São Paulo, domingo, 29 de fevereiro de 2004

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Genoino diz que oposição é lacerdista

JOSÉ ALBERTO BOMBIG
DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente do PT, José Genoino, diz que os adversários do partido, chamados por ele de "conservadores" e "lacerdistas tardios", usam o caso Waldomiro Diniz para "enfraquecer" o governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
Carlos Lacerda (1914-1977) foi um dos principais líderes conservadores do país. Participou de articulações para depor os presidentes Getúlio Vargas (1883-1976) e João Goulart (1918-1976), derrubado em 64. E também tentou impedir a posse de Juscelino Kubitschek (1902-1976).
Em entrevista à Folha anteontem, Genoino disse, sem citar nomes, que a oposição quer "um governo fraco para voltar ao poder em 2006". Leia a entrevista:

Folha - O senhor concorda que há uma crise hoje no país?
José Genoino -
Acho que nós temos um fato policial e criminal. O governo tomou medidas enérgicas e imediatas ao demitir o Waldomiro. Setores conservadores, no momento em que o Planalto fez uma reforma ministerial bem-sucedida e que trabalhava com uma agenda para 2004, com crescimento econômico e melhoria dos programas sociais, fizeram uma disputa política para enfraquecer o governo e atacar o PT. É um ambiente artificial de crise política. O governo tomou todas as medidas, agiu rapidamente e não tem nada a temer.

Folha - O senhor falou que o governo agiu rapidamente, mas em julho último surgiram denúncias de irregularidades na atuação de Waldomiro. O senhor não acha que nessa época o ministro José Dirceu deveria ter demitido o assessor?
Genoino -
Nós não podemos aceitar a tese de acusar um superior porque o seu subordinado praticou uma irregularidade antes de assumir o governo. O ministro José Dirceu não tem nada a ver com isso. Esse episódio, criminal e policial, mostra aos dirigentes do PT que eles devem ter mais vigilância, mais cuidado e maior controle das nomeações. Temos que tirar lições. Mas, politicamente, não podemos aceitar que erros de procedimento produzam, por parte de setores conservadores, a tática de atacar o ministro. Eles tentam enfraquecer o governo, mas o alvo principal é o PT, um partido que tem base social e política. A virulência contra o partido é maior do que contra o governo. Nós fizemos da ética um campo de batalha. Somos o alvo tendo em vista a disputa eleitoral de 2004. Tentam fazer aquilo que eu classifico como lacerdismo tardio de alguns vestais do presente, que buscam igualar todo mundo. Temos clareza do que está em disputa nesse processo. Como você pode fazer o julgamento moral de um partido com tantos filiados? Um partido que pode, na sua história, ter erros, até graves, mas que corta na carne, às vezes até com injustiça. Isso é autoritário, injusto e inaceitável.

Folha - O sr. tem dito que o Waldomiro não é filiado ao PT e que o caso não diz respeito ao partido. Por outro lado, vocês são acusados de terem aparelhado o Estado. Por que então ele foi colocado em um posto tão importante?
Genoino -
Waldomiro nunca foi do PT, nunca participou de reuniões nossas. Trata-se de um caso criminal. Mas isso não pode ser motivo para que peçam a cabeça do superior dele. Mas eu tenho dados aqui sobre o número de cargos do PT no governo. Dos 17 mil servidores em função gratificada, o PT só nomeou 13%. Em vários órgãos, você vai encontrar gente que não é do PT. Esse servidor praticou o crime em 2002, e o governo está sendo transparente.

Folha - O PT cobrou muitas CPIs no governo FHC. Por que o partido não apóia uma investigação do Congresso no caso Waldomiro?
Genoino -
Esses casos foram todos casos denunciados publicamente durante o governo FHC. Nós nunca trouxemos um fato anterior. Durante 20 anos no Congresso, eu nunca me especializei em CPI, não existe um requerimento assinado por mim. O alvo não é o governo.

