São Paulo, quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

ANÁLISE

Brasil deveria extrair lições da trajetória sul-coreana

MARCELO LEITE
DE SÃO PAULO

Não chega a ser uma surpresa, para quem acompanha biotecnologias e biologia molecular, que a genômica brasileira esteja produzindo tão pouca inovação como resposta ao pesado investimento no setor. Há duas razões para isso, uma bem brasileira e outra universal.
O fator endógeno tem raiz na conhecida dificuldade nacional de fazer o conhecimento científico produzido nas universidades chegar às empresas do país e, aí, impregnar processos e produtos com inovações.
Talvez os arquitetos do Projeto Genoma Xylella alimentassem a fantasia de que, por estarem biologia molecular e genética historicamente tão próximas da ciência aplicada (biomedicina), inovações fluiriam dela como que por gravidade.
Não era tão simples assim.
A publicação do artigo apresentando o sequenciamento do genoma da bactéria Xylella fastidiosa, causadora da doença do amarelinho da laranja, completou dez anos no ano passado. Nesse período, nenhuma técnica relevante para o combate da doença surgiu das informações compiladas.
Pesa aqui, também, uma limitação que é geral, não especificamente brasileira: depositou-se expectativa demais na genômica.
Perto do Projeto Genoma Humano, que engoliu quase US$ 3 bilhões, o Xylella até que saiu barato (foram US$ 13 milhões). Para justificar o montante da fatura, aquele prometia nada menos que curar o câncer; este, dar conta do amarelinho.
Qualquer pessoa com mínimo conhecimento de biologia molecular já sabia naquela altura, ou deveria saber, que as promessas eram exageradas, retóricas. Dez anos depois, assim continuam.
Tanto o genoma quanto o câncer se revelam cada vez mais complicados. Bem mais do que pressupunha a noção simplista de que uns poucos genes seriam responsáveis -e, além disso, controláveis, uma vez compreendido seu mecanismo bioquímico.
O Brasil, que costuma mirar o exemplo da Coreia do Sul para autoflagelar-se quanto à própria carência de inovação, tem agora mais motivos -com o estudo de Rogério Meneghini e Estêvão Gamba- para extrair lições da trajetória observada pelo país asiático.
Os números do estudo deixam claro que os sul-coreanos não embarcaram no trem da alegria genômica.
Embora tenha apresentado crescimento menos exuberante (354%) que o Brasil (434%) em artigos científicos sobre biologia molecular, no período 1996-2007, a Coreia do Sul obteve 118 mil patentes (contra 3.400 por aqui) -e só 1,9% se referiam à ciência então na moda. A imensa maioria contemplava física, química e engenharia.


Texto Anterior: Genômica não rende patentes ao país
Próximo Texto: Por egoísmo, árvores criam raízes em excesso
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.