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São Paulo, sexta-feira, 09 de maio de 2003

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ASTRONOMIA

Projeto espacial europeu e brasileiro pode ser primeiro a detectar planetas pequenos além do Sistema Solar

Satélite vai buscar outras Terras em 2005

SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Pode até ser que 2010 seja mesmo "o ano em que faremos contato", como sugere o subtítulo do segundo filme baseado na saga de ficção científica de Arthur Clarke. Mas, se depender de astrônomos europeus e brasileiros, a localização das primeiras "Terras" fora do Sistema Solar começará a ser feita bem antes, em 2005.
Para isso, deve ir ao espaço o satélite Corot (abreviação inventada em inglês para "convecção, rotação e trânsitos planetários"). O projeto é liderado pela França e conta com a participação de vários países europeus. Fora da Europa, só o Brasil está no jogo -em igualdade de condições.
"É a primeira vez que os cientistas brasileiros têm a chance de participar do projeto de um satélite astronômico desde a sua concepção", diz Eduardo Pacheco, do IAG (Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas) da USP. "E, pela primeira vez na história da humanidade, teremos a chance de descobrir planetas do tamanho da Terra."
Mais de cem planetas extra-solares já foram detectados em torno de outras estrelas. Observar diretamente a luz vinda desses corpos distantes atualmente está fora de cogitação (seu brilho fraco é ofuscado pela estrela), mas os cientistas desenvolveram estratégias indiretas de detecção.
A mais popular delas, responsável por quase todas as detecções até agora, é a que identifica os planetas observando o sutil bamboleio da estrela. Apesar de terem massa bem inferior à do astro central, planetas, quando grandes o bastante, podem exercer força gravitacional suficiente para que a estrela se desloque ligeiramente na direção deles, conforme se arrastam por suas órbitas.
Observando o ritmo desse bamboleio estelar, os astrônomos conseguem inferir a existência de planetas. Mas somente gigantes gasosos como Júpiter ou Saturno podem ser detectados. Planetas menores, como Mercúrio, Vênus, Terra e Marte -os chamados terrestres, ou telúricos, que têm superfície rochosa-, estavam fora do alcance, ao menos até agora.

Trânsito planetário
Outro meio de encontrar planetas é pelo trânsito. Conforme o planeta viaja em sua órbita, há um momento em que ele passa na frente da estrela, fazendo com que seu brilho diminua um pouco. É como um minieclipse. Episódio similar, mas no Sistema Solar, aconteceu anteontem, quando Mercúrio passou na frente do Sol.
De novo, se um planeta é pequeno demais, a diferença de brilho da estrela é bem sutil. Os telescópios em terra que procuram planetas por trânsito não conseguem detectar os pequenos, mas o Corot será capaz dessa façanha.
"Não só poderemos detectar planetas como a Terra, mas planetas que estejam na zona de habitabilidade", explica Pacheco. No Sistema Solar, a zona de habitabilidade corresponde, grosso modo, à faixa entre as órbitas de Vênus e Marte. Tecnicamente, a zona de habitabilidade compreende aquela em que um corpo é capaz de manter água em estado líquido na superfície. Essas condições, dizem os cientistas, são essenciais para a existência de vida.
O projeto envolve custo de US$ 40 milhões, mas o Brasil deve entrar apenas com cerca de US$ 300 mil. O país participa de três maneiras. Primeiro, fazendo a recepção de parte dos dados enviados pelo satélite na estação do Inpe em Natal (antes o projeto só contava com uma estação nas cercanias de Madri para receber todos os resultados científicos).
Além disso, cientistas brasileiros criarão o programa de computador responsável pelo tratamento dos dados. "Cinco ou seis pesquisadores vão passar dois anos na França para desenvolvê-lo", diz Pacheco. Para isso ocorrer, falta só o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) conceder bolsas para os participantes.
A terceira função seria propor programas científicos de observação. O Brasil terá direito a executar cinco grandes programas, mesmo número que os outros participantes. "Estamos entrando em pé de igualdade", diz Pacheco.
Serão observadas mais de 60 mil estrelas, e os cientistas esperam encontrar pelo menos algumas dezenas de Terras. O satélite também servirá para estudos astrofísicos, observando os chamados "estelemotos" -equivalentes de terremotos na superfície das estrelas que podem revelar dados valiosos sobre processos nas suas regiões interiores.


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