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Marcelo Gleiser
Robôs tropicais
Nem num Fla-Flu,
que cresci vendo, havia tanta vontade
O estádio estava lotado. Quase
2.000 jovens, com idades de
14 a 19 anos, lotavam as arquibancadas e o campo. Mas não se via
rede de vôlei, trave de futebol de salão
ou cesta de basquete. Nem mesmo era
um show de rock que estava para começar. Eram 50 grupos multicoloridos, cercando geringonças metálicas,
fios, rodas e ferramentas espalhadas
por toda a parte, um caos tecnológico
completo. Objetivo: cada grupo, representando uma escola ou um consórcio de escolas, tinha de construir
um robô desenhado especificamente
para realizar tarefas montadas para a
competição: um campeonato de robôs, onde times competem para construir o mais veloz e o mais eficiente.
Nem mesmo num Fla-Flu decisivo,
que eu cresci assistindo, vi tanto entusiasmo. E o sensacional é que o objetivo era incentivar o trabalho em equipe, a criatividade, influenciar jovens,
especialmente moças e grupos minoritários, a participarem de um evento
tecnológico, a se interessarem por
ciência, computação e engenharia.
O evento ocorreu fim de semana
passado aqui no Estado de New
Hampshire, onde moro. Os 50 times
representavam a região da Nova Inglaterra, que inclui os estados de New
Hampshire, Maine, Vermont, Massachussetts, Rhode Island e Connecticut. Meu filho de 14 anos competia no
time da sua escola. Desde o início de
novembro, ia para a escola de engenharia todos os dias por 5 horas para
trabalhar no seu robô com seus companheiros. Cada grupo tem um ou
mais mentores -engenheiros, professores, voluntários que ensinam os jovens (e, em certos casos, aprendem) a
construir um robô a partir de um kit
comum. A dedicação era completa.
Novas amizades surgiram, baseadas
em interesses comuns nas áreas de
ciência e tecnologia.
O evento é realizado todos os anos
pela organização First, uma sigla que
em português significa "Para Inspiração e Reconhecimento de Ciência e
Tecnologia". A idéia é motivar jovens
a entrar para as áreas de ciência e tecnologia, eliminando o absurdo tabu de
que "isso é coisa para nerd". Pelo que
vi na turma da competição desse ano,
que abriu o campeonato de 2008 nos
EUA, tinha de tudo. Mas o que mais tinha era entusiasmo. O desafio deste
ano é construir um robô capaz de tirar
uma bola de uma plataforma, carregá-la em torno de uma pista oval e lançá-la sobre a mesma plataforma, como
num jogo de vôlei.
Depois das eliminatórias, oito times
foram selecionados. Esses times escolhem dois parceiros dos outros times
para firmar uma "aliança". Essas
alianças fazem com que times colaborem entre si para tentar vencer os demais. É empolgante.
Mas foi quando o fundador da First,
Dean Kamen, fez o seu discurso, que
me empolguei de verdade. Pois ele falou na competição como sendo um
evento internacional, envolvendo Canadá, Israel e Brasil! É, jovens brasileiros vêm participando desses campeonatos já há alguns anos. Ano passado, foram 450 jovens representando
15 equipes competindo em Porto Alegre. Neste ano, a competição, aberta
ao público, será em São José dos Campos (local bem apropriado) nos das 14
e 15 de março. Para mais detalhes, ver
www.brfirst.org.
Se isso soa como propaganda é porque é. Recomendo que professores levem suas turmas, que pais que queiram motivar seus filhos e filhas a estudarem mais, a entrarem para áreas
tecnológicas, assistam ao evento. É
muito divertido, uma grande celebração do espírito de colaboração e da inventividade humana.
Apenas uma nação com um parque
tecnológico autônomo e um espírito
inovador sobreviverá num mundo
competitivo. Boa sorte aos times!
MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA) e autor do livro "A Harmonia do Mundo"
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