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ELIO GASPARI
Miro Teixeira mostra o caminho de Mr. Sam
Um Congresso de mensaleiros e sanguessugas acordará demônios autoritários e pode acabar fechado pelo Executivo
DOIS EM CADA dez parlamentares
brasileiros estão metidos em
casos de malversação de dinheiro alheio. Esse índice não tem paralelo
em qualquer localidade, salvo nos estabelecimentos penais. É improvável que
20% dos transeuntes dos bairros mais
perigosos das cidades brasileiras carreguem tanta suspeita.
"Nosso guia" tem toda razão quando
diz que as denúncias aumentaram porque melhorou a investigação. Nos últimos dez anos, a Câmara dos Estados
Unidos teve um presidente, dois líderes republicanos e um democrata defenestrados por atos de improbidade. Isso não fez com que o Legislativo americano se transformasse num ninho de
sanguessugas. O brasileiro corre esse
risco. Se a eleição de outubro devolver a
Brasília personagens como os que levaram à dança do mensalão, corre-se o
risco de um colapso da representação
parlamentar.
Sam Rayburn (1882-1961), um dos
maiores parlamentares da história
americana, ensinou que "um burro pode arrebentar um celeiro, mas você
precisa de carpinteiros para construir
outro". "Mr. Sam", como era conhecido, ficou 48 anos na Câmara, 17 na sua
presidência. Foi levado ao túmulo por
quatro presidentes dos Estados Unidos. Não falava com lobistas e morava
num dois quartos e sala. Quando morreu, tinha 15 mil dólares no banco.
Os burros do mensalão e das ambulâncias estão destruindo o Congresso
brasileiro. Caberá aos carpinteiros reconstruí-lo. Voto nulo, campanhas pela
eleição de candidatos que nunca tiveram mandato ou mesmo a idéia de que
os eleitores são juízes (ou culpados) de
última instância são manifestações
piedosas e inócuas. Por mais cadeados
que se ponham nas portas, se o ladrão
estiver por perto, a casa corre perigo.
O Congresso Nacional já foi fechado
sete vezes (1823, 1889, 1930, 1937, 1966,
1968 e 1977). Às vezes, foi-se embora
numa ventania que mudou o regime
(1889, 1930 e 1937), mas houve casos
em que o pretexto foi uma votação na
qual o governo saiu derrotado (1968 e
1977). O Congresso não produz crises
institucionais, mas é sempre seu estuário. Chega uma hora em que o seu recesso parece solução de um problema,
quando é apenas um truque do Executivo para impor sua vontade.
Em 1968, o problema não esteve na
negativa da licença para se processar o
deputado Márcio Moreira Alves. A crise estava na anarquia militar. Em 1977,
o congelamento de uma reforma do Judiciário foi, documentadamente, puro
pretexto. O que o governo queria era
garantir eleições indiretas nos Estados
e fabricar uma maioria no Senado.
Um Congresso com 20% de mensaleiros e sanguessugas poderá ser presa
fácil de um governo sem votos para
aprovar o que lhe interessa. Chega-se à
possibilidade de um cenário no qual o
governo diz que suas reformas não são
aprovadas por causa dos larápios. Mentira. Se depender de mensaleiros e sanguessugas, passa até camelo em buraco
de agulha.
O próximo presidente receberá um
mandato de algo como 55 milhões de
eleitores. Basta que flerte com um surto autoritário e proponha um plebiscito para decidir a dissolução do Congresso, convocando eleições em 180
dias. O resultado provável: a proposta
vence o plebiscito, e o governo dobra
sua bancada.
Esse é o estrago que os burros de Mr.
