São Paulo, terça-feira, 29 de outubro de 2002

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Cientistas políticos prevêem dificuldades na relação de Lula com governadores

RAFAEL CARIELLO
DA SUCURSAL DO RIO

Cientistas políticos ouvidos pela Folha prevêem dificuldades nas negociações entre o próximo presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, e os governos estaduais. A principal delas, avaliam, será a busca de um acordo para realizar a reforma tributária.
O fato de o PT não governar nenhum grande Estado do ponto de vista econômico é visto como um agravante por Rogério Schmitt, da Escola de Sociologia e Política de São Paulo.
Para Fernando Limongi, do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), e Maria Hermínia Tavares de Almeida, da USP, as dificuldades independem do número de Estados que o PT governará.
Limongi afirma que a vitória eleitoral do PT em apenas três Estados -Acre, Piauí e Mato Grosso do Sul- "significa muito pouco" e tem pouca influência nas dificuldades que Lula enfrentará no seu governo.
"O que importa mesmo é a coalizão partidária na Câmara e no Senado", afirma.
A atuação dessa coalizão de sustentação do governo petista, a depender de pesquisa realizada pelo cientista político, não será influenciada pelos governadores. No trabalho "Poder de Agenda em Regimes Presidenciais: Governadores e Partidos Políticos no Congresso", Limongi analisa a atuação dos parlamentares em votações que envolvem interesses estaduais específicos e conclui que sua votação é orientada fundamentalmente pelos partidos, e não pelos governadores.
A negociação direta de Lula com os governos estaduais, por sua vez, não estaria sujeita a diferenças partidárias, segundo o pesquisador.
Logo, o fato de o PT ter feito poucos governadores não criaria maiores entraves à já difícil negociação sobre reforma tributária, que supõe a redistribuição de tributos, com ganhos e perdas.
"Se você abre essa caixa [da reforma tributária], não fecha mais. Ninguém quer perder e, no momento da negociação, não sabe se está ganhando ou perdendo. Por isso, [governadores e prefeitos] resistem a mudanças", diz Limongi.
Maria Hermínia Tavares de Almeida afirma que, se o PT tivesse feito governadores em Estados importantes economicamente, as dificuldades provavelmente seriam as mesmas. "Um dos críticos mais fortes [do governo Fernando Henrique Cardoso] quanto à questão tributária foi o governador Mário Covas", exemplifica.
Rogério Schmitt defende que os governadores têm, sim, influência sobre suas bancadas, e que ao PT fará falta o controle de Estados importantes como Minas Gerais e São Paulo ao tentar negociar a reforma.
"Isso torna maiores os custos de negociação com os governadores e as bancadas desses Estados."
Para ele, a reforma dificilmente poderá ser realizada no primeiro ano de governo, quando "as costuras políticas ainda estarão sendo montadas e o PT não contará com um rolo compressor" necessário para aprová-la.
Com o agravante, avalia, que as dificuldades também seriam grandes no segundo ano de mandato. Haverá eleições municipais em 2004, "e a ninguém interessará mexer com interesses", afirma Schmitt.


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