São Paulo, sexta-feira, 31 de agosto de 2007

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Ministros do STF negam ter votado com "faca no pescoço"

Magistrados dizem que não foram pressionados no julgamento do mensalão

Apesar disso, Marco Aurélio Mello afirma que declaração dada por seu colega Ricardo Lewandowski dá margem a questionamento da decisão

ANDREZA MATAIS
RANIER BRAGON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) rebateram ontem a afirmação de que analisaram a denúncia do mensalão com a "faca no pescoço". Mas pelo menos um deles, Marco Aurélio Mello, admitiu que a frase dita pelo colega Ricardo Lewandowski pode dar margem a pedido de anulação do julgamento que abriu processo contra os 40 acusados de integrar o esquema.
"Fiquei perplexo, diria impactado. Hoje já tivemos a entrevista de José Dirceu [segundo quem o julgamento está sob suspeição] e passa a ser um gancho. Agora, se será um gancho profícuo em termos de insubsistência da decisão, é o que precisaremos ver posteriormente", disse Marco Aurélio.
O clima ontem no STF era de grande constrangimento. Lewandowski procurou os colegas pessoalmente para se explicar e disparou bilhetinhos durante a sessão ao relator do mensalão, Joaquim Barbosa.
À tarde, nota assinada pela presidente do tribunal, Ellen Gracie, assinalou "que o STF não permite nem tolera que pressões externas interfiram em suas decisões", sendo que "os fatos, sobretudo os mais recentes, falam por si e dispensam maiores explicações".
Lewandowski é um dos dez ministros do STF que analisaram a abertura de processo contra os acusados no mensalão. Em telefonema relatado ontem pela Folha, ele diz que "todo mundo votou com a faca no pescoço" e que a "imprensa acuou o Supremo" frustrando uma suposta tendência de "amaciar para o Dirceu". O ex-ministro da Casa Civil teve processo aberto por corrupção ativa e formação de quadrilha.
"Se é procedente o que está na Folha, ele [Lewandowski] se referiu a todos. Agora, que ele não tenha nos julgado por ele próprio", disse Marco Aurélio. Afirmou ainda que é preciso ter "parâmetros" e que Lewandowski teria cometido um "pecadilho lamentável".
"Ele procurou um a um, muito constrangido, muito aborrecido, para asseverar que não foi aquilo o que ele conversou por telefone", disse. Mas, em entrevista gravada ontem à Folha, Lewandowski confirmou o teor de suas afirmações e apresentou contextualização a elas.
Eros Grau também criticou o colega, de forma indireta. "Não falo nada, nunca usei o celular para dizer o que não devia dizer". Mensagens eletrônicas trocadas por Lewandowski e Cármen Lúcia (que não apareceu ontem na sessão) sugerem um suposto acordo entre Grau e o governo que envolveria a indicação feita por Luiz Inácio Lula da Silva para a 11ª cadeira do tribunal. Eros rebateu a suposta "faca no pescoço" -"Ninguém ousou, eu sou muito grande"- e rejeitou também a possibilidade de o julgamento ser questionado. "O Brasil assistiu ao julgamento, histórico, transparente, não há o que questionar."
"Está para nascer alguém que coloque a faca no meu pescoço para eu decidir. Vai perder o tempo. Jamais houve isso, não me senti acuado, pressionado, muito menos com faca no pescoço", afirmou Carlos Ayres Britto. "Essa é uma pressão normal. Todo dia estamos julgando (...) e não estamos preocupados com a opinião dos senhores [jornalistas]. Recentemente, na segunda turma, um esquartejador foi liberado porque se entendeu que a prisão provisória não se justificava, embora soubéssemos que a matéria iria ser criticada", afirmou Gilmar Mendes, que também disse não ver motivo para questionar o julgamento.
Antes da sessão de ontem, Lewandowski reuniu Ellen, Barbosa e Britto em uma parte da ante-sala do STF e falou por cerca de 15 minutos. A cena pôde ser vista do lado de fora do tribunal. Na sessão, ele chegou a falar ao telefone.


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