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ANÁLISE
Uma nova revolução industrial?
LUIZ GYLVAN MEIRA FILHO
ESPECIAL PARA A FOLHA
As notícias sobre o desenvolvimento da promessa ou declaração que o Brasil fará na COP-15 em Copenhague, em dezembro, são alvissareiras porquanto nosso país se inclui no rol daqueles que estão dispostos a fazer sua parte no esforço mundial de combate à mudança do
clima. Há, no entanto, alguns
alguns aspectos preocupantes.
Estamos hoje, de facto, embora não de direito, em um regime de "pledge and review"
nas negociações internacionais
sobre a mitigação da mudança
do clima. Ou seja, os países se
reúnem, fazem promessas, ou
declarações de ações voluntárias, ou assumem compromissos, tanto faz. O fato é que
anunciam perante a sociedade
das nações o que pretendem fazer para limitar a mudança do
clima a um máximo de 2ºC, limite esse que muito provavelmente será objeto de acordo de
todas as nações em Copenhague. O cumprimento das promessas será revisto periodicamente no futuro. O não cumprimento submeterá o país respectivo à execração do mundo,
pelo menos na imprensa.
O Brasil declarou que fará
sua parte no esforço global, levando em conta que a responsabilidade de cada país é diferente, e que a responsabilidade
histórica deve ser considerada.
A razão disso é que -no caso
do dióxido de carbono, o principal gás de efeito estufa- o
máximo de mudança do clima
ocorre até 50 anos após a sua
emissão. Por isso, os países que
se industrializaram mais tarde
do que a média mundial têm a
sua responsabilidade, se medida pela mudança do clima hoje,
menor do que se medida pelas
emissões atuais ou pela mudança do clima daqui a 50 anos.
O fato de a história atenuar a
responsabilidade relativa do
Brasil, porém, não significa que
tal responsabilidade seja nula.
No necessário e saudável debate sobre como obter as reduções de emissões, no entanto,
as coisas não vão muito bem.
Primeiro porque o tema, como colocado na imprensa, parece ser o que o Brasil dirá em
Copenhague. Espero que isso
seja uma visão errônea do que
efetivamente ocorre. Na minha
opinião, o Brasil deverá levar a
Copenhague um relato fiel do
que faz e pretende fazer.
Ocorre que, no que diz respeito à diminuição de desmatamento, há um debate há vários
anos, sobre como deve ser. O
Congresso está envolvido na
discussão, o que é importante.
Em outros setores, no entanto, fico com impressão que o
assunto é tratado a portas fechadas, sem um debate público
com as partes envolvidas. Das
poucas notícias na imprensa,
transpira uma ideia de que a
definição da redução de emissões, pelo menos em outros setores, estaria sendo ajustada
em função da taxa anual de
crescimento do PIB do Brasil.
Neste ponto, as coisas realmente ficam preocupantes.
É sabido que há uma correlação entre as emissões e o PIB
dos países. Admitir tal correlação como premissa na formulação de política implica aceitar
as razões substantivas que a validam, em particular as tecnologias utilizadas.
Ora, há evidências de que a
redução necessária de 60% nas
emissões globais de gases de
efeito estufa somente será possível se forem modificados de
forma radical os paradigmas
atuais de geração e uso de energia (uma nova revolução industrial?). A modificação não ocorrerá naturalmente, será necessária a interferência dos governos, em todas as esferas, para
induzir as mudanças necessárias. Preocupa-me o fato de
que, pelo que posso apreciar, o
debate em Copenhague tende a
substituir o necessário debate
nacional sobre como induzir as
mudanças necessárias após o
término da COP-15.
LUIZ GYLVAN MEIRA FILHO, pesquisador do
Instituto de Estudos Avançados da USP, foi negociador brasileiro no Protocolo de Kyoto
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