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SISTEMA FINANCEIRO
Dinheiro representa 54% dos R$ 7,5 bilhões que saíram do país por meio das chamadas contas CC-5
"Laranjas" mandaram R$ 4 bi ao exterior
JOSÉ MASCHIO
da Agência Folha, em São Paulo
DAVID FRIEDLANDER
VANESSA ADACHI
da Reportagem Local
Uma devassa
nas chamadas
contas CC-5, um
sistema de remessa de dinheiro para o
exterior, descobriu que pelo
menos 54% dos R$ 7,5 bilhões enviados por pessoas físicas para fora
do país entre 1992 e 1998 são clandestinos.
Esses recursos deixaram o paísem nome de 226 "laranjas", na
sua maioria pessoas humildes, que
foram usadas pelos verdadeiros
donos do dinheiro para encobrir
sua identidade. É o maior levantamento já feito sobre o tráfico de dinheiro ilegal no país e está sendo
investigado pelo Ministério Público Federal no Paraná.
Na investigação, camelôs, faxineiras e secretárias aparecem enviando um total de R$ 4,055 bilhões para o exterior. O MP suspeita que, por trás desses "laranjas",
escondam-se sonegadores de impostos e pessoas ligadas a atividades ilegais, como contrabando e
tráfico de drogas.
"Nós achamos que a participação dos laranjas nas remessas pode
ser maior, próxima a 80%", diz o
procurador da República Celso
Três, de Cascavel, no interior do
Paraná. Nesta quarta-feira, Três
vai apresentar o resultado de suas
investigações na CPI dos Bancos.
A investigação corre há mais de
um ano e, no começo, estava centrada na lavagem de dinheiro na
fronteira do Brasil com o Paraguai.
Acabou trazendo à tona algo muito maior e mostrou que a máquina
de exportação de dinheiro ilegal
opera em todo o país.
O procurador paranaense estava
interessado apenas em entrar no
"laranjal", mas acabou pondo a
mão na relação completa de todas
as operações via CC-5 feitas por
pessoas e empresas nos últimos sete anos.
Foi por acaso. Celso Três queria
que o Banco Central o informasse
sobre as operações que envolviam
pessoas e empresas do interior do
Paraná, sua área de atuação.
O BC negou o pedido, alegando
incapacidade técnica para separar
a ficha dos paranaenses do estoque
geral das CC-5. "Eu então pedi que
mandassem todas as operações e
eles me atenderam", diz.
Ou seja, o desconhecido procurador Celso Três, do interior do
Paraná, recebeu informações que
o secretário da Receita Federal,
Everardo Maciel, reclamou recentemente ter dificuldades para conseguir.
A papelada do BC mostra que, ao
todo, R$ 111,6 bilhões foram enviados para fora do país entre 1992 a
1998. A grande maioria, R$ 104,1
bilhões, foi remetida por empresas
e instituições financeiras. O restante pertence a pessoas físicas.
Estão listados no documento
1.700 pessoas e mais de 5.000 empresas, bancos e corretoras. Sobre
a grande maioria das operações,
não há nenhuma suspeita. Portanto, não haveria motivo para terem
saído da caixa-forte do BC.
No campo das pessoas físicas, o
relatório do BC confirma com nome, CPF e valores algo de que já se
desconfiava: é comum brasileiro
que tem dinheiro manter contas
no exterior. Por várias razões.
Uma delas é a sensação de insegurança desenvolvida ao longo de
uma sequência de pacotes econômicos fracassados, desvalorizações cambiais e um confisco.
Há, também, uma boa dose de
oportunismo. Muitas pessoas
mandam dinheiro para fora, apenas para repatriá-lo mais tarde,
fantasiado de investimento estrangeiro. A grande vantagem é que em
alguns casos o investidor estrangeiro é favorecido com impostos
mais baixos ou até isenção para
aplicar no Brasil. Banqueiros dizem que esse artifício para escapar
do fisco é trivial.
A Folha teve acesso à lista completa do BC. Um banqueiro de São
Paulo, por exemplo, despachou,
sozinho, R$ 224 milhões para fora
do país, a partir de 96. É o campeão
da lista de pessoas físicas do BC.
Empresários que venderam recentemente suas empresas também aparecem ativamente no
Boeing da CC-5. Alguns industriais e banqueiros fizeram remessas em nome de vários membros
da família, aparentemente repartindo seu lucro no exterior. Há um
apresentador de TV, muito popular, que enviou recentemente R$ 12
milhões para fora.
Também chama a atenção o
comportamento de figuras conhecidas no mercado financeiro.
Quase todos os principais executivos de um grande banco brasileiro enviaram parte de suas economias, cerca de R$ 2 milhões cada
um, para contas no exterior. A
mesma coisa aconteceu com os R$
24 milhões de uma família de ex-banqueiros. O banco deles quebrou.
As contas CC-5 existem desde
1969 e foram criadas pelo Banco
Central para permitir que estrangeiros que residissem temporariamente no Brasil pudessem movimentar seu dinheiro. Seu uso depois foi ampliado e o mais comum,
hoje, é que brasileiros usem esse
canal para movimentar legalmente
suas contas no exterior.
Ganharam má fama durante a
CPI que investigou os negócios de
Paulo César Farias, tesoureiro de
campanha e amigo do ex-presidente Fernando Collor de Mello.
As investigações em curso podem
ser uma boa oportunidade para
aperfeiçoar o mecanismo.
O Banco Central rejeita críticas
sobre falta de fiscalização nas operações. Diz que foi sua toda a investigação que levou aos "laranjas" que operam em Foz do Iguaçu.
Segundo o BC, a fiscalização do
órgão informou o Ministério Público dos problemas na fronteira
com o Paraguai em abril de 1997. A
partir de junho de 1997, foram comunicados 322 casos de possível
remessa irregular de dólares.
Em Foz do Iguaçu, para viabilizar o comércio na fronteira, são
autorizados depósitos em espécie
acima de R$ 10 mil em contas CC-5. Os "laranjas" se valiam de deficiências na fiscalização da Receita
Federal e faziam depósitos acima
do valor declarado.
Colaborou a Sucursal de Brasília
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