São Paulo, quinta-feira, 30 de setembro de 2004

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JANIO DE FREITAS

Eleição e cifrão

A crua conexão que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral fez, publicamente, entre financiamento privado das campanhas eleitorais e corrupção não se encerra no que ficou dito: estende-se sobre todo o país, como um manto de imoralidade que irradia corrupção, das instâncias superiores do poder público para todos os níveis e recantos da vida brasileira.
Palavras de Sepúlveda Pertence: "O financiamento privado é um investimento que se remunera à custa de corrupção. (...)É notório que há financiamento privado legítimo, motivado por filiação partidária simplesmente, mas o financiamento de grandes empresas (...) é falsamente gratuito".
Pode haver, aí, o que ressalvar quanto ao financiamento partidário, que é insignificante no conjunto do financiamento eleitoral, tanto no total como no caso de cada partido. Mas não há o que contestar, nem ao menos pôr em dúvida. Há, porém, o que acrescentar, necessariamente.
Ao corruptor corresponde o corrompido. Como todas as campanhas eleitorais são movidas a financiamento privado, é lógico que "a remuneração à custa de corrupção" é feita pela poder público em geral, na instância municipal das prefeituras e câmaras de vereadores; na dos governos estaduais e assembléias legislativas; e na do governo federal e Congresso, ou Câmara e Senado. O que sobra? O Legislativo. Em termos. Porque suas cúpulas são nomeadas pelo poder executivo, nos Estados e no plano federal, um dos poderes que provêm de financiamento que não passa de "um investimento que se remunera à custa de corrupção".
A generalização, que parte do próprio presidente do TSE, no caso não é temerária. Trata-se da regra geral, que, para não fugir à própria regra, reconhece a existência de eleitos que não vêem os seus financiadores como investidores e não cogitam proporcionar-lhes retribuições materiais. Mesmo entre esses, no entanto, é muito difícil encontrar quem se tenha posto em confrontação, no exercício de suas funções eleitas, com interesses de seus financiadores.
Ao sistema eleitoral à brasileira e à vida política, por ele conformada, só falta adotar de uma vez sua emenda ao princípio constitucional: todo poder emana da corrupção e em seu interesse será exercido.

Reprodução
O jornalista José Paulo de Andrade, profissional destacado da Rádio Bandeirantes, fez observações importantes em texto dirigido à Folha, sobre a entrevista de Lula a representantes de rádios selecionadas pela Secretaria de Comunicação da Presidência.
A primeira: "o presidente se alongou em temas que lhe interessaram e impediu, com essa tática, que se fizessem duas rodadas completas de perguntas, como estava acertado".
Outra: "dos 13 jornalistas só quatro foram sorteados pelo próprio presidente para uma segunda pergunta; sem réplica, nem mesmo aparte".
Lula está na Presidência há 21 meses. Até hoje não concedeu uma entrevista de fato, sem marotagens da sua Secretaria de Comunicação, ao jornalismo brasileiro. Igualou-se aos generais-ditadores Médici e Geisel.


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