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JANIO DE FREITAS
Os colonizados
Com sua entrega atrasada em quase ano e meio e
sem prazo certo para iniciar o
funcionamento projetado, embora já pago em mais de 90%,
o Sistema de Vigilância da
Amazônia, ou Sivam, conecta
agora o governo Lula à série de
quatro escândalos que motivou no governo Fernando
Henrique.
No início de junho, o ministro de Segurança Institucional,
general Jorge Armando Felix,
incluiu uma revelação muito
importante em depoimento à
Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara. Projetado para a defesa
da Amazônia e, como complemento, apoio à aviação civil, o
Sivam é vulnerável: suas informações ficam ao alcance da
fornecedora do equipamento,
a norte-americana Raytheon,
que pode usá-las, com fins comerciais ou políticos ou outros,
a seu critério.
Por algum motivo inexplicado, o depoimento do general
Felix, e não só a parte referente
ao Sivam, não recebeu da mídia o espaço e o tempo merecidos. O comentário que aqui lhe
foi dedicado em 6 de junho, "A
soberania no balcão", suscitou
duas reações oficiais: no dia 13,
também aqui era noticiado
que o deputado José Aristodemo Pinotti preparara um requerimento de CPI, para o
qual já coletava as necessárias
assinaturas; e, do Sivam mesmo, uma correspondência.
Assinada pelo coronel Paulo
Esteves, a mensagem consistia
em convite para esclarecer, a
respeito do acesso às informações revelado pelo general Felix, que "infelizmente essa desconfiança, de certa forma, faz
parte da nossa cultura de colonizados". A gratuidade do insulto ao depoente e da grosseria com o comentarista dispensava qualquer consideração.
Tanto mais que, a haver "cultura de colonizados", o Sivam é
sua expressão máxima. Não
bastando as ilegalidades da
exótica concorrência para entregá-lo forçosamente à Raytheon, como queriam o Pentágono e o Departamento de Estado dos EUA, foi ainda motivo de um episódio de subserviência sem par: ao conseguir
afinal, a despeito da série de escândalos, dar a Raytheon como "vencedora", Fernando
Henrique telefonou ao então
presidente Clinton para comunicar-lhe o êxito.
Pois é o coronel Paulo Esteves
que vem agora a informar, por
intermédio do "Globo", que o
enorme atraso de funcionamento do Sivam deve-se a que
Raytheon até hoje não entregou o equipamento de rádio
VHF para comunicação com
os aviões. E, por isso, o pagamento ainda devido à empresa
está suspenso até a entrega.
A Raytheon já recebeu 90%
do custo de seus serviços e equipamentos. Mas o Sivam, um
projeto de R$ 4,2 bilhões, não
pode cumprir a tarefa para a
qual foi projetado. Nem há certeza de quando poderá fazê-lo,
porque a Raytheon não tem
ainda o equipamento a ser fornecido. Mas nenhuma providência está tomada pela parte
brasileira -Sivam e governo- em relação ao problema.
Seja quanto à substituição do
fornecedor que não fornece, ao
ressarcimento de quotas pagas,
a multas pelo atraso e ainda
outros motivos.
Por que a tolerância sem fim,
como o próprio Sivam? A explicação é difícil, a menos que esteja na "cultura de colonizados" tão bem simbolizada nesse projeto muito desastrado e
pouco brasileiro.
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