São Paulo, sábado, 10 de junho de 2006

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Racismo é "efeito colateral" da evolução, diz psicóloga

Leda Cosmides, expoente da psicologia evolutiva, estuda percepção de raça no Brasil

Pesquisadora americana diz que julgar pessoas pela raça tem a ver com padrões de cooperação e competição surgidos na pré-história


REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL

Ninguém pode acusar a americana Leda Cosmides de não ir direto ao ponto. A pesquisadora da Universidade da Califórnia em Santa Barbara, uma das fundadoras da chamada psicologia evolutiva, tem como objetivo central de seu trabalho nada menos que desvendar a natureza humana. Por natureza, diz ela, entende-se "os programas de processamento de informação típicos da nossa espécie, que funcionam de forma permanente no cérebro humano". Desde o final dos anos 1980, Cosmides e seus colegas -o mais ilustre deles é o canadense Steven Pinker- estão usando a teoria da evolução de Charles Darwin para tentar alcançar essa meta nada modesta. O único jeito de entender a mente humana, argumentam eles, é levar em conta que ela surgiu como ferramenta para sobreviver no ambiente hostil que os ancestrais das pessoas de hoje enfrentavam. Cosmides iniciou uma parceria com uma rede brasileira de psicologia evolutiva, coordenada por uma psicóloga da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Seu objetivo é entender, no Brasil, a percepção de raça, que ela considera um "efeito colateral" ou subproduto de mecanismos evolutivos ligados à idéia de coalizão e cooperação nos ancestrais dos grupos humanos modernos. Nos EUA, a pesquisadora imaginou um experimento para tentar comprovar isso. "Nós achávamos que, se você tivesse duas coalizões, mas a raça não ajudasse a predizer a qual delas se aliar, isso deveria diminuir o grau com que as pessoas notam e recordam a raça das outras. E isso se mostrou verdadeiro." Casada com o colega de pesquisa John Tooby, Cosmides tem 49 anos ("eca!", brinca) e uma filha de 8. Leia entrevista que ela concedeu à Folha antes de uma palestra em São Paulo.

 

Folha - A psicologia evolutiva tem um número enorme de detratores, gente que costuma dizer que o campo não fez descobertas de verdade até agora. O que a sra. citaria como os principais progressos da área?
Leda Cosmides -
Acho que eles poderiam ser divididos em duas grandes áreas. A primeira é o que eu chamo de integração conceitual das ciências. A psicologia evolutiva tem liderado as tentativas de reunir as ciências naturais com as ciências sociais e as humanidades. Não é uma redução dos outros campos à psicologia. A lei da oferta e da procura é uma propriedade emergente da interação de muitas mentes. Não dá para reduzir história e economia à psicologia, mas há um elo causal importante aí. Muitos economistas estão interessados na psicologia evolutiva, porque sabem que seus modelos de escolhas racionais não estão corretos. Além disso, há pessoas da área literária interessadas no que fazemos. A literatura às vezes tem sua própria teoria da natureza humana -algumas pessoas gostariam ter uma que fosse mais correta (risos).


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