São Paulo, quinta-feira, 31 de julho de 2008

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JANIO DE FREITAS

Por dentro dos currais


A ação dos traficantes, na disputa eleitoral, corresponde à mudança de costumes que a violência urbana disseminou

A RELEVÂNCIA imposta pelo noticiário aos casos de real ou alegada dificuldade de candidatos em favelas do Rio, poucos como episódios e duvidosos na maioria, explica-se menos pela ação criminal do que por injunções alheias aos ditos "currais" de candidatos de traficantes e milícias.
A imparcialidade e a firmeza serena com que o desembargador Roberto Wider tem agido no caso, como presidente do TRE-RJ, até agora evitaram problemáticas conseqüências policiais e eleitorais para a cidade e a campanha. Sem acusações explícitas, mas rica nas entrelinhas, sua percepção é muito correta, ao atribuir sobretudo a manipulações políticas a exploração pública de "problemas pontuais", "uma pirotecnia que vamos combater". Entre as centenas de favelas, o mapeamento feito pelo TRE localizou sete focos de comprovado favorecimento ou exclusividade a candidato local, contra o direito dos demais candidatos.
A ação dos traficantes e outros bandidos, na disputa eleitoral, corresponde à mudança de costumes que a violência urbana disseminou. Os "currais de votos" existiram sempre, chefiados pelos cabos eleitorais dos "políticos das bicas" e de outros favores às localidades da pobreza, que, assim, se entregavam ao seu controle eleitoral. Os "políticos das bicas" eram e são, porque estão reduzidos mas não extintos, a versão urbana do "coronel" que, pelo interior todo, controlava o chamado voto de cabresto. Em favelas de hoje, é apenas lógico que as armas substituam a capacidade de transação do cabo eleitoral com políticos e sejam a voz do poder favelado.
O cenário da atual disputa no Rio é farto em candidatos de passado impróprio não só para o exercício de cargo eletivo, mas para a simples candidatura. Exemplo até cômico, um deles tem 22 registros em sua ficha, de trambique a homicídio, 14 dos quais ainda em aberto. A representação atribuída a tais candidatos é óbvia. E, também, o motivo de serem em suas áreas o candidato dado como único. Dentre eles, porém, alguns se destacam como principais motivadores da campanha por intervenção policial em determinadas áreas populares do eleitorado. São, em geral, os que, comprovada ou presumidamente, estão em áreas cujo eleitorado faz o grosso do índice que dá ao "ex"-bispo Marcelo Crivella a ponta nas pesquisas. E, por ora, a perspectiva de boas urnas.
Identificado com a Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), Crivella expõe no "ex" aposto ao título a dimensão das dificuldades que a Igreja Católica lhe opõe. Seus eleitores estão onde está o reino verdadeiro da Iurd. Ou seja, e não por acaso, as áreas populares do eleitorado sobre as quais incide o clamor por submetê-las à vigilância policial-eleitoral, se é possível esta combinação de palavras em democracia.
E, talvez mais grave ainda, a Iurd com que Crivella é identificado identifica-se, por sua vez, com os fortes investimentos que são feitos, já com algum êxito, em uma TV que ambiciona conquistar posições de liderança em audiência.
Os currais eleitorais contêm muito mais do que votos.

O recordista
Lula: "Entre todos os países emergentes, o Brasil é o país que tem inflação mais baixa".
E crescimento econômico também. E meios econômicos de distribuição de renda também. E desenvolvimento educacional também. E assistência pública à saúde também. E previdência social também.


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