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São Paulo, segunda-feira, 08 de dezembro de 2003

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ASTRONOMIA

Nasa faz medição pioneira do chamado efeito Yarkovsky, desvio na trajetória de bólidos fatais do Sistema Solar

Luz solar põe asteróide em rota de colisão com a Terra

SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Cientistas americanos observaram diretamente pela primeira vez um fenômeno que pode ser o principal responsável pela colocação de asteróides numa rota de colisão com a Terra.
Trata-se do efeito Yarkovsky, sugerido pela primeira vez por um cientista russo há um século, mas ressuscitado não faz muito pela comunidade científica. Ele descreve basicamente um modo não-gravitacional pelo qual um asteróide pode alterar sua trajetória ao longo do tempo.
Normalmente, as órbitas descritas pelos objetos celestes são caracterizadas por suas interações via gravidade -principalmente a do Sol, no caso do Sistema Solar.
Há um grande cinturão de asteróides localizado entre as órbitas de Marte e Júpiter. Exceto por raras ocasiões em que esses objetos colidem ou acabam passando perto demais do sistema joviano, suas órbitas ficam limitadas àquele espaço. Ou melhor, ficariam, não fosse o efeito Yarkovsky.
Trata-se do efeito acumulado de impulsos diminutos causados pela luz que chega do Sol. Em tese, cada um desses objetos recebe aproximadamente a mesma quantidade de luz em todas as regiões, por causa de seu efeito de rotação. Entretanto, dependendo da capacidade de reflexão (albedo) da região na superfície, ele rebate mais ou menos raios luminosos. Esse desequilíbrio faz com que sua rota normal seja alterada levemente, pois o astro "sentiria" um impulso mais forte numa determinada direção.

Lento deslocamento
Acredita-se que o fenômeno seja um componente importante para o deslocamento de objetos do cinturão de asteróides para regiões mais internas do Sistema Solar. Ele criaria uma nova população de bólidos cósmicos conhecidos pela sigla NEO ("objeto próximo à Terra", em inglês). Sabe-se que há cerca de mil asteróides desse tipo com diâmetro maior do que um quilômetro -ou seja, capazes de devastação global, caso se choquem com a Terra.
Apesar da forte desconfiança de que o efeito Yarkovsky fosse real, ninguém ainda havia detectado sua ação. O feito coube a um grupo liderado por Steven Chesley, do Laboratório de Propulsão a Jato (JPL) da Nasa (agência espacial americana). Eles detectaram uma pequena discrepância na trajetória de um asteróide conhecido como 6489 Golevka, um corpo de meio quilômetro de diâmetro que entra na categoria dos NEOs.
Com imagens de radar captadas a partir do Observatório de Arecibo, em Porto Rico, os pesquisadores conseguiram observar o diminuto efeito e, com ele, calcular a densidade do asteróide -cerca de 2,7 gramas por centímetro cúbico, com margem de erro de 0,4 para mais e 0,6 para menos.
A capacidade de seguir detectando o efeito Yarkovsky em outros objetos deve permitir que os cientistas consigam cada vez mais detalhes sobre os asteróides que ameaçam a Terra. Trata-se de um fator fundamental para determinar um curso de ação no caso de perigo de colisão. Além de determinar a densidade do objeto (importante para estimar se ele se fragmentaria na atmosfera terrestre ou cairia como um pedaço grande), seria possível aperfeiçoar a predição de sua órbita e constatar com mais exatidão se um choque de fato iria ocorrer.

Como salvar a humanidade
Além disso, o efeito Yarkovsky, embora seja em primeiro lugar um dos responsáveis por colocar a humanidade em perigo, pode também ser a chave para salvá-la de um impacto.
Muito mais fácil do que desviar um asteróide pela força bruta seria simplesmente pintá-lo de branco, tornando-o mais reflexivo. O efeito Yarkovsky aumentado, alimentado pela luz do Sol, cuidaria do resto, desviando o bólido de seu curso previsto.
Claro, como o efeito é pequeno, seria preciso aviso prévio de várias décadas para executar o procedimento. Mas seria exequível.
"Mudar o albedo [poder de reflexão] é um modo de manipular o efeito Yarkovsky. Poderia exigir a deposição de uma grande quantidade de material no corpo, mas isso é algo que possivelmente poderíamos fazer", diz Joseph Spitale, da Universidade do Arizona, que trabalha justamente com a possibilidade de desviar objetos ameaçadores dessa maneira.
O estudo de Chesley e seus colegas saiu na última edição da revista norte-americana "Science" (www.sciencemag.org).



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