São Paulo, Sábado, 12 de Junho de 1999
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CIÊNCIA
Técnica codifica mensagem secreta em DNA

MARCELO FERRONI
da Reportagem Local

A partir de agora, os serviços de inteligência deverão ter especialistas em biologia molecular para decifrar mensagens secretas, se depender de um novo método de codificação desenvolvido nos EUA.
A técnica, publicada anteontem na revista científica britânica "Nature", procura esconder mensagens na estrutura do material genético de seres vivos.
Em seu experimento, os pesquisadores codificaram uma mensagem alusiva à Segunda Guerra Mundial: "6 de junho: invasão da Normandia", em referência à Operação Overlord, o desembarque aliado na Europa, em 6 de junho de 1944, o chamado "dia D".
"A codificação não é a parte importante do procedimento, e sim a armazenagem de mensagens secretas em genes humanos", disse Carter Bancroft, da Faculdade de Medicina Mount Sinai, nos EUA, em entrevista por e-mail à Folha.
"Eu tive a idéia ao pensar em como tirar vantagem da vasta complexidade do genoma humano para fazer algo interessante, mas não biológico", afirmou.

Letras codificadas nos genes
A codificação foi feita ao agrupar, de modo preestabelecido, os "tijolos" que compõem os genes.
Os genes são o equivalente a palavras que, unidas, formam a "receita", ou genoma, de um ser vivo.
Os genes são formados por DNA, ou ácido desoxirribonucléico. O DNA, por sua vez, é formado por pares de moléculas chamadas bases nitrogenadas.
As bases nitrogenadas são de quatro tipos: adenina (A), timina (T), citosina (C) e guanina (G).
O que os pesquisadores fizeram foi agrupar as bases nitrogenadas de três em três. Cada sequência equivalia a uma letra do alfabeto.
Por exemplo, a letra A equivalia à sequência citosina, guanina e adenina, ou CGA. A letra B foi codificada como CCA (citosina, citosina e adenina), e assim por diante, até que todo o alfabeto, os sinais de pontuação e os números tivessem o seu equivalente em trios de bases nitrogenadas. "Nós usamos uma codificação muito simples para cada letra", disse Bancroft.
Depois de estruturada a "tabela" de codificação, bastou apenas montar as bases nitrogenadas em sequência para formar uma frase.
"Nós tivemos toda a sequência de DNA produzida sinteticamente em uma máquina própria", afirmou o cientista. "Esse é um método simples, usado rotineiramente na área de biologia molecular."
A sequência formada, de tamanho microscópico, poderia ser colada na mancha escura de um ponto final em uma carta "inocente" e passada tranquilamente ao receptor, que a decodificaria.
A idéia de colocar pequenos arquivos camuflados nas letras de uma carta, conforme escreveu o pesquisador em seu artigo, também vem da Segunda Guerra.
Espiões alemães transmitiam informações secretas ao inserir, em uma carta, uma fotografia muito reduzida de uma página com dados confidenciais. O processo era chamado de microponto.
"Nós levamos a técnica do microponto um passo além", escreveu Bancroft na "Nature". O novo processo foi denominado micropontos de DNA.
O uso de um codificador biológico, no entanto, ainda não tem uma função definida, e pode representar mais um método experimental do que realmente ser usado para codificar mensagens pelo governo norte-americano, por exemplo.
"Ainda precisaremos aguardar para ver se isso ocorrerá", diz Bancroft. "Mas acho que o método poderá se tornar útil em inúmeras áreas."


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