São Paulo, domingo, 28 de maio de 2006

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Kroll recorreu à CIA para investigar governo Lula

Documento envolve Daniel Dantas na espionagem contratada pela Brasil Telecom

Relato aponta Romeu Tuma e Paulo Lacerda, diretor da PF, como defensores de interesses da Telecom Italia contra dono do Opportunity

LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ex-diretor da Kroll Frank Holder recorreu à CIA, o serviço de inteligência norte-americano, para investigar autoridades do governo brasileiro a partir do contrato com a Brasil Telecom fechado na gestão do Opportunity à frente da companhia, segundo documentos da empresa de espionagem americana obtidos pela Folha.
Num relatório do dia 7 de fevereiro do ano passado, Holder resume o teor de conversas que havia tido duas semanas antes com o então embaixador dos Estados Unidos no Brasil, John Danilovich, o conselheiro comercial, John Harris, e o chefe das operações da CIA no país, o qual não é identificado.
Os pontos centrais dos encontros são a disputa do Opportunity contra os fundos de pensão pelo controle da Brasil Telecom e a posição do governo brasileiro sobre a Kroll, alvo da Polícia Federal na Operação Chacal por ter investigado autoridades brasileiras a mando do Opportunity. A Folha revelou o caso em julho de 2004.
De acordo com o documento, os três integrantes do governo americano tiveram conversas diretas e privadas com as seguintes autoridades brasileiras: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os então ministros Antonio Palocci (Fazenda) e José Dirceu (Casa Civil), Márcio Thomaz Bastos (Justiça) e pessoas de dentro da PF ou muito próximas à corporação.
Holder se tornou investigador particular após anos de experiências como espião da CIA. No relatório da Kroll, ele informa o que o encarregado pelas operações da agência de inteligência americana no Brasil lhe contou. Disse que o gabinete de Lula (a expressão em inglês inclui os ministros) não tinha nenhuma questão em curso contra a Kroll ou seu cliente, sempre identificado como BrT [Brasil Telecom]/Opp [Opportunity].
Acrescenta, no entanto, que "pesquisa independente" indicava que haveria entre as autoridades brasileiras quem continuasse a defender os interesses italianos. No caso, a Telecom Italia, sócia da Brasil Telecom que também tinha atritos com o Opportunity.
Segundo o integrante da agência de inteligência americana, no relato de Holder, o grupo ligado aos italianos seria encabeçado pelo senador Romeu Tuma (PFL-SP) e "seus contatos na PF", que seria o atual diretor-geral da corporação, Paulo Lacerda. Tuma ocupou no passado o mesmo cargo de Lacerda.
O agente da CIA teria dito também que não era possível saber o grau de apoio dado pelo ministro da Justiça ao grupo ligado aos italianos. Ele teria indicado, no entanto, que Bastos permitiria a Tuma e a Lacerda continuar a operar, sugerindo que o ministro tinha "simpatia" pelos objetivos dos dois.

Quatro partes
O relatório da Kroll é composto de quatro blocos. O primeiro é a investigação feita por Holder. A Kroll confirmou a existência e a veracidade das demais partes do documento, mas não quis comentar o trabalho de Holder. A empresa moveu uma ação contra o ex-agente da CIA por desrespeito a cláusulas contratuais.
De acordo com o relatório do dia 7 de fevereiro do ano passado -assim como um outro, feito três dias depois-, o banqueiro Daniel Dantas, dono do Opportunity, não somente era informado dos passos da Kroll no caso Brasil Telecom como participava de determinadas decisões tomadas pela agência de investigação. Dantas sempre negou envolvimento nos trabalhos da Kroll.
Além de reconhecer o relatório do dia 7, a Kroll informou que teve muitos encontros com a direção da Brasil Telecom e que em diversas ocasiões Dantas esteve presente.
Reportagem da revista "Veja" de duas semanas atrás informou que Dantas, por intermédio de Holder, teria repassado à revista uma lista com supostas contas (sem veracidade comprovada) de autoridades brasileiras em paraísos fiscais. Os integrantes do governo são os mesmos que Holder cita em seu relatório: o presidente Lula, os ex-ministros Palocci e Dirceu, Thomaz Bastos, o senador Tuma e o diretor-geral da PF, Paulo Lacerda. Todos negaram ter contas no exterior.
Em 2005, os fundos de pensão, liderados pela Previ (Banco do Brasil), conseguiram na Justiça tirar o comando da Brasil Telecom do Opportunity. A nova direção requisitou à Kroll os documentos das investigações pagas pela companhia. Como encontrou dificuldades, recorreu à Justiça americana. Após um acordo, a Kroll encaminhou à Brasil Telecom 21 caixas. Há duas semanas, a CVM (Comissão de Valores) requisitou os papéis. Na semana passada, foi a vez da PF.


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