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Células-tronco neurais são úteis para a aprendizagem
Novos neurônios no cérebro adulto ajudam camundongo a se localizar no espaço
Pesquisa norte-americana
foi realizada a partir de uma
das melhores ferramentas
genéticas disponíveis, diz
pesquisador brasileiro
EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL
No carnaval, é preciso saber
se encontrar. Localizar-se rapidamente no salão, nas ladeiras
de uma cidade histórica ou na
avenida é essencial para não
perder o melhor da folia, e coincidentemente isso tem a ver
com uma descoberta científica
anunciada por uma equipe do
Instituto Salk, na Califórnia.
Os pesquisadores conseguiram relacionar pela primeira
vez o aprendizado espacial desenvolvido pelo mamíferos
com o surgimento de células-tronco adultas em regiões específicas do cérebro. O estudo,
publicado na atual edição da revista "Nature", porém, foi realizado em camundongos.
"Estes dados mostram que os
novos neurônios são importantes para atividades cognitivas
específicas, no caso, a aprendizagem espacial e o auxílio à memória", afirma Rosalia Mendez-Otero, bióloga da UFRJ
(Universidade Federal do Rio
de Janeiro). Ou seja, células-tronco no cérebro ajudam alguém a encontrar seu bloco, seguir o trio elétrico e depois ainda achar o caminho de casa.
Segundo a pesquisadora brasileira, já existia uma prova recente de que há células-tronco
neurais em áreas específicas do
cérebro dos mamíferos adultos.
"E essas regiões produzem novos neurônios continuamente", explica Mendez-Otero.
A plasticidade, palavra que
neurocientistas usam para se
referir à capacidade do cérebro
de se adaptar a diversas necessidades ao longo do desenvolvimento, acaba então de ganhar
mais um significado.
"O que vem sendo muito discutido é se esses novos neurônios servem para alguma coisa.
Caso eles não fossem formados,
que alterações funcionais poderiam ser observadas nos animais?", questiona a pesquisadora da UFRJ.
Transgênico no salão
Para mostrar que a formação
de novos neurônios é desencadeada por fatores externos, os
cientistas do Instituto Salk
-Chun-Li Zhang é o principal
autor do estudo- desenvolveram camundongos transgênicos específicos. Esses animais
tinham os receptores fundamentais para o crescimento de
novos neurônios desligados.
Em vez do salão de carnaval,
porém, eles foram testados numa "academia de ginástica".
Os cientistas já sabiam que o
exercício físico -que requer
que o cérebro lide com informações sobre o espaço ao redor
do corpo- provocam a formação de novos neurônios. Testes
específicos para medir o grau
dessa interferência foram então aplicados nos roedores.
As avaliações mostraram
aquilo que os pesquisadores já
imaginavam. Sem as novas células -que não surgiram exatamente por causa do bloqueio
genético provocado pelos cientistas- a aprendizagem espacial e a consolidação da memória ficaram prejudicadas.
"Essa estratégia genética
usada nesse trabalho é uma das
melhores ferramentas de que
dispomos", afirma Alysson
Muotri, biólogo brasileiro que
também trabalha no Salk. Ele
não assinou o trabalho, mas
participou de descobertas anteriores do grupo.
"Não podemos descartar por
completo um eventual efeito
colateral [para explicar os resultados da pesquisa], mas, a
combinação desses dados com
outros da literatura apontam
para essa nova importância".
Para Muotri, os novos neurônios realmente desempenham
a função de auxílio na memória
e no aprendizado espacial.
"Sabendo que o exercício voluntário (correr em rodinhas,
no caso dos camundongos) aumenta a neurogênese [formação de novos neurônios], eles
poderiam ter usado isso para
ver se a perda da neurogênese
poderia ter sido resgatada com
o exercício", diz Muotri.
Efeito inverso
O encaixe de mais essas peças no quebra-cabeça da plasticidade cerebral também é importante por um outro fator.
O estudo mostrou que a ausência da formação de novos
neurônios, ao contrário do que
era mais provável, não pode ser
considerada uma tragédia.
"Funções como locomoção,
atividades rítmicas diurnas e
outros tipos de aprendizagem
[como o sentimento do medo,
por exemplo] não são afetadas
por esse processo", diz a pesquisadora da UFRJ.
Com a ferramenta genética
funcionando bem, e uma função específica importante da
neurogênese detectada, agora
será possível também avançar
as pesquisas na direção de ajudar os mecanismos neurais
não-saudáveis a conseguirem
se localizar no espaço.
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