São Paulo, domingo, 29 de setembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"Sem obsessão", Collor quer voltar

LUIZ CAVERSAN
ENVIADO ESPECIAL A ARAPIRACA

"Não me deixem só!"
O grito vem do homem suado, cabelos agora alourados e braço erguido para agitar a massa.
A massa é escassa, moradores de um bairro miserável do sertão, e reúne muitos dos descamisados a que se referiu há pouco o candidato ao governo do Alagoas Fernando Collor de Mello.
"Não me deixem só", "minha gente", descamisados, promessas a aposentados e a jovens desempregados. Praticamente tudo o que se ouviu ali foram jargões políticos com pelo 13 anos de vida, surgidos na campanha de 1989.
Hoje, esses termos são utilizados em seu "retorno à vida pública" após um período "gratificante", em que viu "o Brasil avançar graças a medidas na área econômica". Medidas, segundo diz, tomadas por ele na Presidência.
Presidência à qual quer retornar, isso já está decidido. Mas, afirma, "sem obsessão alguma".
O retorno de Collor às ruas não deve causar surpresa. "Isso era uma coisa absolutamente esperada. A intenção é retomar minha vida pública, que foi interrompida sem que eu quisesse em 1992."
Dos anos da "vida pública" que passou na Presidência, Collor tem só boas recordações. "Houve um momento de ruptura com o Brasil arcaico. Hoje o país é um parceiro internacional graças às medidas na área econômica."
Ele vai além: "Na área cultural, que me criticou muito, eu nunca soube por que, eu criei a Lei Rouanet e a Lei do Audiovisual".
E não tem dúvidas sobre sua gestão: "Objetivamente, meu período de governo foi extremamente positivo para o país."
Collor foi eleito como fenômeno de massas, mas se viu apeado do poder em meio a uma das maiores mobilizações populares da história. A explicação? "Eu não sou um líder político, sou um líder de massas. Mas, no momento em que houve aquela vaga de denúncias, a população ficou no mínimo na dúvida. Aí eu fui perdendo minha grande aliança com a população. Disso se aproveitaram os políticos para descarregar suas frustrações em relação a mim."
São deputados e senadores para quem volta suas baterias:
"Os prazos foram antecipados, a legislação não foi obedecida. Esse calhorda do Ibsen Pinheiro [presidente da Câmara na época da CPI" cortou os prazos."
Mais uma vez ele afirma que não poderia ter sido afastado. "Depois de dois anos e meio de investigações, o Supremo Tribunal Federal disse que não cabia nenhuma daquelas acusações."
Argumenta mais: "Quando apresentei minha renúncia, o julgamento no Senado deveria cessar. Eles suspenderam a sessão, deram posse àquele luminar que é o Itamar e depois retomaram. Foi uma violência atrás da outra."
Apesar dos termos e da ironia, diz que não há mágoas. "Menos em homenagem aos meus adversários, mais pensando em minha própria saúde."
Nem quanto ao fato de ser chamado de ladrão na rua? "Tenho o sentimento de quem compreende a massa; isso faz parte do momento. Tantas vezes eu disse nome feio e vi que não era bem assim."
Entenda-se esse raciocínio de Fernando Collor como decorrência de outros dois: "Depois de dez anos a população poderá fazer um correto juízo" e "Nenhum julgamento é definitivo".
Ele, de sua parte, diz não ter do que se arrepender: "Não, a gente aprende com a vida".


Texto Anterior: Dispersão política marca caras-pintadas
Próximo Texto: Governo fez uma reviravolta na economia
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.