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Texto de conferência leva dúvidas de bispos ao papa
Documento de Aparecida admite que situação da igreja na América Latina é "difícil"
De acordo com d. Cláudio Hummes, "não é possível mais que os católicos sejam
apenas de tradição, porque receberam a fé dos pais"
LEANDRO BEGUOCI
ENVIADO ESPECIAL A APARECIDA (SP)
Bento 16 fez um discurso aos
bispos do Brasil e da América
Latina cheio de certezas quanto à falência do capitalismo e do
marxismo e defendeu com ênfase um não ao aborto. Os bispos não revogaram nenhuma
das assertivas, mas vão devolver ao papa um documento repleto de dúvidas.
Essa é a conclusão que se
chega após a leitura dos resultados prévios da 5ª Conferência Geral do Episcopado da
América Latina e do Caribe,
que se encerra hoje em Aparecida (SP) e que, pela primeira
vez, não acabou em divisão e
brigas entre conservadores e
progressistas. As confusões foram comuns ao menos nas três
últimas edições do evento (Medellín, na Colômbia, em 1968;
Puebla, no México, em 1979; e
Santo Domingo, na República
Dominicana, em 1992).
Ontem, foi apresentado um
resumo do texto final produzido pelos bispos. Esse documento ainda será submetido ao papa, que pode dar seu aval ou sugerir mudanças. A versão definitiva só será publicada no segundo semestre deste ano. O
objetivo da proposta é reorientar a ação de religiosos e fiéis.
Logo no item dois (o resumo
tem oito itens), os bispos dizem
reconhecer "com humildade as
luzes e as sombras que há na vida cristã e na ação eclesial".
Mais adiante, ao analisar as
mudanças pelas quais o continente está passando (globalização, mudanças econômicas), a
prévia "nesse contexto, considera difícil a situação de nossa
igreja nesta hora de desafios".
Dúvidas
Bispos e cardeais evitaram ir
além do que o texto já dizia.
D. Geraldo Majella, arcebispo de Salvador (BA), negou que
a igreja esteja no divã ou em crise de identidade, "porque ela
tem a verdade de Jesus Cristo".
Porém, disse que há, sim, dúvidas profundas quanto "ao método, quais são os métodos novos para anunciar a palavra de
Deus". Também não especificou quais seriam esses erros.
Deixou claro apenas que "não
podemos deixar de esclarecer,
não podemos nos cansar de falar dos valores da igreja". Alguns valores, segundo o cardeal, são a defesa da vida (contra o aborto, por exemplo).
D. Cláudio Hummes tentou
dar ares mais concretos. Segundo ele, o maior problema e o
que gera as maiores inquietações é como incentivar os católicos a ser... católicos.
"Essa conferência vai incentivar uma grande missão continental, que vai se dirigir primeiro aos próprios católicos",
disse o "ministro" do papa na
Congregação para o Clero, responsável pelos padres de todo o
mundo. "Não é possível mais
que os católicos sejam apenas
de tradição, porque receberam
a fé dos pais." Ele disse ainda
que a igreja continua compromissada com os pobres.
D. Demétrio Valentini, bispo
de Jales (SP), um dos 22 bispos
brasileiros nessa conferência,
afirma que o tom de espanto
quanto à realidade e ao que fazer se deve a uma constatação
dos bispos. "Os temas e as mudanças devem se impor não pela força de quem propõe, mas
pela força do próprio tema."
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