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Periscópio
Reação dos vegetais ao ataque dos insetos
José Reis
especial para a Folha
As plantas possuem numerosos
meios de defesa contra os predadores em geral (espinhos, acúleos, pelos urticantes, toxinas etc.). É imensa a pressão
que sofrem dos insetos herbívoros. Pelo
menos meio milhão de espécies, em todo
o mundo, vive à custa de plantas vivas.
Recolhem anualmente cerca de 150 bilhões de toneladas de tecido vegetal. O
ingrediente principal dessa colheita é a
celulose. Curioso é que, ao contrário de
muitas bactérias e fungos, a maioria dos
insetos herbívoros não é capaz de digerir
e aproveitar a celulose. A vasta maioria
dos insetos que usam a celulose como
alimento vale-se do auxílio de fungos,
bactérias e protozoários para digeri-la, à
semelhança do que fazem os ruminantes, cavalos e outros vertebrados.
Por que a maioria dos insetos não usa
como alimento a celulose, que forma a
parede das células vegetais, onde se concentram os elementos nutritivos (açúcares, proteínas etc)? É que essa parede celulósica é muito dura e difícil de digerir,
de maneira que muitos insetos se contentam em sugar o alimento de sua preferência, enquanto outros, dotados como os gafanhotos e as lagartas de fortes
mandíbulas, quebram a parede, triturando-a sem digeri-la, e aproveitam o conteúdo libertado das células. Há todavia
algumas espécies que conseguem digerir
a celulose. É o caso de certas baratas, cupins e brocas. Alguns desses insetos
aproveitam a ajuda de protozoários que
vivem em seu tubo digestivo; outros (cupins e certos besouros) são ajudados por
bactérias também intestinais, enquanto
outros procuram as enzimas digestivas
necessárias em fungos que apodrecem
nas madeiras. Finalmente alguns insetos
parecem capazes de produzir sua próprias enzimas que digerem a celulose.
Num congresso de biologia molecular
realizado em Tucson, Arizona, mereceu
destaque o estudo dos meios pelos quais
as plantas reagem quimicamente ao ataque dos insetos. O bioquímico Clarence
Ryan e colaboradores, da Universidade
Estadual de Washington, descreveram
suas pesquisas sobre o que se passa
quando, por exemplo, uma lagarta procura mastigar uma folha de fumo. Logo
se manifestam no inseto sinais violentos
de indigestão, que o fazem abandonar o
ataque e procurar alimento noutro lugar.
Ryan começou suas pesquisas há 20
anos, procurando encontrar alguma
substância capaz de deflagrar a "reação
de estresse". Investigou substâncias relativamente simples, do tipo dos chamados hormônios vegetais, auxinas e citocininas, responsáveis por fenômenos de
crescimento e desenvolvimento celular.
Nunca lhe passou pela cabeça investigar
a presença de substâncias mais complexas, como os polipéptides que atuam como hormônios animais. Péptides são
ácidos aminados unidos mediante expulsão de certos grupos moleculares. Os
polipéptides são substâncias compostas
de vários péptides.
Há quatro anos, Ryan começou a pesquisar a presença de substâncias mais
complexas e conseguiu isolar um material que estimula a produção de inibidores de proteinases, as enzimas que decompõem as proteínas. Quando inibidas
essas enzimas, como aconteceu na lagarta que queria comer a folha de fumo, deflagra-se a reação de estresse. Ficou bem
provado que esse material inibidor é um
péptide que recebeu o nome de sistemina porque é transportado sistematicamente na planta, à maneira dos hormônios vegetais. Como esses hormônios, a
sistemina é também muito ativa -uma
parte em 10 trilhões pode desencadear
uma reação de estresse na planta- e é
sintetizada como parte de uma proteína
precursora maior, da qual se separa.
Edward Farmer demonstrou que a
gordura vegetal metiljasmonato induz
produção do inibidor da proteinase, o
que a sistemina também faz. Entende
Ryan que esta pode agir estimulando a
síntese do metiljasmonato. O melhor conhecimento desses mecanismos de reação química pode abrir caminhos novos
no desenho de mais eficientes estratégias
na luta contra as pragas.
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