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TECNOLOGIA
Brasileiros criam método para autenticar obras com "assinatura" física invisível; filho de Portinari é co-autor
Imagem magnética aponta pintura falsa
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
O que os olhos não vêem, o coração não sente. Já um aparelho
que detecta campos magnéticos
fracos, em compensação, não só
sente como pode ajudar a identificar falsificações de obras de arte
que de outro modo seriam percebidas como idênticas às originais.
A idéia, que mais parece um
cruzamento de filme de ficção
científica com desenho animado
do Scooby Doo, vem de um grupo
de pesquisadores brasileiros. Eles
acabam de publicar um pequeno
estudo na revista especializada
"Superconductor Science and
Technology", que já está disponível on-line (www.iop.org/EJ/journal/SUST) e será impresso
em sua edição de julho.
A proposta parte do pressuposto de que pequenas diferenças nas
tintas usadas para fazer uma pintura produzem uma "assinatura"
magnética única. Por mais que
outra pintura seja visualmente semelhante, seria praticamente impossível que ambas contivessem
os mesmos traços magnéticos.
Para testar essa hipótese, resolveram fazer alguns testes com
pinturas a óleo. "As tintas a óleo
são, em muitos casos, magnéticas.
Se fazemos a varredura de uma
pintura, encontramos um sinal
magnético, que é característica
daquela pintura", afirma Henrique Lins de Barros, pesquisador
do CBPF (Centro Brasileiro de
Pesquisas Físicas) e co-autor do
estudo, encabeçado por Paulo
Costa Ribeiro, da PUC/RJ.
"Se alguém faz uma cópia perfeita sob o ponto de vista fotográfico, sobre uma base idêntica, basta mudar um pouco a tinta usada
-em vez de um preto, um outro
preto, em vez de um vermelho,
um outro vermelho- mantendo
a cor visual; se utilizar um pouco
mais de tinta aqui ou ali, a imagem magnética muda. Ou seja,
magneticamente podemos dizer
que a cópia é uma cópia."
Para obter as leituras do campo
magnético, a equipe primeiro
pré-magnetiza as pinturas, usando um campo de cem Gauss (medida usada para expressar a intensidade de campos magnéticos). É
um valor modesto, mas ainda assim bem superior ao campo magnético da Terra, que na região Sudeste do Brasil tem intensidade de
modestos 0,25 Gauss e chega no
máximo a uns 0,7 Gauss.
Depois da magnetização, por
intermédio de um aparelho chamado Squid (sigla em inglês de
Dispositivo Supercondutor de Interferência Quântica), os pesquisadores obtêm as imagens magnéticas das pinturas.
"O aparelho permite detectar
campos magnéticos muito fracos", diz Lins de Barros. "É constituído basicamente por uma bobina de material especial que é
mantida em temperaturas muito
baixas, algo como -270C. Nessa
temperatura, o material da bobina é supercondutor, ou seja, não
apresenta resistência nenhuma a
uma corrente elétrica. Podemos
dar uma corrente e a corrente fica
girando na bobina o tempo que
quisermos. Com isso, posso medir variações muito sutis no campo magnético, por indução."
Embora os testes relatados no
estudo tenham sido feitos todos
com pinturas a óleo, os pesquisadores estão experimentando outras possibilidades, que incluem
até mesmo a análise de imagens
magnéticas de gravuras e esculturas. "Já fizemos umas medidas de
esculturas, e é possível encontrar
uma imagem", diz o físico do
CBPF. "O que atrapalha é a presença de ferro -como pregos em
molduras de quadros ou na estrutura de esculturas."
Portinari no circuito
O trabalho já despertou interesse no mundo da arte, como uma
potencial forma de autenticar
obras. Afinal, uma vez que haja
um catálogo das imagens magnéticas das obras, dificilmente alguém conseguirá engambelar um
comprador que submeta o quadro a um teste por comparação.
Não é à toa que um dos autores
do estudo é João Cândido Portinari, filho do pintor brasileiro
Cândido Portinari (1903-1962).
Além de matemático pela PUC/
RJ, ele é o responsável pelo Projeto Portinari, que tem por objetivo
catalogar as obras do artista
(www.portinari.org.br).
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