Sam podem fazer no celeiro. Os carpinteiros têm uma oportunidade para devolvê-los ao estábulo. A partir desta semana, o Tribunal Superior Eleitoral
poderá responder a uma consulta do
deputado Miro Teixeira (PDT-RJ). Ele
sustenta que a Constituição obriga os
tribunais eleitorais a impugnar os
mandatos de cidadãos contra quem o
Ministério Público ou a polícia tenham
recolhido provas de corrupção. As
ações de impugnação devem acontecer
depois da diplomação dos eleitos, em
dezembro. Os acusados têm amplo direito de defesa e, seja qual for a decisão
do TRE, cabe recurso ao Tribunal Superior Eleitoral, que deverá decidir cada caso antes da posse dos eleitos, em 1º
de fevereiro.
Se o TSE colocar o Judiciário na parada, pode-se esperar que o número de
burros que passarão pelos tribunais venha a ser insuficiente para destruir o
celeiro.
SOSeleitor
Está no forno um novo sítio
na internet. Poderá se chamar
SOSeleitor. O cidadão digita o
nome do candidato e recebe a
biografia (ou o prontuário) do
interessado em seu voto.
Arco-íris
O ministro do Planejamento,
Paulo Bernardo, deveria colocar na sua agenda pública os
compromissos partidários que
cumpre fora de Brasília. Ajudaria o PSDB a ir no seu rastro.
UniLula
O comando da campanha de
Lula poderia usar o samba "Peçam bis", de Ismael Silva, como
hino da campanha. Diz assim:
"Foi tanto bis/Que eu já não
podia atender/No entretanto,/O que a platéia queria/É
que eu cantasse/Cantasse até
aprender". Lula está aprendendo. Teve a sabedoria de não dizer uma palavra após o fracasso
das negociações comerciais da
Rodada Doha. Tendo um chanceler que o chama de "nosso
guia" e uma noção esportiva da
atividade diplomática, Lula
confunde a defesa dos interesses brasileiros com a marquetagem de sua figura. Em outubro
de 2004, quando sua diplomacia ajudou a emperrar uma reunião preliminar da OMC, o
companheiro festejou o resultado como se estivesse saindo
de um jogo de cartas: "Demos
uma trucada nos países ricos"
(equivale à batida do jogo de
buraco). Se George Bush ou
Jacques Chirac dissessem agora que deram uma trucada nos
países pobres seriam considerados arrogantes e primitivos.
Ausência dupla
Caso "nosso guia" decida não
ir ao debate do primeiro turno,
é provável que Alckmin também não vá. Fará muito bem.
Cuba Tour
Há um alegre movimento no
governo e no Congresso para
que se componha uma bonita
delegação brasileira nos festejos dos 80 anos de Fidel Castro.
Duas propostas: 1) Os companheiros pagam suas viagens;
2) Cada companheiro que viaje
à custa da Viúva, com passagens e diárias, compromete-se
a reservar um dinheiro para
custear a viagem de um cubano
que pretenda deixar a ilha.
Sucessão
Durante a campanha eleitoral de 1984, quando Tancredo
Neves deu a vice-presidência
ao senador José Sarney, era falta de educação lembrar que,
uma vez eleito, ele assumiria
com 74 anos. Nenhum presidente brasileiro teve essa idade
nem mesmo ao sair do governo.
Deu no que deu.
É falta de educação mencionar que o vice-presidente José
Alencar, 74, retirou um tumor
maligno de seu organismo. O
terceiro, desde 1997. Alencar é
o vice na chapa de Lula.
A linha dinástica determina
que, no seu impedimento, o
presidente da República será
substituído provisoriamente
pelo presidente da Câmara. Como se sabe, esse hierarca é eleito a cada dois anos pelos deputados. Nos últimos quatro anos,
elegeram-se: João Paulo Cunha, mensaleiro absolvido pelos seus pares. Severino Cavalcanti, petequeiro de concessionário de restaurante, renunciou para evitar o risco de ser
cassado. Aldo Rebelo.
Se der xabu, não vale dizer
que foi esquecimento.
Troco
As relações do senador Aloizio Mercadante com a ex-prefeita Marta Suplicy não são
boas nem vão melhorar.
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