São Paulo, quinta-feira, 28 de abril de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

PRESSÃO AMERICANA

Para presidente, venezuelano pode prejudicar vizinhos

Chávez exagera dose na ação antiamericana, avalia Lula

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva avalia que o seu colega da Venezuela, Hugo Chávez, está "ultrapassando os limites", segundo expressão de um auxiliar do petista, no tensionamento de sua relação com os Estados Unidos. Para Lula, Chávez pode prejudicar a Venezuela, mas também os vizinhos, ao estimular hostilidades a Washington no subcontinente latino-americano.
Essas avaliações foram levadas diretamente a Chávez na última segunda-feira pelo ministro da Casa Civil, José Dirceu. Os dois se reuniram a sós no Palácio Miraflores, em Caracas.
Num gesto que aumentou o ciúme do Itamaraty em relação às missões de política externa dadas a Dirceu por Lula, foi excluído da reunião o embaixador brasileiro em Caracas, João Carlos Souza Gomes. A praxe recomendaria a sua participação.
Para Lula, Chávez errou ao romper no fim de semana o acordo de cooperação militar com os EUA de mais de 30 anos. Há duas versões sobre a menção a esse tema na reunião Dirceu-Chávez.
Na versão do governo, Dirceu não pediu a Chávez que recuasse da ruptura para dar uma boa notícia no dia seguinte (terça-feira) à secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, com quem se encontraria em Brasília. Dirceu teria se limitado a dizer que gestos como aquele não ajudavam.
Outra versão dá conta de que Dirceu fez um pedido claro a Chávez para que recuasse com o intuito de agradar Condoleezza, mas o venezuelano teria negado.

Intermediário
Em recente viagem aos EUA, Dirceu teve um encontro com a secretária de Estado no qual tratou de Cuba, dizendo que era um erro o embargo americano contra a ilha. Ofereceu-se para intermediar uma eventual aproximação.
Para Lula, Dirceu tem o perfil ideal para tratar de questões relativas a Cuba e a Venezuela. Esteve exilado em Cuba, onde fez treinamento de guerrilha. É ainda um dos políticos petistas mais afinados com os antigos grupos que optaram pela luta armada contra a ditadura militar de 1964. Ou seja, tem a marca simbólica de combate ao "imperialismo ianque" tão cara e útil a Chávez.
A membros da cúpula do governo, Dirceu relatou que a conversa com Chávez foi "boa" e "franca". Os dois têm boa relação desde 2000, quando o PT, na oposição, já se alinhava a Chávez no acirrado debate com a oposição venezuelana. Lula também gosta de Chávez, mas, mais de uma vez, desaprovou atitudes dele.

"Até a morte"
Em 2003, no seu primeiro ano de governo, Lula relatou a auxiliares uma conversa com Chávez que o espantou. Segundo o brasileiro, Chávez disse que iria "até a morte", se necessário, para se manter no poder e derrotar a oposição venezuelana.
Lula disse a Chávez que questões políticas não podem ser levadas até a morte. Aos auxiliares, afirmou: "Fico preocupado com quem tem uma cabeça assim, porque pode fazer bobagem".
Para Lula, é positivo no jogo político internacional que o Brasil seja visto pelos Estados Unidos como força estabilizadora na América do Sul. Nesse contexto, rompantes de Chávez e do argentino Néstor Kirchner contra o FMI (Fundo Monetário Internacional) só reforçavam a imagem de responsabilidade que Lula conquistou internacionalmente. Mas excessos, principalmente os de Chávez, preocupam.
O presidente da Venezuela montou uma milícia de 30 mil soldados diretamente ligada a ele, fez contrato de mais de US$ 1 bilhão com a Espanha para comprar armamentos e adquiriu 100 mil fuzis AK-47 da Rússia. Essas ações desagradaram, por exemplo, à Colômbia e aos EUA. A Colômbia, por seu lado, acusa a Venezuela de proteger a narcoguerrilha. Os EUA endossam.


Texto Anterior: Painel
Próximo Texto: Agenda de Dirceu contraria Itamaraty
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.