sudeste, as
terras serem mais produtivas, o
que dificulta a localização de
áreas para a desapropriação.
"De qualquer forma, não vamos
deixar de atender as famílias da
região Norte. Elas existem e
elas querem terra."
As críticas dos sem-terra ao
governo não se resumem à geografia dos lotes. Até agora a gestão Lula cumpriu a meta anual
de assentamentos só em 2005.
No ano passado, por exemplo,
beneficiou 55.498 famílias, ante uma promessa de 75 mil.
Também por conta do preço
da terra, o governo deixou em
segundo plano o instrumento
da desapropriação (para quem
não cumpre índices de produtividade) e criou a maioria dos
projetos em terras públicas.
Esse distanciamento entre as
demandas dos sem-terra e as
ações do governo contribuiu
para que, recentemente, a cúpula do MST comunicasse ao
PT que não apoiará nenhum
candidato no primeiro turno
das eleições a presidente, assim
como já ocorrera em 2006.
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