São Paulo, domingo, 30 de janeiro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

DAVOS - DEBATE GLOBAL - PORTO ALEGRE

Segundo Anne Krueger, atuação do BC está correta, apesar de alto endividamento público ainda expor o Brasil a crises externas

FMI elogia juros altos, mas vê país vulnerável

LEONARDO SOUZA
ENVIADO ESPECIAL A DAVOS

A vice-diretora-gerente do FMI (Fundo Monetário Internacional), Anne Krueger, disse ontem que o Banco Central está correto em aumentar os juros e afirmou que o pior que poderia acontecer ao Brasil hoje seria a inflação disparar. Reconheceu, contudo, que há o risco de a política monetária prejudicar o crescimento.
Segundo ela, os juros só deverão ser baixados quando a demanda estiver mais fraca, o que pode ser interpretado como quando o crescimento for menor. Apesar dos elogios, a número dois do FMI disse que "é claro" que o Brasil ainda é vulnerável a choques externos. Admitiu também que o governo e o Fundo estão em negociação para a renovação do acordo do país com a instituição.
O discurso de Krueger é muito semelhante ao da equipe econômica. "O Banco Central obteve no ano passado o melhor crescimento nos últimos dez anos, então não deve estar errado agora. O país tem uma história inflacionária. A pior coisa que poderia acontecer para o Brasil seria a inflação disparar agora. O Banco Central está corretamente preocupado em manter o crescimento e, ao mesmo tempo, manter a inflação baixa. Esse é o caminho no qual eles têm que andar. E nossa avaliação é que estão fazendo um bom trabalho", disse ela a um pequeno grupo de jornalistas.
Ao ser questionada pela Folha se o aumento dos juros não poderia barrar o crescimento econômico, deu a seguinte resposta: "Eles [o BC] têm um julgamento a fazer, porque podem também prematuramente baixar os juros e colher inflação. É preciso encontrar o equilíbrio entre esses dois fatores para ver o que é mais importante. E, neste momento, por tudo que me é dito, o crescimento econômico do Brasil me parece muito forte. A demanda está crescendo, e a preocupação real neste momento deve ser que isso não espirre na inflação".
Krueger completou: "Em algum momento, se a demanda parecer mais fraca, se as pressões inflacionárias cederem, os juros poderão baixar. Mas, neste momento, parece que o BC está correto."
Se, por um lado, a vice-diretora-gerente do Fundo aborda a questão da inflação de forma muito semelhante à do governo brasileiro, por outro, difere no tom quando indagada sobre se o Brasil ainda está vulnerável a turbulências na economia internacional.
"É claro que o Brasil ainda é vulnerável. Qualquer país com uma grande dívida como a brasileira, se acontecer algo que gere choque negativo nos mercados mundiais, como queda dos preços das commodities [produtos básicos], os chineses parando suas encomendas... Sim, ainda é vulnerável. Não há país que não seja. A questão é o grau da vulnerabilidade. O Brasil ainda tem um volume grande de dívida para rolar. Eu diria que o Brasil está na zona média de risco. [...]Seria muito bom se o país tivesse uma dívida muito menor."
Ela ressaltou que se o superávit primário (economia de receitas para o pagamento de juros da dívida) fosse um pouco maior, a relação entre a dívida pública e o PIB (Produto Interno Bruto) cairia mais rapidamente. Esse é um dos principais indicadores de vulnerabilidade externa. O governo tem comemorado o fato de essa relação ter caído de aproximadamente 60% em 2002 para cerca de 52% no final do ano passado. A meta de superávit hoje é de 4,25% do PIB, mas no ano passado o governo economizou 4,61%.
"Segundo nossa avaliação, [...] com um superávit primário de 4,5% do PIB, a relação dívida/PIB poderá gradualmente cair a um nível razoável. Obviamente, um superávit primário mais elevado poderá reduzir o peso da dívida mais rapidamente. Essa é uma decisão das autoridades", disse.
Sobre a renovação do acordo com o Fundo, disse: "As autoridades [brasileiras] têm que me dizer o que querem. Está havendo discussões, mas ainda não nos disseram o que querem fazer. Como você sabe, o último programa era precaucionário, [o governo] não sacou nenhum recurso. Acho que, se houver outro programa, seria precaucionário, mas eles que decidirão se isso ajudará o país".


Texto Anterior: Críticas de Davos colocam a América Latina no "divã"
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.