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NO PLANALTO
Oposição transforma FHC num defunto com vida
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Não convém colocar cobras
venenosas e abelhas africanas num mesmo ambiente em
que estejam presentes mais de
dois presidenciáveis de oposição.
Ofídios e insetos podem não sobreviver.
Com tantos erros novos por cometer, a oposição brasileira está
na bica de perpetrar de novo o
mesmo velho erro de sempre: a
desunião. Os fiascos do passado
não ensinaram nada.
FHC, como se sabe, nem conseguiu transformar os seus sonhos
em realidade nem logrou impedir
a realização de seus pesadelos. No
vácuo da ira que despertou germinaram quatro candidaturas de
contestação: Lula, Ciro, Itamar e
Garotinho.
Unificada, a oposição aplicaria
no consórcio governista uma sova
histórica. Desunida, arrisca-se a
juntar material para mais um
epitáfio do espírito de mudança
que contagia a sociedade.
De erro em erro, a oposição está
transformando a fabulosa debilidade do governo em trunfo de
FHC. Embora comande um governo convertido em central de
escândalos, embora acene com
um 2002 de penúria, cintos apertados e desemprego, o presidente
do apagão está a um passo de injetar um nome (qualquer um) no
segundo turno da própria sucessão.
A questão é mais aritmética do
que política. As pesquisas indicam que a oposição capturou algo
como 70% dos votos do eleitorado
(a soma dos percentuais de Lula,
Ciro, Itamar e Garotinho). Resta,
porém, uma avenida de 30% para o desfile do candidato de FHC.
Não é pouca coisa. Com metade
disso, Lula foi ao segundo turno
em 1989.
"São grandes as chances de um
governista ir para o segundo turno", diz, por exemplo, José Eduardo Dutra, o líder do PT no Senado. "Eles precisariam ser muito
incompetentes para ficar de fora.
E a história tem demonstrado que
as elites brasileiras não são tão
inábeis assim."
A história, de fato, tem espancado a lógica. Se um país como o
Brasil, templo universal da desigualdade, fosse presidido pela lógica, um candidato como Lula jamais teria perdido eleições para
FHC. Muito menos para Collor.
Excluída da renda, a maioria do
eleitorado tenderia a enxergar-se
em Lula. Votando nele, votaria
em si mesma.
Mas a incoerência da democracia brasileira vem proporcionando à plutocracia uma extraordinária longevidade no poder, uma
sobrevivência tão real quanto ilógica. É como se os despossuídos
não tivessem noção da própria
força.
O máximo que o desespero da
maioria conseguiu produzir foi a
ascensão de FHC, um esquerdista
adotado pela minoria para simular mudança. Sua primeira providência foi rasgar a certidão de
nascimento social-democrata.
Marcou o início de sua administração com um gesto revolucionário: a liberação da navegação de
cabotagem. E prepara-se para entregar ao sucessor o mesmo legado de iniquidade social que recebeu sete anos atrás.
A despeito do retrospecto, frustraram-se até aqui todas as tentativas de costura de um entendimento da oposição. Reunidos na
casa do senador Paulo Hartung
(PPS-ES), antes do início do recesso parlamentar, um grupo de deputados e senadores marcou para
agosto uma última tentativa.
Busca-se não mais a utópica
junção de candidaturas, mas o estabelecimento de um pacto de
não-agressão. "Para que a aliança da oposição aconteça no segundo turno, é essencial que a
convivência no primeiro turno seja civilizada", diz Eduardo Dutra.
"A aliança é necessária não apenas para o segundo turno, mas
para governar depois", faz eco o
deputado Aloizio Mercadante,
candidato petista ao Senado.
Por mais hábeis que sejam os
oposicionistas, é grande o risco de
um cometer uma sinceridade com
o outro. Sobretudo no calor da
disputa por um passaporte para o
segundo turno. Há farto material
para a discórdia.
Lula convive com o espectro do
início pífio de Marta Suplicy, gerente da mais vistosa vitrine administrativa do PT. Itamar traz a
tiracolo Newton Cardoso, uma
espécie de Jader Barbalho com
menos sobrancelha e mais barriga.
Em comerciais de TV, Ciro Gomes promete o novo tendo como
garoto-propaganda o velho e bom
Roberto Jefferson. E Garotinho,
protagonista de travessuras fiscais nada cristãs, escorrega das
páginas de política para o noticiário policial.
Prudente, a bancada oposicionista no Congresso planeja conversar com os seus presidenciáveis
separadamente. Primeiro Lula,
depois Ciro, em seguida Itamar e,
talvez, Garotinho.
Se tudo der certo, a oposição tomará juízo e oferecerá ao país um
mapa de suas convergências e
uma lista de compromissos públicos. Se a coisa desandar, FHC receberá de presente o trunfo das
divergências dos adversários.
Homo brasilienses: Deu-se em
novembro do ano passado. Alcides Tápias estava amuado com
Everardo Maciel. Estimulado por
Jorge Bornhausen, Marco Maciel
convidou os dois para um jantar
de reconciliação. Abriu os portões
do Palácio do Jaburu às 20h30 de
uma quinta-feira. Tápias chegou
por volta das 22h. Impaciente,
Bornhausen desistira de esperá-lo. Vencido o "boa-noite" protocolar, Tápias pespegou: "Estou
muito insatisfeito com você. Sei
que anda plantando notícias nos
jornais contra mim". E Everardo:
"Você não me conhece. Jamais
plantei nota contra ninguém em
jornal. E não admito que falem
comigo assim". Nem a sobremesa
adoçou o ambiente. Passados oito
meses, Tápias dá adeus a Brasília,
cidade onde não se deve confundir um pajé de segundo escalão
com um mané sabujo e babão.
Lugar onde uma alma descuidada que saia para jantar se arrisca
a ser jantada.
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