São Paulo, sexta-feira, 28 de novembro de 2008

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ONG é suspeita de desvio na Funasa, aponta procurador

Com repasses de R$ 75 mi, entidade foi a que mais obteve verbas; Receita contesta dados

Ministério Público diz ter indícios de que associação Projeto Rondon não atua na maioria das aldeias em que deveria prestar serviços

ANDREZA MATAIS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Ministério Público Federal de Santa Catarina investiga repasse milionário da Funasa (Fundação Nacional de Saúde) à associação Projeto Rondon, de Santa Catarina. Segundo a CPI das ONGs, a entidade foi a que mais recebeu recursos do órgão de 1999, quando começou a prestar assistência à saúde indígena, até 2007.
O Ministério Público Federal já encontrou indícios de que a ONG não atua na maioria das aldeias em que deveria e que inexiste controle da Funasa sobre suas atividades. A ONG deveria atuar em quatro Estados: Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. Também já atuou no Paraná.
"Há municípios que nunca foram atendidos pela ONG, podendo-se concluir que o número de índios efetivamente assistidos é muito inferior ao 38.658 contabilizados oficialmente", diz relatório do procurador Celso Três. Ele descobriu que a Funasa nem sequer sabe quanto repassou para a entidade.
O órgão informou ao Ministério Público que, de 2000 a 2007, foram R$ 75 milhões para a ONG, o que contradiz dados da Receita Federal -que, com base na CPMF, calcula que o repasse teria sido de R$ 95 milhões só de 2003 a 2007. Como os convênios vêm desde 1999, Três calcula que o total ultrapassa os R$ 100 milhões.
O volume de recursos destinado à ONG é só para cuidados básicos de saúde. Tratamentos de média e alta complexidade são feitos pelos hospitais próximos às aldeias. Mesmo assim, o dinheiro não é usado de forma adequada, diz Três: "Os gastos não encontram justificativa nos trabalhos prestados. Gastou-se muito e, diante da realidade encontrada nas aldeias, fez-se pouco ou quase nada".
O relatório do Ministério Público cita exemplos dos problemas que ocorrem nas aldeias. Em Novo Hamburgo (RS) e Lageado (RS), "a ONG Projeto Rondon não presta qualquer tipo de serviço aos índios da região". Em Cruz Alta (RS) "não há atendimento médico e odontológico nas aldeias, sendo os indígenas encaminhados ao hospital municipal e à Secretaria Municipal de Saúde". Em Santa Rosa (RS), os medicamentos são distribuídos pela Funasa, a ONG oferece apenas os que não integram a lista básica. O atendimento médico e odontológico nas aldeias é feito por profissionais contratados diretamente pelos municípios.
Em Joinville (SC), a ONG também não oferece atendimento médico e odontológico nas aldeias: "A atuação da ONG está muito aquém do esperado, caracterizada pela incompetência na prestação de serviço público e pelo uso indevido de verba pública, não tendo a Funasa qualquer controle em relação às atividades de sua conveniente, em muitos casos chegando ao absurdo de financiar serviços e produtos que, de acordo com o convênio, seriam de obrigação da associação".
Há duas semanas, o ministro José Gomes Temporão (Saúde) disse que o órgão presta serviço de baixa qualidade aos índios e é "corrupto", provocando forte reação do PMDB, que indicou Danilo Forte para a Funasa.
O Ministério Público Federal no Paraná também investiga a ONG, que atuou no Estado até 2005, quando perdeu o convênio após a decisão do Ministério da Saúde de criar um novo distrito só para atender os índios. A coordenadora operacional da entidade, Cleide Maria Marques Grando, acusou a Funasa do Paraná de ter difamado a ONG por ela ter se recusado a desviar dinheiro para o PTB.
Em 2007, Cleide acusou o então chefe do Distrito Sanitário Especial Indígena do Paraná, Sérgio Esteliodoro Pozzeti, e Jefferson Reali Paraná, ex-chefe do Distrito, de terem lhe confidenciado a necessidade de arrecadarem R$ 10 mil por mês para o partido por meio "de convênio da saúde indígena". Pozzeti era filiado na época ao PTB. Paraná é irmão do coordenador regional da Funasa, Vinícius Reali Paraná. O PTB nega tê-lo indicado ao cargo. A Funasa disse que ele será afastado por 60 dias até que as denúncias sejam investigadas.


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