São Paulo, quinta-feira, 30 de junho de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ CAIXA DE CAMPANHA

Líder petebista e José Genoino prestaram depoimentos divergentes sobre suposto auxílio financeiro ao PTB nas eleições de 2004

Jefferson pediu R$ 4 mi ao PT, diz Múcio

FÁBIO ZANINI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente do PT, José Genoino, e o líder do PTB, deputado José Múcio (PE), prestaram depoimentos divergentes ontem, na Câmara, sobre o suposto auxílio financeiro do PT ao PTB nas eleições do ano passado.
Múcio confirmou a existência de um acordo, citado pelo presidente do PTB, deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), para o repasse de R$ 20 milhões a candidatos petebistas nas eleições municipais. O acerto, segundo Múcio, foi feito entre Jefferson, Genoino e o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, mas apenas parte do dinheiro foi entregue pelos petistas.
Ainda de acordo com o líder petebista, que prestou depoimento no Conselho de Ética da Câmara, Jefferson pediu à cúpula do PT o pagamento de mais R$ 4 milhões, além dos R$ 4 milhões que diz ter recebido, em reunião em seu apartamento em março desse ano. O pedido teria sido negado.
Genoino, que foi ouvido na comissão de sindicância na Corregedoria da Câmara, refutou a versão de acordo entre PT e PTB e negou a existência do "mensalão" -suposto pagamento de mesadas a parlamentares aliados do governo. "O PT não sabia, não conversou e nunca discutiu esta história de mensalão", disse ele, após depor a portas fechadas na comissão.
"O PT fez um acordo político-eleitoral nas cidades onde tínhamos aliança com o PTB. [Sobre] As despesas de show, televisão, material de campanha, adesivos, camisetas, tivemos responsabilidade. Mas jamais apoio de R$ 20 milhões, nem passar R$ 4 milhões para o PTB", afirmou Genoino.

Contradições
Múcio, correligionário de Jefferson, o contradisse várias vezes durante o depoimento e levantou dúvidas sobre a destinação dos R$ 4 milhões que o presidente do PTB disse ter recebido. "Tenho quase certeza de que esse dinheiro não chegou aos candidatos a prefeito", afirmou.
Múcio disse ainda que a reunião de março, da qual participou, teve a presença de Jefferson, Genoino, Delúbio e Emerson Palmieri, "tesoureiro informal" do PTB.
"O Roberto [Jefferson] afirmou que tinha ficado em uma situação extremamente desconfortável no partido por causa do acordo não cumprido de R$ 20 milhões. Disse que, com mais R$ 4 milhões, resolveria os problemas", declarou Múcio.
Foi nessa ocasião, afirmou o petebista, que ele teve pela primeira vez a notícia de que uma primeira parcela do suposto acerto teria sido repassada pelo PT. "O Roberto afirmou que queria, inclusive, que a nova parcela fosse registrada de forma legal. Intuo que ele não usou a primeira parcela por falta disso."
Múcio afirmou que nunca a bancada federal foi informada do suposto repasse de R$ 4 milhões. Disse ainda que ouviu falar em "mensalão" apenas quando Jefferson citou a ele rumores, no final de 2003, e que não discutiu o assunto com Delúbio, diferentemente da versão apresentada pelo presidente petebista.
O líder do PTB confirmou ter sido procurado por Delúbio, que queria marcar uma reunião com Jefferson. O encontro ocorreu no apartamento de Jefferson uma semana depois, e o líder disse ter ficado apenas por alguns minutos, o suficiente para ouvir o tesoureiro petista dizer que queria que o petebista ajudasse a "desencravar umas unhas".
Múcio negou que tenha sido pressionado pelos deputados Pedro Henry (PP-MT), Valdemar da Costa Neto (PL-SP) e Carlos Rodrigues (PL-RJ) para aceitar o "mensalão", novamente contradizendo Jefferson.
Em uma terceira contradição, Múcio disse que nunca ocorreu uma reunião da bancada do partido para decidir pela aceitação ou não do "mensalão". Houve apenas uma conversa informal com deputados, em que o presidente do PTB teria citado a mesada, mas sem levar o tema a voto.
Itapuã Messias, advogado do petebista, negou que haja contradições. "O que há são estilos diferentes de dizer a mesma coisa".

Ausências
Dos quatros dirigentes petistas convidados a depor ontem na Corregedoria, Genoino foi o único que compareceu. Delúbio Soares, Silvio Pereira (secretário-geral) e Marcelo Sereno (secretário de Comunicação) não justificaram as ausências e não marcaram novas datas para depor.
Após o depoimento, Genoino confirmou que se encontrou com o publicitário Marcos Valério na sede do PT, mas negou que tenham conversado sobre o "mensalão". "Eu estive apenas algumas vezes com ele, na sede do PT, para cumprimentar, numa relação social, na medida em que ele tinha relação mais próxima com o companheiro Delúbio Soares."

Outros depoimentos
No total, nove pessoas prestaram depoimento à Corregedoria ontem, entre elas o genro do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), Marcus Vinícius Vasconcelos, que negou atuar irregularmente nas estatais em favor do PTB. Ele confirmou, porém, que era o "ouvido" de Jefferson nas estatais nas ocasiões em que o sogro lhe pedia.
A deputada Raquel Teixeira (PSDB-GO), que afirma ter recebido proposta de vantagens financeiras para trocar de partido e apoiar o governo, disse, em depoimento, ter recebido telefonemas de um assessor do ministro da Articulação Política, Aldo Rebelo, nos dias seguintes à primeira entrevista de Jefferson à Folha, em 6 de junho. Na entrevista, Jefferson citou pelo primeira vez o suposto "mensalão".
Um telefonema partiu de Alon Feuerwerker, assessor de Aldo, que disse que o objetivo era tratar da liberação de uma emenda de R$ 1 milhão dela.
Também foi ouvido o deputado Carlos Rodrigues (PL-RJ), acusado por Jefferson de "ensinar" ao PT a prática do "mensalão". Ele chorou em seu depoimento e disse que nunca recebeu "dinheiro ilícito".
(CHICO DE GOIS, SILVIO NAVARRO E RANIER BRAGON)

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