Folha - O PT é a favor do jogo?
Genoino -
Minha posição pessoal: acabar com bingo e caça-níquel. São atividades em que não sabemos onde começa o ilegal e termina o legal. Vou defender a posição no partido e na bancada, mas não há uma questão fechada.

Folha - O sr. disse em 2002 que nem todo mundo no PT era puro...
Genoino -
Eu reafirmo essa frase. Mas todo julgamento abstrato provoca autoritarismo. Se alguém do PT for pego, comprovadamente, cometendo irregularidade, nós vamos tomar medidas imediatas de defesa do patrimônio ético.

Folha - O PT não foi muito rígido com a senadora Heloísa Helena (sem partido-AL), por exemplo, e não está agindo assim nesse caso?
Genoino -
São casos totalmente diferentes. Não existe ninguém do PT com acusação de corrupção.

Folha - O senhor defende um afastamento temporário do ministro José Dirceu?
Genoino -
Não existe nada contra o ministro. José Dirceu não praticou nenhuma irregularidade. Sou solidário a ele. Nós estamos curtidos em uma história que tem a festa e a poesia, mas que também tem a dureza.

Folha - Houve um erro político do PT ao anunciar que faria um ato de desagravo ao ministro e depois ter recuado?
Genoino -
Não. Havia uma manifestação de dirigentes do partido de fazer um ato de apoio ao Zé Dirceu. Eu ouvi alguns companheiros do PT e do governo. Eles fizeram ponderações, e eu levei em conta.

Folha - No caso Santo André, o PT defendeu a tese de que era um crime comum. O Ministério Público foi em outra linha de investigação. Como o senhor vê esse episódio?
Genoino -
Quem conduziu essa investigação foi a Polícia Civil de São Paulo e o Ministério Público, duas instituições não comandadas pelo PT. Não investigamos nem concluímos nada. No dia 24 de janeiro de 2002, poucos dias após a morte do Celso Daniel [prefeito de Santo André], justificam a quebra de sigilos telefônicos de petistas com o argumento de que é para prevenir o tráfico de drogas. Essa fita foi ilegal.

Folha - O caso Waldomiro muda a estratégia do PT para as eleições?
Genoino -
Nós vamos trabalhar muito para ganhar as eleições. Mas os nossos adversários anteciparam as táticas de como pretendem enfrentar o PT. Não vamos atacar ninguém, mas nada ficará sem resposta.

Folha - O senhor ainda acha que o PSDB está por trás desse caso Waldomiro?
Genoino -
Existem setores do país que até hoje não aceitam que o governo do PT faça as mudanças, há uma disputa política em curso. Nunca acusei ninguém diretamente de estar por trás disso.

Folha - O PT está se informatizando com um leasing do Banco do Brasil. Se fosse o PFL fazendo a mesma coisa no governo FHC, o que o senhor diria?
Genoino -
Eu iria solicitar na Câmara informações. O PT fez um contrato transparente.

Folha - Quais as taxas de juros?
Genoino -
Não sei te informar, mas são as de mercado.

Folha - Como o senhor vê sua gestão à frente do partido?
Genoino -
A nossa geração é originária dos anos rebeldes de 1968, nós sabemos o que é derrota, e não é derrota eleitoral, é derrota de cinco anos de cadeia. A minha vida política está realizada.

Folha - O senhor foi cogitado para assumir a Casa Civil?
Genoino -
É a primeira vez que eu ouço falar disso. Eu fiz uma opção e estou feliz de presidir o PT até 2005, quando haverá eleição direta. Depois, vejo o que faço.

Folha - O senhor falou em conservadorismo. É a direita?
Genoino -
O PT é radical, vai sempre defender seu programa de mudanças. A sociedade brasileira vem de uma experiência de 500 anos de governos autoritários, conservadores. Você mudar um país desse não é fácil. Então, os conservadores querem um governo fraco, querem atacar o PT para voltar ao poder em 2006. Temos que ter consciência dessa disputa política em curso.



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