São Paulo, sábado, 07 de setembro de 2002

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ASTRONÁUTICA

Foguete sobe em novembro com 8 experimentos semelhantes aos que poderão embarcar na estação espacial

Brasil lança estudos de microgravidade

SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Em novembro, com o lançamento de uma pequena cápsula acoplada a um foguete também modesto, o Brasil começa a tatear seu futuro no espaço. É a primeira missão do Projeto Microgravidade, um programa que servirá como piloto para a seleção de experimentos brasileiros para a ISS (Estação Espacial Internacional).
A lista dos oito experimentos pode ser tudo, menos monótona. Um estudo de gel que pode lançar luzes sobre problemas neurológicos como enxaqueca e epilepsia. Um teste para determinar o papel da gravidade no processo de auto-reparação do DNA que conserta sequências danificadas por raios ultravioleta. Um sistema de controle térmico para proteger equipamentos eletrônicos em satélites. Um método que pode levar à criação de um material isolante, mas ainda assim metálico. E esses são apenas alguns exemplos.
"Tentamos otimizar a seleção dos experimentos para levar o maior número possível, sem que um atrapalhasse o outro", diz Otávio Durão, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), que fez parte da comissão de seleção dos experimentos.
Os projetos vêm de sete instituições. Além de um forno desenvolvido pelo Inpe para acondicionar outros dois experimentos, irão ao espaço no foguete brasileiro VS-30 projetos de diversas universidades brasileiras.
O lançamento está previsto para a segunda quinzena de novembro. "Esse projeto está no âmbito da preparação brasileira para o uso futuro da Estação Espacial Internacional", afirma Múcio Roberto Dias, presidente da AEB (Agência Espacial Brasileira), instituição responsável pelo Projeto Microgravidade. "Esperamos que essa seja a primeira de muitas missões. A idéia é fazer pelo menos um lançamento por ano."
A AEB gastou cerca de R$ 500 mil nos experimentos e deve despender outros R$ 200 mil a R$ 300 mil no lançamento, que será feito da base de Alcântara (MA).
O objetivo é encorajar a comunidade científica nacional a desenvolver idéias para experimentos no espaço, para quando a ISS estiver concluída, a partir de 2006.
"É uma fase preliminar", afirma Dias. A utilidade dos vôos dos foguetes suborbitais (que não chegam a dar uma volta na Terra) deve ser não só para realizar experimentos menos ambiciosos, mas também para testar projetos de longa duração, executáveis na ISS.
Por ora, a adesão da comunidade científica já chamou a atenção. "Tivemos 14 experimentos inscritos, um número maior do que a gente esperava", diz Durão.

Corrida contra o relógio
Ainda não são os "50 anos em 5" de Juscelino Kubitschek, mas já é alguma coisa: oito experimentos em três minutos. É esse o tempo que eles terão para começar e terminar, quando o foguete que os carrega atingir o auge de sua trajetória, a 150 km de altura.
Nesse curto espaço de tempo, no interior do foguete prevalecerão condições equivalentes à gravidade zero. Mas atenção: a gravidade estará agindo ali como em todos os momentos e lugares do Universo, só que, durante a curva que antecede a descida, o foguete e as coisas que estão dentro dele sofrem uma força centrífuga que compensa em parte a gravidade.
O resultado, se houvesse ali uma pessoa, seria a sensação de estar flutuando, ou seja, livre da ação gravitacional. O efeito é o mesmo que sentem os astronautas em órbita: a força da gravidade lá tem 90% da intensidade que há na superfície da Terra, mas parece ser nula, porque os astronautas e a cápsula em que viajam estão sempre "caindo". Sua trajetória de queda acompanha a curvatura da Terra, de forma que eles sempre "erram" o alvo.
No caso do astronauta em órbita, a sensação de perda de peso é contínua. No do VS-30, o efeito é apenas temporário, enquanto a curvatura da trajetória do foguete acompanha a do planeta.

Pendência na ISS
O projeto já tem, por si só, grande valor científico, mas sua utilidade como piloto para o desenvolvimento de futuros experimentos para a ISS depende de o Brasil continuar no projeto -algo que ainda está pendente.
Depois que o ministro da Ciência e Tecnologia, Ronaldo Sardenberg, enviou uma carta à Nasa (agência espacial americana) informando que o país não poderia entregar a tempo os equipamentos que havia se responsabilizado em produzir, em julho, não houve resposta oficial dos EUA.
"A coisa está como estava", afirma Dias. "Estamos esperando uma resposta da Nasa." O Brasil propôs aos americanos uma reunião para discutir uma reformulação da participação brasileira.
"Vamos levar apenas dois condicionantes que esperamos ver atendidos. Esperamos gastar apenas os valores acertados no acordo original, em 1997 [US$ 120 milhões] e queremos que a execução de nossa parte aconteça 100% no Brasil", afirma Dias.
A expectativa do presidente da AEB é que a reunião com a Nasa aconteça até o final do mês.


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