São Paulo, domingo, 05 de março de 2000


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Periscópio

Funções da lipoproteína

José Reis
especial para a Folha

A aterosclerose (depósito de gordura no revestimento interno das artérias) é uma das mais difundidas e graves doenças, pelo menos nos países industrializados do Ocidente. Ela pode acarretar doença coronariana e infarto do miocárdio, assim como derrame cerebral. Algumas de suas causas e dos fatores que a favorecem são bem conhecidos e têm sido propalados nos meios de comunicação, concorrendo para baixar seus índices de mortalidade. Pressão alta, diabetes, fumo, consumo de gorduras saturadas (geralmente animais) parecem aumentar a probabilidade da doença coronária prematura. Também influi a constituição genética: há pessoas que se expõem a todos aqueles riscos e todavia não contraem a moléstia.
Por outro lado, descobriu-se que certa porcentagem dos indivíduos que não têm aqueles sinais premonitórios é atingida por ataques cardíacos. Cerca de um terço desses refere-se a pessoas que têm no sangue uma espécie de lipoproteína (complexo de proteína e gordura) que pode ser responsável por casos de aterosclerose que ocorrem em pessoas nas quais a doença coronariana não deveria acontecer pela falta de fatores de risco. Tal lipoproteína é chamada de lipoproteína (a). Esta é muito rebelde, resistindo às alterações dietéticas, ao exercício e a outros fatores que costumam reduzir o risco da aterosclerose. A lipoproteína (a) é abundante no sangue de pessoas cuja sensibilidade à doença coronária não encontra explicação nas causas aceitas.
A lipoproteína (a) foi descoberta no começo de década de 60 por Kare Berg, na Universidade de Oslo. Por injeção de lipoproteínas humanas em coelhos, ele obtinha anticorpos contra as lipoproteínas e confirmou que cerca de um terço das amostras humanas contém lipoproteína (a). Revelou ainda que sua lipoproteína (a) é hereditária. Gosta Dahlén, do Hospital Central de Boden (Suécia), provou que os indivíduos com lipoproteína (a) têm incidência de ataque cardíaco superior à de uma população controle.
Pesquisas mais detalhadas provaram que quase todas as pessoas têm lipoproteína (a), mas em concentração que varia de quase mil vezes entre os indivíduos. Por outro lado, a concentração de lipoproteína em cada pessoa é constante.
No sangue humano, a principal partícula transportadora do colesterol é a lipoproteína de baixa densidade (LDL). Sua molécula é formada de 2.000 moléculas de colesterol, mil de fosfolipídeos (gorduras fosforadas) e uma proteína superficial chamada de apoliproteína B-100. A molécula da lipoproteína (a) difere da lipoproteína comum pela presença de uma apolipoproteín(a), que se prende a aquela outra apolipoproteína.
A lipoproteína (a) é parecida também, pelos ácidos aminados que contém, com uma substância muito importante na fisiologia do sangue-o plasminogênio. Esse é precursor de uma protease (enzima que desagrega as proteínas) envolvida em reações que levam à dissolução ou à formação da fibrina, a proteína principal dos coágulos.
Pesquisadores ainda estão inseguros a respeito de como a lipoproteína (a) pode promover o ataque coronariano. Vários experimentos sugerem que a lipoproteína (a) pode favorecer o fechamento de ferimentos, embora também seja capaz de promover a aterosclerose, quando presente em excesso. Resultados preliminares de estudos genéticos e bioquímicos sugerem que, em parte, a aterosclerose e o ataque cardíaco podem ser efeitos colaterais do envolvimento da substância no reparo de vasos rompidos.


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