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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ BASTIDORES
Parlamentares avaliam que quadro de punição ao final da CPI só deve ficar claro em duas semanas, após novos depoimentos
Incerteza sobre provas impede "acordão"
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A discussão para determinar
quem será punido ao fim da CPI
dos Correios já começou, mas o
tamanho de um eventual "acordão" é incerto porque ainda não
há um quadro claro para governo
e oposição sobre o estrago trazido
pelas provas que já apareceram e
as que poderão aparecer.
A expectativa em Brasília é que
em cerca de duas semanas seja
possível definir o quadro mais
preciso das apurações, e a partir
daí os dois lados poderão definir
quais políticos serão punidos
-em especial, parlamentares.
Por enquanto, há muitas conversas bilaterais entre os políticos
que conseguiram manter algum
poder de decisão em meio ao
atual escândalo do "mensalão".
Nos bastidores, muitos buscam
protagonizar o grande conchavo.
Ser o patrono do acerto de contas
dará ao responsável cacife para
entrar com força na eleição de
2006 -tanto na eventualidade de
Lula desistir da reeleição quanto
na hipótese de continuação da
gestão petista. Nunca se fala em
"acordão" nem conchavo. Os termos usados são "garantia da governabilidade", "condução da crise" e "coordenação política".
Na sexta-feira, dois ministros ligados à articulação do governo,
Márcio Thomaz Bastos (Justiça) e
Jaques Wagner (Relações Institucionais), adicionaram ao discurso
a defesa da seletividade das punições -circunscritas, logicamente, ao Congresso Nacional.
Segue um relato de fatos dos últimos dias envolvendo os políticos que procuram liderar o processo, considerado sem condução
política adequada de Lula.
Os atores
São personagens centrais da
tentativa de conduzir o processo
político os seguintes nomes:
Senadores: Aloizio Mercadante
(PT-SP), Delcídio Amaral (PT-MS), Jorge Bornhausen (PFL-SC),
Renan Calheiros (PMDB-SC) e
Tasso Jereissati (PSDB-CE).
Outros: Antonio Palocci Filho
(ministro da Fazenda), Jaques
Wagner, Márcio Thomaz Bastos e
Nelson Jobim (presidente do Supremo Tribunal Federal).
Aos poucos, formam-se tendências dentro desse grupo de políticos. Por exemplo: Bornhausen
prefere falar apenas com Delcídio,
presidente da CPI. Calheiros, que
tinha relação difícil com Nelson
Jobim, já teve um jantar recente
com o presidente do STF. Jereissati teve uma conversa secreta
com José Dirceu no meio da crise.
Há nesse grupo, pelo menos,
três pré-candidatos a presidente
da República na hipótese de Lula
desistir: Palocci, Jobim e Tasso.
Cada passo deles é dado como
parte de uma estratégia eleitoral.
Nelson Jobim
O atual presidente do STF tem
dito não estar disposto a se aposentar como ministro da principal corte de Justiça do país. A única evidência que poderia ter nessa
função ocorre neste momento.
Findo o mandato, voltará a ser
apenas mais um dos magistrados.
Ex-deputado e ex-filiado ao
PMDB gaúcho, Jobim pode vir a
ser uma espécie de nome de consenso que os peemedebistas nunca tiveram na sua história para
disputar a Presidência. A sigla,
que unia a oposição durante a ditadura militar, amargou grandes
derrotas com Ulysses Guimarães
(1989) e Orestes Quércia (1994).
Depois, não teve mais candidatos.
Por isso Jobim se movimenta
para tentar amenizar os efeitos da
crise. Recomenda cautela a todos
com que conversa. Sua prudência
tem incomodado parte dos integrantes da CPI dos Correios.
Na semana passada, a Folha ouviu críticas a respeito da decisão
de Jobim de limitar a liberdade de
ação da Polícia Federal. Despachou determinando que os agentes da PF não poderão fazer nada
além do determinado a eles. Na
CPI, já se montou uma estratégia
para contornar a limitação. Os
congressistas da comissão farão
pedidos específicos à PF quando
for necessária alguma diligência.
Provas e Lula
Esta CPI tem uma diferença
grande das que resultaram no
afastamento de Fernando Collor
(1992) e de vários congressistas
(em 1993 e 1994). Desta vez, as
provas dos sigilos bancários são
mais precisas e contundentes.
Há mais de dez deputados cujos
nomes estão ligados de maneira
indelével a saques em contas pertencentes a empresas de Marcos
Valério de Souza, o principal acusado de prover o "mensalão".
Muitos têm argumentado que era
dinheiro de campanha. Ocorre
que há crime que, pela letra da
Constituição e dos regimentos internos do Congresso, deve ser punido com a perda de mandato.
Quando nos corredores do
Congresso se fala em algum tipo
de acordo, é raro alguém seriamente se arriscar a dizer quais nomes poderiam ser salvos. O pior
para os comandantes do possível
acordo é que ainda não terminou
a fase da coleta de provas. Pelas
contas da CPI dos Correios, nos
próximos 15 dias ainda haverá
novidades a respeito dos saques e
da origem do dinheiro captado
pelo esquema de Marcos Valério e
do ex-tesoureiro nacional do PT
Delúbio Soares. Também deve ser
esclarecido o até agora inexplicado empréstimo do PT a Lula.
A CPI não deverá deixar de buscar a origem dos R$ 12 mil que foram usados para pagar uma parcela do empréstimo de R$ 29,4 mil
do PT para Lula. A contabilidade
petista mostra apenas que houve
um "depósito online". Não se sabe de onde veio o dinheiro.
Na mesma semana em que os
R$ 12 mil foram usados para quitar essa parcela do empréstimo de
Lula, há um saque de R$ 100 mil
de uma das contas do esquema de
Marcos Valério. Uma das sacadoras contumazes, funcionária da
direção do PT, desapareceu dos
olhos da mídia desde então.
Por ora, os membros mais graduados da CPI seguem com a retórica de que Lula não é objeto de
investigação, que é um "homem
de bem". Mas é quase inescapável
a discussão sobre o empréstimo.
A lista completa
A direção da CPI está convencida que dificilmente conseguirá
uma relação completa dos sacadores finais do esquema de Marcos Valério. Esperava-se que alguma lista pudesse ser apreendida
nas operações realizadas pela PF.
Não existe, por enquanto, tal lista. As chances de agentes da PF
encontrarem um documento assim são pequenas. A solução será
aguardar alguém relatar o que viu
sobre os pagamentos. São esperados depoimentos mais completos
de Valério e de Delúbio. Para a
CPI dos Correios, Valério e Delúbio preferiram não dizer ainda
quem eram todos beneficiados
pelo esquema porque não tinham
segurança sobre o que a PF poderia encontrar.
Quando ficar evidente que a lista não aparecerá espontaneamente, Valério e Delúbio terão seu poder de fogo aumentado.
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