São Paulo, terça-feira, 28 de março de 2006

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Ministro substituto previu ano eleitoral sem turbulências

GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA

Durante o governo Lula, o economista Guido Mantega sempre foi um dos maiores críticos da política econômica austera do Banco Central, seja quando ocupou o Ministério do Planejamento ou a presidência do BNDES. Mantega, no entanto, se mostrou, em entrevista à Folha no início deste mês, muito mais moderado em relação às suas críticas ao BC.
No final do ano passado, Mantega chegou a responsabilizar o BC pela queda do PIB de 1,2% no terceiro trimestre. No início deste mês, na véspera de sua ida a Londres na comitiva de Lula, Mantega concedeu entrevista à Folha, que não foi publicada. Minimizou o crescimento de 2,3% do PIB no Brasil, metade da média mundial.
"Eu acho que é parcial só olhar para o PIB. Você tem que olhar o conjunto de coisas que aconteceram em 2005. O emprego melhorou bem. A renda melhorou."
Questionado se o BC tinha acertado ao adotar uma política austera, respondeu: "Se ele acertou, não sei, mas os Bancos Centrais costumam ser conservadores".
Sobre as previsões para este ano eleitoral, a tese defendida por Mantega é que 2006 será um ano atípico porque não haverá turbulências na economia. A seguir, trechos da entrevista:

 

Folha - O sr. acha que poderá haver turbulência com as eleições?
Guido Mantega -
Ano eleitoral sempre é um ano um pouco mais agitado, mais confuso. É natural que as polêmicas fiquem mais aguçadas. Neste ano, no entanto, vamos ter um ano eleitoral atípico do ponto de vista da economia. Nos anos anteriores de eleições presidenciais, vivíamos um panorama de crise econômica, de instabilidade e de incerteza. Hoje, temos exatamente o oposto. Isso vai evitar aqueles fenômenos típicos do período eleitoral, como fuga de capitais. Não há nenhuma suspeita, nenhum risco de insolvência nas contas externas. Isso se deve aos fundamentos da economia, à solidez alcançada pela economia brasileira e à redução da vulnerabilidade. A dívida externa caiu drasticamente...

Folha - Mas, em compensação, a dívida interna está subindo...
Mantega -
Mas a dívida interna é uma questão de gestão interna. A dívida interna em relação ao PIB não subiu, ela está estacionada em 51,6%. Está sob controle.

Folha - Mas a dívida interna é mais cara do que a dívida externa.
Mantega -
O que tem de olhar é o endividamento público (a soma das dívidas interna e externa). O endividamento público não está aumentando. Se aumentou, foi apenas uma fração. A dívida interna é sempre mais cara que a externa, só que ela é menos perigosa, é menos explosiva. À medida que os juros caírem, ela também cai. Com a queda da taxa de juros, você alivia esse problema. A conta de juros podia ser menor -e será menor em 2006.

Folha - Mas o Brasil poderia ter ido melhor em 2005.
Mantega -
Sempre podia ser melhor, é claro. Mas, por outro lado, acho que há um vício dos jornalistas que estão sempre olhando só para um aspecto da questão, que é o crescimento do PIB. Eu acho que é parcial só olhar para o PIB. Você tem que olhar o conjunto de coisas que aconteceram em 2005, além do crescimento de 2,3% do PIB. O emprego melhorou bem. A renda melhorou bem. Houve ainda uma consolidação do mercado interno, uma revolução no crédito. O mercado de capitais se movimentou. Normalmente um crescimento de 2,3% do PIB não traria emprego. Isso estaria, digamos, violando a ortodoxia do pensamento. É um erro que todos -até eu-cometiam. Todos tinham aquela crença de que você só vai gerar emprego na economia brasileira se ela estiver crescendo a 5%. É verdade que, em 2004, nós crescemos a 5%, o que gerou emprego, mas em 2005 aconteceu um fenômeno. A economia cresceu menos e, mesmo assim, gerou emprego e produtividade. Trata-se de um novo modelo de desenvolvimento que está acontecendo. O PIB só não foi maior por causa da política monetária, mas isso criou as condições para que em 2006 nós tenhamos a eleição mais tranqüila da história do país em termos econômicos.

Folha - O sr. acha que o Banco Central, no fundo, acertou, então, ao ter feito uma política monetária mais austera?
Mantega-
- Se ele acertou, não sei, mas os Bancos Centrais costumam ser conservadores. O objetivo deles é garantir uma inflação baixa. Acho que a inflação baixa é responsável por uma parte desse aumento da renda média real.


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