São Paulo, quarta-feira, 08 de março de 2006

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QUESTÃO DE GÊNERO

Dados compilados por pesquisadoras do RJ mostram desvantagem feminina em qualificação acadêmica

Homem domina ciência no país, diz estudo

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO

Apesar do avanço das mulheres em todos os níveis da educação brasileira, o meio científico e tecnológico ainda é, predominantemente, masculino. É o que mostra um estudo feito pelas pesquisadoras Hildete Pereira de Melo, da Universidade Federal Fluminense, e Helena Maria Martins Lastres, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Para mostrar esse quadro, elas fizeram tabulações próprias a partir da relação de bolsas de produtividade -as de maior importância acadêmica- mantidas pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
Elas mostram que, no nível mais elevado de qualificação acadêmica da escala do CNPq, apenas 21,1% dessas bolsas eram para mulheres em 1999. No início da década de 1990, o quadro era muito parecido: apenas 18,5%.
O CNPq, a partir de critérios de produtividade acadêmica, classifica os pesquisadores em nove níveis (1A, 1B, 1C, 2A, 2B, 2C, 3A, 3B E 3C). Os pesquisadores de nível 1A são os de maior produção, avaliada, entre outros critérios, com base no número de teses, artigos publicados ou orientações em programas de pós-graduação.
É justamente nesse nível em que a participação feminina é menor. Nos níveis abaixo, a participação é maior e chega, no nível 3C, a 44%. No total, independentemente do nível, as mulheres representam 31,2% das bolsas de produtividade do órgão.

Humanidades
A pesquisa mostra ainda que a única área de conhecimento em que mulheres são maioria é a de humanidades, com 58,8% de participação. Em todas as demais áreas, o percentual é de menos da metade, sendo a menor proporção feminina encontrada em matemática (apenas 12,1%).
A pouca representatividade feminina no setor é verificada também a partir do total de patentes registradas no Inpi (Instituto Nacional da Propriedade Industrial). Do total de 952 patentes em que foi possível identificar pelo nome o sexo da pessoa que fez o registro, apenas 75, ou 7,9%, eram de mulheres em 2001. Em 91, o percentual era ainda menor: 4,7%.
Para as autoras, esses dados mostram que "apesar de todas as conquistas alcançadas pela mulher nas últimas décadas, as mulheres permanecem esquecidas ou pouco visíveis no sistema científico ou tecnológico".
A polêmica sobre mulheres na ciência nunca esteve tão quente: nos EUA, por exemplo, ela foi um dos estopins da demissão do reitor da Universidade Harvard, Larry Summers. No ano passado, ele havia insinuado que diferenças inatas tornavam as mulheres menos aptas que os homens para as carreiras em ciências naturais, como biologia e física.
Na avaliação de Hildete Pereira de Melo, essa baixa participação das mulheres no Brasil pode ser explicada tanto pelo preconceito quanto pelo fato de que a formação de um pesquisador no nível mais elevado leva tempo.
"Formar um cientista é uma estrada muito longa. Leva tempo. Não basta só ter um doutorado. Somente na década de 1990 houve uma explosão de matrículas na pós-graduação brasileira. As mulheres aproveitaram esse aumento, tanto que a participação delas já é bastante alta em bolsas de iniciação científica. Acho que o caminho natural será o aumento dessa participação das mulheres até chegar a metade do total."

Esquecidas
Para ela, no entanto, há, sim, preconceito quando a história de grandes cientistas brasileiras não é lembrada. "Encontramos registros desde a década de 1930 de várias mulheres que tiveram atuação destacada, mas ninguém fala hoje delas. A sociedade nunca botou refletores nelas. É por isso que é importante realizar estudos de gênero", afirma a pesquisadora.


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