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Relator é contra rever Lei da Anistia para punir torturador
Para Eros Grau, pacto político foi "bilateral" e permitiu redemocratização do país
STF retoma hoje julgamento de ação da OAB que pede
mudança na legislação para
que ex-agentes da ditadura
possam responder por crime
Luiz Adams, advogado-geral da União, no STF; ao fundo, Eros Grau, Britto e Celso de Mello
FELIPE SELIGMAN
LUCAS FERRAZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O ministro do STF (Supremo
Tribunal Federal) Eros Grau,
relator da ação que questiona a
Lei da Anistia, votou ontem
contra a ação que pede que a lei
seja revista para que agentes de
Estado acusados de torturar
opositores na ditadura militar
(1964-85) sejam punidos.
A sessão, contudo, foi interrompida após o voto do relator,
que durou quase três horas. O
julgamento será retomado hoje
à tarde. Oito ministros ainda
precisam votar. Ontem à noite
os membros da corte teriam
jantar com o presidente Lula.
Segundo Eros Grau, ele próprio uma das vítimas da ditadura -foi preso e torturado durante os anos 1970-, a lei foi
"bilateral", beneficiando todos
os lados no período. Ainda de
acordo com ele, a anistia foi um
grande pacto político que serviu como ponte para a redemocratização e só não foi tão ampla porque, à época, não se contemplou os já condenados por
crimes como terrorismo.
"Nem mesmo o Supremo
Tribunal Federal está autorizado a reescrever leis de anistia.
Só o Congresso Nacional poderia fazer isso", disse o ministro,
que revisitou todas as anistias
já editadas no Brasil, além de
casos semelhantes em países
da América Latina.
Mesmo afirmando que os crimes estão perdoados, Eros
Grau, que deixa o tribunal em
agosto, quando se aposenta,
afirmou que "eles não devem
ser esquecidos". "É necessário
dizer, vigorosa e reiteradamente, que a decisão (...) não exclui
o repúdio a todas as modalidades de tortura, de ontem e de
hoje, civis ou militares".
Ao final, o presidente do STF,
Cezar Peluso, e os ministros
Marco Aurélio Mello e Gilmar
Mendes elogiaram o voto do relator, que chegou a se emocionar ao concluir sua argumentação. A tendência do tribunal é
seguir a posição apresentada
ontem. Não participam do caso
os ministros Joaquim Barbosa,
de licença médica, e José Antonio Dias Toffoli, impedido por
ter atuado no processo como
advogado-geral da União.
A sessão de ontem marcou a
estreia de Peluso na presidência do tribunal. Ele substituiu o
colega Gilmar Mendes, que voltou à bancada dos ministros.
A ação que pede a revisão da
Lei da Anistia foi proposta pela
OAB (Ordem dos Advogados do
Brasil), entidade que apoiou a
elaboração da lei, em 1979, mas
que em 2008 questionou na
corte a sua extensão e passou a
defender a possibilidade de punir militares que praticaram
atos de tortura.
Racha
A polêmica sobre a Lei da
Anistia causou um racha no governo Lula. O assunto vem sendo discutido desde 2007.
A AGU (Advocacia-Geral da
União) e ministérios como Defesa e Itamaraty são contrários
à mudança. Por outro lado, Casa Civil, Ministério da Justiça e
Secretaria de Direitos Humanos defendem a responsabilização dos torturadores.
Nelson Jobim (Defesa) defendeu que a lei trouxe "conciliação e pacificação" e foi essencial para restabelecer a democracia. O outro lado, encabeçado pelo ex-ministro da Justiça
Tarso Genro e Paulo Vanucchi
(Direitos Humanos) diz que a
lei protege torturadores. Ontem, o advogado-geral da
União, Luís Inácio Adams, argumentou que a anistia foi um
pacto que não pode ser revisto.
A decisão do STF não esgotará a discussão. Nos dias 20 e 21
de maio, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da
OEA (Organização dos Estados
Americanos) poderá condenar
o Brasil por sua legislação. O
julgamento será específico sobre a guerrilha do Araguaia,
mas a Lei da Anistia brasileira
também será analisada.
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