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BIOMEDICINA
Brasileiro e polonês acusam revistas de dar
espaço apenas para pesquisadores de instituições renomadas
Rico e famoso tem
privilégio, afirmam
terceiro-mundistas
DO ENVIADO A CHICAGO
Um dos temas mais polêmicos
do congresso sobre revisão por
pares realizado em Chicago foi a
tendência de revisores a privilegiar a publicação de trabalhos de
pesquisadores renomados em
instituições idem, em particular
dos EUA. A discussão pegou fogo,
no segundo dia da reunião, após a
apresentação de um brasileiro,
Danilo Blank, da Sociedade Brasileira de Pediatria. A coordenadora americana da mesa, Annette
Flanagin, começou com o pé esquerdo: anunciou Blank como
sendo de Portugal.
Blank apresentou seu estudo sobre o "Jornal de Pediatria", periódico médico -em português-
que imprime 16 mil cópias distribuídas entre os associados da entidade. Ele mostrou como a revista conseguiu mais que dobrar a
quantidade de artigos submetidos
a ela por meio de providências como uma versão em inglês pela internet e a inclusão dos artigos no
sistema de indexação Medline.
Apesar disso, periódicos como
esse são ignorados pela comunidade científica internacional, que
só tem olhos para sua classificação segundo "fatores de impacto"
(quantidade média de citações de
cada artigo publicado). Em revistas de países pobres como o Brasil, ele raramente passa de 1. O da
"Cell", por exemplo, é superior a
28, um dos mais altos do mundo.
Cria-se um círculo vicioso, em
que revistas de países periféricos
atraem poucos artigos porque
têm baixo impacto e têm baixo
impacto porque não atraem muitos artigos. Outra distorção discutida no congresso foi a tendência
de editores dos maiores periódicos a caçar autores e artigos com
potencial para serem mais citados, o que ajuda a elevar o fator de
impacto da sua publicação.
Diante das acusações de "viés"
dos fatores de impacto, levantou-se para defendê-los seu inventor,
o americano Eugene Garfield.
Disse que não há viés e que prova
disso era o fato de a produção
científica brasileira em periódicos
indexados estar crescendo acima
da média mundial (não mencionou o fato de que, ainda assim, ela
não chega a 2% do total).
O polonês Piotr Dobosz, da
Blackhorse Scientific Publishing
de Varsóvia, polemizou com Garfield. Disse que o aumento da produção brasileira era simples de
explicar: "Pesquisadores brasileiros tentam publicar aí [nos periódicos indexados de alto impacto]
porque alguém decidiu que esses
são os melhores periódicos". Na
sua opinião, um atentado ao "direito humano à informação" (e à
circulação das revistas que ele publica na Polônia, também).
O direito à informação está
também na raiz de outro tema polêmico, os periódicos de acesso livre na internet, como os da família "PLoS" ("Public Library of
Science"). Não é preciso pagar assinaturas para ter acesso a essas
revistas. São os autores que pagam para ter artigos publicados,
se puderem (70% a 80% o fazem e
custeiam todo o trabalho de revisão por pares e edição). Richard
Smith está entre os defensores do
novo sistema, que não tinha porém muitos adeptos entre os mais
de 400 participantes do encontro.
Só duas pesquisas sobre o impacto do acesso livre foram apresentadas, por Sara Schroter, do
"BMJ" ("British Medical Journal"), e Harold Sox, dos "Annals
of Internal Medicine". Com dados sobre falta de financiamento
de autores na época da submissão
de artigos, Schroter questionou se
a cobrança não enviesaria ainda
mais as publicações em favor de
instituições bem-dotadas -sob
protestos de Smith, que considerou as conclusões... enviesadas.
Sox apresentou dados de uma
pesquisa entre membros do American College of Physicians, entidade médica cuja anuidade inclui
uma assinatura dos "Annals", sobre o acesso livre ao periódico:
81% deles disseram que continuariam na associação e só 3,5% declararam a intenção de deixá-la,
se pudessem ler sem pagar. Apesar disso, a última transparência
da apresentação de Sox dizia:
"Editores de periódicos que gostem de seus empregos deveriam
experimentar as águas antes de
tornar tudo acessível a partir do
dia primeiro".
(MARCELO LEITE)
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