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DAVOS - DEBATE GLOBAL - PORTO ALEGRE
Um terço dos trabalhadores do assentamento no RS que será visitado hoje pelo presidente Hugo Chávez diz não ter "condição ideal de vida"
Sem-terra de área modelo trabalham fora
ANA FLOR
ENVIADA ESPECIAL A PORTO ALEGRE
O presidente venezuelano Hugo
Chávez conhece hoje o assentamento Lagoa do Junco, em Tapes
(a 130 km de Porto Alegre), considerado modelo no uso sustentável da terra e na aplicação da
agroecologia. Chávez, porém, terá
de se esforçar para ver que, para
um terço das famílias do local, a
terra não garante o sustento, o
que está longe de ser um modelo.
Das 35 famílias que moram nos
807 hectares de terras, 13 dizem
viver em lotes "sem condições de
vida". Para complementar a renda, trabalham fora parte do dia,
fazendo bico em construções,
plantações ou granjas.
O projeto do Lagoa do Junco
nasceu em 1995 e, na seqüência,
criou-se a Cooperativa de Produção Agropecuária dos Assentados
de Tapes. O desafio era produzir
arroz irrigado e vegetais de maneira orgânica. O êxito na produção sustentável não evitou, no entanto, que parte das 35 famílias
que compunham originalmente a
cooperativa deixassem o grupo.
A partir daí, segundo o assentado Nilton Mezzomo, 32, os "dissidentes" passaram a ter difícil
acesso à água do açude que garante a irrigação do arroz. "A gente
ganhou lotes ruins, com terra arenosa e sem condições de plantar."
Para sustentar mulher e três filhos, Mezzomo faz bicos como
pedreiro. "Acho importante ver
que existem contradições no que
dizem assentamento-modelo",
diz ele, que reclama da falta de
apoio da cooperativa.
Mezzomo vive há nove anos no
local, depois de quatro anos e
meio em um acampamento do
MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).
A Cooperativa Central dos Assentamentos no Rio Grande do
Sul, diz que não considera "nenhum assentamento modelo",
porque "eles têm problemas como qualquer bairro ou cidade".
Mesmo assim, defende que a produção agroecológica de Tapes é
uma experiência interessante, e
por isso a Via Campesina organizou a visita de Chávez.
Além disso, a cooperativa diz
que o MST organiza as famílias
"politicamente" e que as questões
de infra-estrutura "cabem ao Incra" (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).
Segundo o Incra, os estudos para a remarcação do assentamento
estão em andamento. A assessoria
do órgão diz que a situação ocorre
em razão de o local ter sido projetado para "exploração conjunta",
e a dissidência teria causado problemas no uso da água do açude.
Programação
Chávez chega hoje a Porto Alegre e deve seguir para o assentamento de helicóptero. Existe a
possibilidade de o venezuelano
apresentar, de Tapes, seu programa de TV e rádio. À tarde, dá coletiva e participa de evento no ginásio de esportes Gigantinho -o
mesmo em que Lula discursou.
No assentamento, Chávez deve
assinar protocolo de intenções
para a criação da Escola Latino-Americana de Agroecologia, uma
parceria entre o governo da Venezuela, universidades do país, o Paraná e a Via Campesina.
A partir do protocolo, devem
começar discussões para definir
como será o intercâmbio e a cooperação para ensinar técnicas de
agroecologia usadas no Brasil.
O projeto pode contribuir para
Chávez tirar do papel uma lei de
reforma agrária de 2001. Em 2004,
ele assinou decreto para "eliminar
de forma progressiva o latifúndio
nas zonas rurais" e "incorporar
grupos da população e comunidades, garantindo o aproveitamento racional" das terras.
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