|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"Brasileiro" trabalhou
no projeto público
CLAUDIO ANGELO
DA REPORTAGEM LOCAL
Não há nenhum brasileiro entre
os mais de 200 nomes que assinam o artigo do genoma humano
na "Nature". Mas, pelo menos para um deles, o Brasil significa mais
do que aquele país de Terceiro
Mundo que sequenciou a Xyllela
fastidiosa: o francês Patrick Winker, pesquisador-sênior do instituto Genoscope, trabalhou por
sete anos na Fiocruz, no Rio.
Winker, que guarda do país um
português perfeito -com os "s"
chiados dos cariocas- e uma
paixão pelo estudo de doenças
tropicais, foi o responsável pela
geração das sequências brutas do
cromossomo 14, que deve ser finalizado mês que vem.
Ele também faz parte da equipe
francesa que está sequenciando o
peixe Tetraodon nigroviridis, um
baiacu, para o futuro trabalho de
anotação -isto é, a localização
dos genes- do genoma humano.
"Nós desenvolvemos programas informáticos para, quando
você comparar o peixe e o ser humano, por exemplo, ter como resultado apenas o que está dentro
das regiões codificantes (que carregam informação para produzir
proteínas)", disse Winker, à Folha, por telefone, de sua casa em
Evry, a "genópolis" francesa, a sudeste de Paris.
Serviço militar
Winker, 39, chegou ao Brasil em
1988 para fazer serviço militar.
"Na França você tem a opção de
trocar o Exército por um ou dois
anos de trabalho em cooperação
científica", afirmou.
O que seria uma estadia curta
acabou virando um longo trabalho no Laboratório de Biologia
Molecular de Tripanossomídeos
da Fiocruz, então chefiado por
Carlos Morell, hoje diretor de pesquisas sobre doenças tropicais da
OMS (Organização Mundial da
Saúde).
O trabalho do grupo chefiado
por Winker era produzir um
diagnóstico experimental do mal
de Chagas por meio da identificação de sequências do DNA do tripanossoma (o protozoário causador da doença) no sangue.
"Muita coisa me atraía no Brasil, mas principalmente o trabalho
na Fiocruz era muito interessante.
Eu tinha contato direto com a
doença e um certo envolvimento
com os médicos, o que é interessante para alguém envolvido com
pesquisa básica", disse. "Voltei
pensando em mexer com doenças
parasitárias, mas o que pintou para mim foi trabalhar no centro de
sequenciamento."
Apesar da paixão pelo país, não
perdeu o jeito francês. "Ele é um
cara super sereno, que tinha um
ótimo relacionamento com todo
mundo, mas que não ia tomar
cerveja com a moçada no final do
expediente", lembra André Santoro, 26, que trabalhou como técnico no laboratório de Winker.
Gerente industrial
O geneticista francês se juntou
ao Projeto Genoma Humano em
1997, convidado pelo diretor do
Genoscope, Jean Wesseimbach
-que fez o primeiro mapa genético humano, nos anos 90.
Sobre a sua parte do trabalho na
pesquisa que mudou para sempre
a cara da biologia, Winker fala
sem emoção, comparando-a à
função de um gerente de fábrica.
"O que você tem é uma forma
de organização baseada na qualidade e na produtividade, aplicada
ao processo de sequenciamento,
com poucos pesquisadores e muitos robôs", disse, para decepção
de quem achava que houvesse algo de heróico em desvendar os segredos do código da vida.
"Você deve ver o trabalho como
uma sucessão de grupos especializados em um tipo de reação bioquímica, que tem como resultado
a sequência, em escala industrial."
Winker afirma que o trabalho
do genoma, em si, "não traz nenhuma grande novidade científica". Mas, segundo ele, a publicação marca o fim de uma era na
biologia e o começo de uma outra,
onde os dados do genoma serão
usados para o estudo da expressão das proteínas -o proteoma.
"Vamos trabalhar o ser humano
como um organismo modelo."
Texto Anterior: Venter é cético quanto a geneterapia Próximo Texto: Fapesp quer dez genomas em 2001 Índice
|