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A GRANDE FAMÍLIA
Pela primeira vez, petista vence eleição em Caetés; parentes sonham com uma vida melhor
Cidade natal de Lula decreta feriado
XICO SÁ
ENVIADO ESPECIAL A CAETÉS (PE)
Os parentes mais próximos sonham com dias melhores e visitas ao Palácio do Planalto; o prefeito Zé da Luz, também petista,
espera ampliar as verbas que o
governador Jarbas Vasconcelos
(PMDB), cabo eleitoral de José
Serra (PSDB), não teria liberado.
Ontem foi feriado no município de Caetés, onde nasceu o
presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. O número de parentes, que já era grande nos últimos dias, amanheceu maior ainda, mas a família tem uma conta
razoável: 50, 55 pessoas, sendo
30 primos. O resto é "história de
Trancoso" [invenção, fantasia],
como alerta Gilberto Ferreira,
55, pequeno agricultor, primo
de verdade: "Espero que o nosso
presidente ajeite as coisas para
quem vive de roça, que é um penar danado, ano atrás de ano".
Tia de Lula, Corina Guilhermina, 73, é diabética, vive adoentada, mora longe da cidade e, como todos os idosos da região,
enfrenta sacrifícios quando tem
de ir a um hospital. Agora sonha
com um serviço que possa levá-la para tratamentos sem cobrar
"o absurdo" que os motoristas
da região cobram. "Se ele quiser
me dar um carrinho velho, eu
não enjeito, não", diz, rindo.
Caetés resistia a aceitar o filho
de dona Lindu, um matuto a
mais nascido à beira de uma vereda do sítio Várzea Comprida,
como alguém capaz de se eleger
presidente. Em 89, ficou com
Fernando Collor; em 94 e 98,
com Fernando Henrique Cardoso. Neste ano, quando visitou
Caetés para gravar cenas para o
programa do PT, Lula fez uma
pergunta, carregada de incômodo, ao prefeito José Luiz de Lima
Sampaio, o Zé da Luz: "Por que
diabos eu não ganho na minha
terra?" O prefeito, cujo apelido
deve-se a um programa de eletrificação rural, prometeu, naquele momento: "Lula, vá buscar votos em outros lugares, pois
aqui eu me responsabilizo pela
sua vitória, pode deixar".
Localizada no agreste pernambucano, única região do Estado
onde José Serra (PSDB) bateu o
PT, Caetés agora deu vitória à
Lula no primeiro e no segundo
turno. No dia 6, alcançou 53%,
anteontem ficou com 57,1%. O
município tem 20.022 habitantes e 13.821 eleitores.
Na véspera da eleição, impressionados com o número de vestes vermelhas, dirigentes do PT
local brincavam que obteriam
algo próximo à votação obtida
por Saddam Hussein no Iraque:
100%. "Lula não teve mais votos
porque a oposição espalhou que
ele iria cortar a aposentadoria
rural, dinheiro que movimenta
tudo por aqui", diz o prefeito.
Na vizinha Garanhuns, município ao qual pertencia o distrito
de Caetés quando Lula nasceu,
em 1945, o orgulho de votar no
petista também prevaleceu, com
índice superior a 60%. Normalmente confundido com o sertão,
o agreste onde Lula nasceu também enfrenta secas, mas em menor grau. A mãe do presidente
eleito, Eurídice Ferreira, dona
Lindu, foi uma "viúva da seca",
como são chamadas no Nordeste as mulheres cujos homens vão
para São Paulo. Elas ficam por
bom tempo cuidando dos filhos
sozinhas. A mãe de Lula não esperou: pôs os oito meninos no
pau-de-arara e se mandou.
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