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RIO +10
Presidente critica "sovinice" de parceiros desenvolvidos e propõe "combate permanente" a subsídios agrícolas
FHC pede que G-8 apóie Protocolo de Kyoto
ELIANE CANTANHÊDE
ENVIADA ESPECIAL A JOHANNESBURGO
O presidente Fernando Henrique Cardoso criticou ontem o
protecionismo e exortou "todas
as nações, especialmente as do G-8 [grupo dos sete países mais ricos
e Rússia", a assinarem o Protocolo
de Kyoto" (tratado para combater
a mudança climática global), durante a sessão de abertura da reunião de chefes de Estado da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio +10), em Johannesburgo.
Na solenidade, FHC também
enveredou pela crítica ao modelo
econômico, pregando um "combate permanente" aos subsídios
agrícolas e a todo tipo de barreira
tarifária ou não-tarifária que prejudique as exportações dos países
pobres. Mais tarde, em entrevista,
criticou a "sovinice" dos ricos.
Em seu discurso na Rio +10,
protecionismo, maior acesso aos
mercados para os países pobres,
um fluxo de capitais "com mais
previsibilidade e estabilidade" e
um comércio internacional "mais
equitativo" são, somados, "imperativos fundamentais na luta pela
erradicação da pobreza".
FHC também ratificou politicamente a proposta brasileira de
uma meta de 10% de fontes de
energia renovável até 2010, justificando que "é preciso deter o processo de aquecimento global".
Disse ainda que, depois do apoio
da América Latina e do Caribe, espera que a meta "se torne uma
avenida para todas as nações".
Em pouco mais que os cinco
minutos a que tinha direito, entre
os 26 chefes de Estado inscritos
para discursar, FHC também fez
um resumo dos principais objetivos do Brasil na Rio +10, que se
encerra amanhã, oficialmente, em
Johannesburgo, África do Sul.
Defendeu princípios como o de
"responsabilidade comum, mas
diferenciada", que atribui maiores deveres aos países ricos, e de
"repartição de benefícios", que
permite aos países pobres dividir
os lucros obtidos pelos ricos com
espécimes de seus territórios.
Ambos deverão constar do texto
final sobre meios de implementação da Rio +10.
FHC também disse, no enorme
plenário em que se realizou a cerimônia, com 103 chefes de Estado
de todo o mundo, que o Brasil está propondo um Fundo para a Diversidade Biológica. A intenção é
começar com recursos "modestos, quase simbólicos", mas
"aberto a contribuições de outros
países, organizações e empresas".
Apesar do discurso abrangente,
e de ter presidido a mesa no final
da abertura da Rio +10, por deferência do presidente da África do
Sul, Thabo Mbeki, a participação
de FHC não teve o impacto esperado por ministros, diplomatas e
até representantes independentes
da delegação brasileira.
Algo abatido, com inglês sofrível, FHC ainda encontrou concorrentes poderosos, inclusive da própria América Latina: o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, por exemplo, fez um discurso mais político, ideológico e passional, arrancando aplausos entusiasmados da platéia de centenas de pessoas ao condenar o neoliberalismo internacional.
"Sovinice dos ricos"
Depois do almoço, mais à vontade, o presidente deu entrevista no hotel onde está hospedado, o Westcliff, e afirmou: "Em matéria de financiamento, tem havido
uma sovinice dos países desenvolvidos, que é inaceitável". E comparou: até o Brasil, com todas as dificuldades, já deixou de cobrar dívidas da própria África do Sul, de Moçambique e de países de América Central.
Voltou a criticar os subsídios e explicou que a tática brasileira é a
persistência: "É aquela [coisa] da água mole em pedra dura, tanto
bate até que fura". Mesma tática, aliás, que pretende usar para continuar defendendo a meta de energia mesmo após a Rio +10.
Sobre a brecha no texto da conferência que poderia incluir a
energia nuclear entre as fontes renováveis, FHC disse que a posição
do Brasil é "cautelosa", e a discussão, complexa, porque não está
claro "até que ponto o efeito pode
ser negativo ou não".
FHC tentou justificar os problemas do Brasil dentro do G-77
(grupo dos países pobres), que
não deu apoio, por exemplo, à
meta de energia: "O Brasil é como
um adolescente que está quase
chegando à idade madura e não
fica confortável com a roupa que
usa", disse.
Acrescentou que o país às vezes
se sente mais adequado no G-77 e,
às vezes, no G-8, pois "está em fase de expansão". Para não deixar
dúvidas, porém, o presidente
FHC disse que o "âmbito natural
de atuação é o G-77".
Ontem, ele também se encontrou com Nelson Mandela, o líder
internacional da luta contra o racismo, no lançamento do Congresso Mundial de Parques, em 2003. Declarou-se amigo pessoal de Mandela e classificou-o como
"um ícone de todos nós".
Acordo com Alemanha
FHC também se encontrou com o chanceler alemão, Gerhard Schröder, e outros chefes de Estado ou personalidades presentes à Rio +10. Conforme a Folha antecipou, porém, não foi assinado ontem o badalado projeto Brasil-Alemanha para a produção de 100 mil carros a álcool. Esse programa tem apoio do filho do presidente, Paulo Henrique Cardoso, que é vice-presidente de uma entidade
empresarial e participa da conferência em Johannesburgo.
No lugar da assinatura, os dois países divulgaram uma declaração conjunta tortuosa, dizendo que "identificaram" a produção desses carros "como um projeto
potencialmente importante sob o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo de Kyoto". As modalidades ainda estão em estudo.
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