São Paulo, terça-feira, 09 de maio de 2006

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COMPORTAMENTO ANIMAL

Assobio usado por mamífero parece indicar indivíduo independentemente de quem o "pronuncia"

Golfinhos usam nome próprio, diz estudo

Steve Holland - 18.dez.2002/Associated Press
Mãe e bebê da espécie Tursiops truncatus, conhecida por emitir o chamado assobio-assinatura, em parque aquático australiano


REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL

A fama de tagarelas do mundo animal atribuída aos golfinhos acaba de ganhar um reforço de peso. Novos experimentos parecem comprovar que os bichos usam um tipo especial de assobio como se fosse um nome "pessoal", atribuído a indivíduos da espécie independentemente de quem o utiliza.
Há tempos que muitos pesquisadores reconhecem, entre os golfinhos da espécie Tursiops truncatus, o chamado assobio-assinatura. Esse tipo de vocalização varia um bocado de indivíduo para indivíduo e parece ter uma identidade única para cada bicho, o que levou os cientistas a postular que sua função é parecida com a dos nomes entre seres humanos.
"Na verdade, há uma polêmica grande dentro da comunidade científica. Dois grupos grandes vivem brigando em congressos, alguns dizendo que o assobio-assinatura existe e outros que não existe", conta o biólogo Marcos César de Oliveira Santos, cujo doutorado pela USP versou sobre o boto-cinza ou tucuxi (Sotalia fluviatilis), um parente do T. truncatus. Segundo Santos, os dados sobre o assobio-assinatura vêm basicamente desta espécie e do chamado golfinho-rotador (Stenella longirostris).

Nome de coisas
Alguns dados já sugeriam que os bichos são capazes de copiar os assobios dos outros (como se estivessem pronunciando o nome de um companheiro, por exemplo) ou até de usar esse tipo de som para se referir a um objeto até então desconhecido. Mas os mais céticos costumavam objetar que a analogia com um nome próprio humano seria artificial: os golfinhos estariam reconhecendo não a seqüência de sons do assobio (grosso modo, a "palavra"), mas as vozes uns dos outros, digamos.
É aí que entra o trabalho coordenado por Vincent Janik, da Universidade de St. Andrews (Reino Unido). Junto com colegas americanos, ele estudou a reação aos assobios por parte de golfinhos selvagens da Carolina do Norte (Costa Leste dos Estados Unidos). A vantagem, nesse caso, é que se tratava de um grupo bem estudado: os pesquisadores sabem quem é quem e já gravaram os assobios de vários animais.
Janik e companhia se perguntaram o que aconteceria se eles sintetizassem o assobio-assinatura dos animais com um programa de computador. Mal comparando, seria como se uma voz robótica estivesse pronunciando o "nome" dos mamíferos. Se o importante fosse a "palavra", e não a voz, isso não deveria afetar o reconhecimento do assobio.
Para testar isso, eles usaram assobios sintéticos correspondentes à assinatura de indivíduos aparentados e não aparentados ao golfinho testado. O que eles viram é que os bichos se voltavam mais para o alto-falante quando o assobio-assinatura era de um parente (uma mãe ou um filhote crescido, por exemplo) do que quando se tratava do "nome" de um golfinho sem parentesco com eles.
Para Janik e companhia, um sistema de comunicação com "nomes" é claramente útil para os golfinhos, já que os bichos vivem em grandes agrupamentos sociais que precisam se movimentar de forma coordenada por um ambiente de baixa visibilidade (o fundo do mar). O assobio-assinatura ajudaria a manter os bichos sempre coesos na água.
Diante da falta de consenso sobre o tema, "um trabalho como esse só tende a contribuir", avalia Santos. O estudo está na mais recente edição da revista científica americana "PNAS".


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