São Paulo, sexta-feira, 29 de outubro de 2004

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EM OBRAS

Niemeyer quer manter piso original do palácio

Restauração do Alvorada prevê uso de madeira protegida pelo Ibama

EDUARDO SCOLESE
JULIA DUAILIBI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A restauração de todo o piso térreo do Palácio da Alvorada está prevista para ser feita com uma madeira cuja extração é proibida pela legislação brasileira. A comercialização do jacarandá-da-bahia, árvore nativa do país, está vedada desde 1992 por uma portaria do Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis).
Entre os responsáveis pela restauração, a questão da madeira é encarada atualmente como um problema maior do que os entraves burocráticos que impedem o início das obras. Inaugurado em 1958, o Palácio da Alvorada faz parte do patrimônio da União.
O arquiteto Oscar Niemeyer, autor do projeto original do palácio e também um dos responsáveis pelo projeto de reforma, faz questão de que os materiais da obra sigam o plano original. Devido a problemas hidráulicos, todo o piso do Alvorada, de jacarandá-da-bahia, está comprometido e terá de ser substituído na obra.
Uma opção, que conta com a forte resistência de Niemeyer, seria trocar o piso por um outro tipo de madeira. O arquiteto não só quer manter o que já há de jacarandá como deseja trocar o piso de ipê da biblioteca do palácio pelo da madeira mais nobre e rara.
Técnicos que trabalham no projeto de restauração dizem que há apenas uma saída: uma apreensão da madeira feita pelo Ibama, que poderia doar o produto à restauração do Alvorada. Atualmente, segundo o Ibama, não existe estoque desse tipo de madeira. O metro cúbico do jacarandá pode ultrapassar US$ 1.200 (cerca de R$ 3.360) no mercado internacional.
De acordo com a entidade, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, não há registro de apreensões de jacarandá realizadas nos últimos anos. Apesar disso, há notícia de uma apreensão de 33 toneladas da madeira na Espanha. A carga teria sido importada ilegalmente do Brasil no começo deste mês. A mercadoria foi avaliada em mais de R$ 10 milhões. O Ibama disse que está investigando o caso, mas que a madeira não pode voltar para o país a não ser que a Espanha resolva arcar com os custos.
A legislação atual diz que a extração e a comercialização da madeira é crime que pode levar à prisão. A multa varia entre R$ 200 e R$ 500 por metro cúbico de madeira apreendida.
Além do piso do Alvorada, a capela do palácio, também projetada por Niemeyer, tem jacarandá como revestimento.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está desde o dia 4 na Granja do Torto para que a residência oficial seja restaurada.
A obra será custeada por empresários, sob a organização da Abdib (Associação Brasileira da Infra-Estrutura e das Indústrias de Base), e custará R$ 16 milhões.
Na semana passada, a Abdib disse que a obra começaria até o final do mês, prazo que irá se esgotar neste domingo. Além da questão da madeira a ser usada, entraves burocráticos, como o tipo de acordo que será firmado entre a União e as patrocinadoras, ainda estão pendentes.
A árvore (Dalbergia nigra), que mede de 15 a 25 metros, existe principalmente nos Estados da Bahia e do Espírito Santo. Como já foi muito explorada, é tida atualmente como espécie ameaçada de extinção. O valor alto comercial da madeira vem da sua qualidade e durabilidade.
A Folha entrou em contato com o escritório de Oscar Niemeyer, mas sua secretária afirmou que ele estava viajando e que só voltaria no dia 8. Procuradas pela reportagem nas últimas duas semanas, a Abdib e a Secom (Secretária de Comunicação de Governo) disseram não poder dar informações até que sejam feitos os acertos finais da obra e que seja realizada uma entrevista para divulgar os dados à imprensa.


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