São Paulo, quinta-feira, 09 de fevereiro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Fã de New Age, Pontes quer ser violeiro da estação espacial

DO ENVIADO A MOSCOU

Tudo começa com uma luz piscante num painel. Uma pane. O sistema que separa os módulos da nave não dispara automaticamente, ameaçando o processo crítico de reentrada na atmosfera terrestre. A tripulação sabe exatamente o que fazer -valeu passar noites em claro revisando os manuais técnicos de sistemas. O comandante passa ao controle manual. O procedimento funciona. Os três tripulantes da Soyuz vivem mais um dia. Tudo isso num simulador, claro.
"Ainda não morri aqui nenhuma vez", conta com orgulho Marcos Cesar Pontes, ao mostrar os detalhes de funcionamento do simulador da nave Soyuz (em russo pronuncia-se "saiús"). O astronauta brasileiro está em ritmo puxado de treinamento na Cidade das Estrelas, centro fechado nos arredores de Moscou que hoje abriga cerca de 7.000 pessoas e serve de campo para a preparação de cosmonautas. As instalações estão em uso desde o tempo de Yuri Gagarin, o primeiro homem a ir ao espaço, em 1961. (A mulher dele vive lá até hoje.)
Pontes faz duas a três simulações dessas por semana. Enquanto ele e seus colegas de tripulação (Pavel Vinogradov, da Rússia, e Jeffrey Williams, dos Estados Unidos) trabalham no apertado simulador, uma equipe numa sala ao lado cria problemas para eles -todo tipo de pane, em todas as fases da viagem. Apesar das dificuldades, Pontes até que considera isso um refresco.
Também pudera, depois de passar sete anos (1998 a 2005) no Centro Espacial Johnson da Nasa, em Houston, EUA, se familiarizando com todos os detalhes de como se voar no complicado ônibus espacial. Pontes confessa que nos simuladores das naves americanas ele já "morreu" duas vezes (ou seja, não conseguiu salvar o veículo de um problema).

Encontro marcado
Ontem, logo depois de mais uma passagem pelo simulador, Pontes teve de encarar um tipo diferente de desafio: enfrentar os jornalistas. Foi na entrevista coletiva organizada pela Roskosmos (agência espacial russa) para apresentar, naquele país, a próxima tripulação a ir à ISS (um evento similar foi realizado em Houston, no mês passado).
Williams e Vinogradov vão ao espaço para ficar seis meses em órbita. Embora Pontes, em comparação, vá ficar só dez dias, foi ele quem recebeu mais perguntas. O evento foi realizado em três línguas: português, inglês e russo.
Quando perguntado se, em razão do número, ele temia fazer a viagem justo com a chamada Expedição 13, o brasileiro disse não ter essa superstição. Em todo caso, arrematou: "Tecnicamente, sou 12 e meio, porque vou com a 13, mas volto com a 12", arrancando risos dos entrevistadores.
Pontes também fez sucesso ao comentar sua adaptação aos rigores do inverno russo. "Eu me adaptei bem ao frio, gostei. Ouvi dizer que é o ano mais frio dos últimos não sei quantos anos. Tive sorte de conhecer o frio do inverno russo. Até dezembro não tinha aparecido, mas agora veio com vontade." Com isso, mais uma vez quebrou o gelo e provocou risadas entre os presentes.
Mais tarde, falando só aos jornalistas brasileiros, o militar de Bauru (interior paulista) alertou que pode se tornar mais um "violeiro das galáxias". "Já tem um violão e um teclado na estação", insinua, rindo. Ele diz que pretende usar as inspirações de seu vôo para trabalhar em algumas músicas que compõe com seu primo Adylson Godoy, que já foi do grupo Zimbo Trio.
Quanto ao que vai ouvir por lá, o astronauta diz ter um gosto "eclético" para música. A primeira coisa que vem à mente? "Gosto muito do gênero New Age." (SN)


Texto Anterior: Prazo de treino preocupa, diz astronauta
Próximo Texto: Saiba mais: Treino envolve maratona e curso de língua russa
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.