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ELEIÇÕES 2006 / RUMOS DA ECONOMIA
Dilma recua e anuncia corte de gastos
Depois de declarar que plano de enxugamento era "rudimentar", ministra diz que "gestão rígida" é para garantir investimentos
Ministra reforça a ala dos
que apontam a redução de
despesas, e não a queda nos
juros, como prioridade para
acertar orçamento federal
FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL
Um dia depois de o governo
Lula decretar o fim da "era Palocci", a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) anunciou ontem que os próximos anos serão pautados por um "enxugamento da máquina", pelo "corte de gastos" e pela "manutenção do superávit primário em
4,25% do PIB" para o pagamento dos juros da dívida pública.
Considerada uma das pessoas mais fortes no governo Lula, há alguns meses Dilma mostrou-se contrária a cortes e
qualificou como "rudimentar"
proposta nesse sentido do Ministério do Planejamento.
"O governo federal vai ter de
enxugar a máquina e reduzir
gastos para manter o investimento e os programas sociais.
Faremos uma política centrada
em uma gestão bastante rígida
do gasto público, e os 4,25% (do
PIB) de superávit (primário)
estão mantidos. Vamos ter um
esforço muito grande nessa
área", disse Dilma em entrevista à rádio CBN.
"Também há gastos de custeio que vamos ter que racionalizar. Quando cheguei ao ministério das Minas e Energia, tinha
uns 25 motoristas e um engenheiro. Não é de graça que você
leva um país ao apagão", disse.
Antes refratária aos cortes,
Dilma vem agora reforçar a tese
dos que consideram a questão
do gasto público como prioritária na abertura de mais espaço
para investimentos em infra-estrutura e para uma queda
mais acentuada dos juros.
Outra corrente de economistas acredita que só a queda do
juro, com outras medidas financeiras e de controle de fluxos de capitais internacionais,
seria suficiente para acelerar a
economia sem a necessidade de
um rígido controle dos gastos.
"Panos quentes"
O economista Carlos Lessa,
ex-presidente do BNDES e
considerado um "desenvolvimentista", afirma que a declaração de Dilma foi para colocar "panos quentes" e abafar o
anúncio do fim da "era Palocci"
-feito pelo ministro Tarso
Genro (Relações Institucionais) um dia antes e corroborado pela própria Dilma.
A ministra havia afirmado
anteontem que "o primeiro
momento (da política econômica de Palocci) passou. Tivemos um período e passamos
por ele", disse.
"As declarações são para colocar panos quentes. O governo
não quer comprar essa briga
com os bancos", afirma Lessa.
O economista defende a queda
mais rápida nos juros como
meio mais efetivo de abrir espaço para investimentos.
Lessa afirma que é "abstratamente razoável" associar o controle de gastos a uma queda mais lenta dos juros, mas que
isso é "insuficiente em termos
de tempo", já que levaria anos
para criar um potencial de crescimento mais acelerado.
O economista Luiz Carlos
Bresser-Pereira, outro "desenvolvimentista", aponta para "os
rentistas, as multinacionais, os
concorrentes externos de empresas brasileiras e o setor financeiro como um todo" como "os maiores interessados" em
em uma trajetória mais lenta
de redução dos juros.
Bresser-Pereira, que está
lançando o livro "A macroeconomia da estagnação", diz que o
juro elevado é hoje a principal
fonte do gasto público.
Como comparação, o setor
público como um todo se comprometeu no ano passado (com
pagamentos e refinanciamentos) com R$ 160 bilhões para os
juros da dívida pública. O Bolsa
Família este ano deve gastar R$
8,5 bilhões para atender mais
de 11 milhões de famílias.
"Ortodoxia convencional"
"No início do governo FHC,
chegamos ao auge dessa "ortodoxia convencional". Hoje, não
precisa mais disso. Embora o
mercado financeiro seja muito
ameaçador, ele é muito pragmático. Se o país faz coisas que
o mercado não gosta, mas que
dão certo, o risco-país acaba
caindo de qualquer maneira."
Alexandre Bassoli, economista-chefe do banco HSBC,
afirma que há "restrições estruturais sérias" ao crescimento
que não podem ser resolvidas
somente com o corte dos juros.
"Simplesmente reduzir o juro para iniciar um processo de
mais crescimento pode trazer
ganhos no curtíssimo prazo,
mas isso é efêmero. Reduzir o
juro traz um estímulo à demanda, mas a oferta tem de crescer
em ritmo maior", afirma.
"A despeito do tamanho do
setor público, ele é ineficiente
para melhorar mais fortemente
a distribuição de renda e para
puxar os investimentos."
"Burros n'água"
Já o economista Antônio
Delfim Netto, um dos maiores
defensores do controle dos gastos públicos para estimular investimentos e o crescimento, afirma que o juro é uma "variável endógena". Ou seja, seria
produto do descontrole dos
gastos, e não a sua causa.
"O custo do Bolsa Família
equivale a 15 dias de juros. É
uma transferência brutal de
renda do setor público para os
rentistas", diz Delfim.
"Mas qualquer tentativa de
reduzir os gastos cortando só os
juros vai dar com os burros n'água. O que o governo deve fazer
é apresentar um plano completo do que vai fazer e cumprir. Se
a sociedade engolir o projeto,
há uma antecipação, e o juro vai
cair naturalmente, liberando
recursos para o setor público e
estimulando os empresários a
investir", afirma o economista.
Colaborou MATHEUS PICHONELLI , da Redação.
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