|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
BIOLOGIA
Estudo de Yale, Cornell e UFMG mostra que organela descoberta no núcleo distribui mensagens na forma de cálcio
Grupo desvenda nova estrutura da célula
MARCELO LEITE
EDITOR DE CIÊNCIA
Retículo nucleoplasmático
(RN). Guarde o nome da mais nova organela celular, cuja descoberta teve a participação de uma
brasileira, Maria de Fátima Leite.
Ele não deve cair no vestibular
deste ano, ainda, mas logo estará
na lista a decorar para passar no
exame de biologia, ao lado de mitocôndrias, ribossomos e aparatos de Golgi. Afinal, há indícios de
que o RN possa estar envolvido
em processos vitais, da morte celular à formação de tumores.
Leite, 35, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), trabalhou em parceria com cientistas das universidades Yale e Cornell, ambas norte-americanas. Ela
ficou responsável por experimentos de caracterização da nova organela. Como primeira autora do
trabalho publicado eletronicamente na revista "Nature Cell Biology" (www.nature.com/naturecellbiology) figura Wihelma
Echevarría, de Yale, a primeira a
visualizar o RN. O coordenador
da equipe foi Michael Nathanson,
também de Yale.
O primeiro cuidado do futuro
vestibulando deverá ser o de não
confundir a nova estrutura descrita com sua prima já conhecida,
o retículo endoplasmático (RE).
Parentes na forma e na função,
eles não frequentam a mesma turma na célula. O RE fica no citoplasma, o recheio da célula, ou tudo que se encontra fora do núcleo
e dentro da membrana celular. O
RN está confinado ao núcleo, mas
tem pontos de contato com seu
envelope e com o primo RE.
Ambas as organelas estão envolvidas no processamento de
um dos principais sistemas sinalizadores da célula, os íons de cálcio
(Ca2+, um átomo de cálcio que
perdeu dois elétrons). Já era conhecido que um sistema desses
atuava no núcleo, mas não como
nem onde, exatamente. Também
já haviam sido detectadas no núcleo pequenas redes (retículos). A
grande contribuição do grupo de
Leite foi mostrar que esses retículos contêm o Ca2+ e são capazes de
modular sua presença em áreas
delimitadas do núcleo.
A modulação ocorre na forma
de ondas ou picos desses íons, sinais tomados pela maquinaria como ordens ou sugestões para executar certa tarefa. Pode ser a ativação de um gene, ou o início de
uma cascata que leva à morte programada da célula (apoptose), ou
vários outros processos vitais dos
quais o Ca2+ participa.
Se o núcleo da célula fosse um
computador, os RNs seriam circuitos, e os íons Ca2+, elétrons que
transitam por esses circuitos. A
analogia só não é perfeita porque
circuitos de computador trabalham só com elétrons, enquanto o
núcleo e a célula operam com vários outros tipos de sinal.
Outro ponto importante verificado na pesquisa foi que esses sinais são processados no núcleo
também de maneira independente do nível de cálcio no citoplasma. O RN tem o poder de aumentar sozinho o Ca2+ numa área nuclear específica, sem receber íons
através de seus pontos de contato
com o citoplasma ou com o RE. É
como se fosse um computador
dentro do computador, se bem
que interconectados.
Embora se trate de pesquisa básica de biologia, o trabalho de Leite pode ajudar a entender as situações em que esse computador celular trava, ou dispara a fazer coisas indesejadas, como emitir ordens para a célula se multiplicar
freneticamente, como ocorre em
tumores. "O Ca2+ está envolvido
tanto em proliferação celular
quanto em apoptose", diz a cientista de Minas. Uma de suas linhas
de pesquisa diz respeito à ação
dos sinais de cálcio na regeneração de células de fígado.
Texto Anterior: Ambiente: EUA voltam a barrar mogno brasileiro Próximo Texto: Panorâmica - Biossegurança: Novas regras exigem registro no Ibama para fazer pesquisas com transgênicos Índice
|